10.000 Anos de Descobertas

Sempre que posso olho os meus livros, quer as lombadas
simplesmente cartonadas, a sua cor, os títulos das obras;
mesmo sem os abrir adivinho o seu conteúdo e,
quando os folheio, reconheço as leituras anteriores,
muitas das quais estão sublinhadas, justamente para me
facilitar outros e novos convívios.

António Menéres

Ultrapassar a barreira dos 10.000 acessos ao blog é motivo de muita alegria para o autor, que busca apenas a transmissão das idéias que estão sempre a surgir em diversas categorias: regressos ao passado ou observação do presente, leituras recentes ou cumplicidades acumuladas desde a infância, lembranças de tantos que se foram e nos ajudaram a caminhar, viagens retidas pelo olhar curioso e a música. “Nós estamos seguros um do outro” d’après a meditação final do personagem Jean-Christophe, de Romain Rolland. Veio-me à mente esse número por inteiro, mercê dos acessos de generosos leitores, fazendo-me lembrar de outra dezena de milhar de minha infância, aos onze anos, de 10.000 Anos de Descobertas, de Bruno Kaiser (São Paulo, Melhoramentos, 1949, 267 págs.).

As Primeiras Universidades - Xilogravura, Paul Boesch

Foram meus pais que me ofereceram o belo livro, contendo, antes de cada pequeno segmento da História da Humanidade, uma das 266 xilogravuras de Paul Boesch que compõem a obra. O fascínio foi imediato. Dos dois capítulos iniciais, Na Idade da Pedra Lascada : Regresso da Caça ao Urso e Os habitantes da Terra Fazem Fogo e Cozinham, aos derradeiros, A Exploração dos Pólos da Terra e Seda Artificial e Celofane, o autor percorre os passos do Homem e o encadeamento dos fatos torna-se harmonioso. Para o menino que eu fui, começava o encantamento, que é o longo percurso em direção à parcela, mínima que seja, do conhecimento. As duras conquistas da Humanidade, seu esforço e sua fraqueza, o longo pensar que leva à invenção, e o arrojo a motivar a vontade de descobrir, tudo lá estava, a fazer o miúdo sonhar. Lembro-me de que determinados capítulos – nenhum ultrapassa uma página – provocavam curiosidade imensa. Foi 10.000 Anos… verdadeira enciclopédia resumida para os jovens, introdução a duas outras, igualmente a eles destinadas, mas bem mais amplas, como O Mundo Pitoresco (9 volumes) e o Thesouro da Juventude (18 volumes), lidos nos anos sucessivos.

Cânticos Sacros - Xilogravura, Paul Boesch

A obra de Bruno Kaiser, a levantar a cada capítulo uma pergunta de incontáveis outras que a vida se encarregaria de acumular, tinha essa magia de propor a reflexão sobre o caminho do Homem, sua indomável vontade de descobrir novos horizontes, a fim da conquista ou da realização de ideais, sua criatividade ilimitada, e do simples ao mais complexo, no olhar do autor, todas as criações do ser humano recebem a mesma atenção: arado, roda, bússola chinesa, torno do oleiro, hieróglifos, papiro, vidro, do odre ao barril, sabão, papel, relógio de rodas, imprensa, bicicleta, motocicleta, automóvel, cinema, dirigível, planador, aeroplano, telégrafo sem fio e tantos outros inventos. Na medicina, encaminha a curiosidade científica que chega ao radium, às vacinas. Na área musical, Kaiser insere pouco a pouco, a partir dos gregos, capítulos especiais. Sobre a música na Idade Média, conta sucintamente a história dos instrumentos, aborda o canto sacro-profano, posteriormente pormenoriza-se nos violinos do século XVIII, focaliza J.S.Bach e o prodígio que foi W.A. Mozart. Está tudo explicado, após dezenas de anos de pesquisa amorosa do autor. As xilogravuras de Paul Boesch têm a virtude da simplicidade e da pureza, hoje qualidades difíceis de serem encontradas, a servirem como abertura aos textos e aos vôos da imaginação daquele menino que conservou esse livro que lhe foi tão importante. No instante do insigth referente aos números, compreende-se que a geração a que pertenço tinha referências precisas. O impacto de tantos avanços, que hoje diariamente se apresentam à juventude, era-nos desconhecido. A cultura do livros permanecia sem interferências, absolutamente única quando uma obra era iniciada. O interesse levava a outras leituras e assim sucessivamente. E a imanência seria decorrente. Hoje, jovens estão ajustados ao seu tempo e à proliferação de informações, mas o convívio com as novas gerações, se diferente em tantos aspectos, é sempre muito salutar e ajuda-nos a crescer.

Da História dos Antigos Instrumentos Musicais - Xilogravura, Paul Boesch

Divagações são necessárias e a associação de números idênticos é um estímulo a mais para que aquilo que ficou na memória aflore, o cotidiano revele a perene curiosidade e o caminho que está a ser percorrido continue a trazer maravilhamento.
Foram muitos os questionamentos até os 10.000 acessos. Se as temáticas são diferenciadas, é porque a observação de tantas coisas que me envolvem suscita reflexões. Se a música, ao longo desses dez meses, esteve presente em muitos posts, afeições outras igualmente levam-me a integrá-las àquela vontade de comunicar aos prezados leitores esses textos semanais.
Meu agradecimentos à Editora Melhoramentos, que gentilmente autorizou a publicação on line das xilogravuras de Paul Boesch.

My blog reached 10.000 accesses since March 2007, making me remind of a book I read when I was a child: 10.000 Anos de Descobertas (10.000 Years of Discoveries), by the German author Bruno Kaiser, a concise encyclopedia for young readers with information on all fields of human inventions. I still keep it as one of the treasures of my childhood.