Recitais em Portugal e Bélgica

O Festival oferece novamente de uma forma intensa
o desfrute da grande música
que foi composta ao longo dos séculos
sob o signo da religião,
embora não necessariamente sacra ou litúrgica.
Professor José Maria Pedrosa Cardoso

O Festival de Música Religiosa de Guimarães reveste-se de singular importância, sempre a se considerar o significado histórico da “Cidade Berço”. Idealizado pelo Prof. Dr. José Maria Pedrosa Cardoso, vimaranense, diga-se, há na organização do programa, que se estende de 8 a 16 de Abril, uma panorâmica abrangente da criação musical religiosa através da história. Afirma o Prof. Pedrosa Cardoso: “É precisamente o tesouro da grande música religiosa de todos os tempos, que a cidade de Guimarães, reconhecida no mundo pelos seus pergaminhos históricos, e também musicais, se prepara para oferecer, abundantemente e em ambiente de inegável espiritualidade, qual é a Semana Santa, a todos os seus habitantes e forasteiros”. Em blog bem anterior escrevi sobre monumental obra do Prof. Pedrosa Cardoso (vide “O Passionário Polifónico de Guimarães”, 23/11/2013).

“O Piano como Missão” é o tema escolhido pelos organizadores do Festival Internacional de Música Religiosa de Guimarães para a palestra que darei na manhã de 15 de Abril a anteceder o recital vespertino na também conhecida “Cidade Berço” de Portugal. Ao acessar o link o leitor terá acesso à programação musical do Festival na Semana Santa de 2017. O recital é inteiramente dedicado a obras que tiveram como princípio inspiração em tema religioso ou místico.

http://snpcultura.org/festival_de_musica_religiosa_de_guimaraes_une_musica_patrimonio_espiritualidade.html

Guimarães é cidade de muitos encantos. Seu Centro Histórico é Patrimônio Cultural da Humanidade. Em 2012 foi nomeada Capital Europeia da Cultura. O Castelo de Guimarães é local emblemático, quase sagrado, inicialmente levantado pela Condessa Mumadona Dias, fundadora do Mosteiro de Santa Maria do burgo de Vimaranes, no século X. Aí nasceu o primeiro rei de Portugal, D. Afonso Henriques, já no século XII, aí tendo nascido consequentemente Portugal.  Considere-se que, no dia 24 de Junho de 1128, travar-se-ia a célebre Batalha de São Mamede, nas cercanias de Guimarães, fundamental para a edificação da nacionalidade. Após a batalha que consagraria D. Afonso Henriques, também chamado “O Conquistador”, assim escreve o ilustre historiador João Ameal (1902-1982) com palavras a revelarem espírito romântico: “À tarde, a ardente mocidade de entre Douro e Minho, sobre o campo da vitória, dá largas ao júbilo que lhe enche a alma clara, – e entre ovações, ergue Dom Afonso por Soberano, à frente de um povo livre. / A autonomia passa da potência ao acto. Portugal nasce, nessa hora. Os seus destinos estão bem entregues – nas mãos poderosas e juvenis do herói que lhe deu vida !”.

Essa nova travessia atlântica, logo após a do mês de Março, a fim de participar do júri de doutoramento na Universidade Nova de Lisboa que avaliou a brilhante tese da profª Gyovana de Castro Carneiro da Universidade Federal de Goiás,  leva-me a outras apresentações em terras lusíadas. Aos 19 o recital será na belíssima Biblioteca Joanina da Universidade de Coimbra e no dia 21 no Convento Nª. Senhora dos Remédios em Évora, evento sob o patrocínio da Escola de Música Eborae Musica, ambos com repertório menos temático. No dia 27 o recital será na Bélgica, na cidade de Gent, pertencente igualmente ao meu universo de afetos.

Ao longo desses 10 anos de blogs ininterruptos salientei sempre minha ligação musical e amorosa com Portugal, desde meu primeiro recital aos 14 de Julho de 1950 na Academia de Amadores de Música a convite do grande compositor Fernando Lopes-Graça. Nessas décadas foram dezenas de recitais e outras tantas apresentações relacionadas a programas diferenciados. Sempre salientei neste espaço que, a meu ver, atravessar o oceano pressupõe a apresentação de propostas novas repertoriais, existindo exceções, caso específico do tema preciso do importantíssimo Festival de Música Religiosa em Guimarães. Escrevi igualmente que me sentiria desconfortável se assim não pensasse, pois a visão do novo repertorial traz-me a sensação já apregoada por J.Krishnamurti de que somos viajantes, que temos que “aprender o que puder, dos hábitos e costumes do povo do país”, mas que “nosso coração deve estar fixo sobre a meta, na região mais distante, que está para alem”. Entender os limites pessoais, mas deles extrair o possível para a difusão do conhecimento inusitado advindo de voluntária opção voltada ao repertório pouco difundido, não seria apreender uma parcela do que se conhece como Missão? A escolha do tema da palestra pelos organizadores do Festival de Música Religiosa de Guimarães não estaria a apontar nesse sentido?

Será pois no dia 15 o recital que terá unicamente obras criadas com nítida influência espiritual. Interpretarei inicialmente as duas primeiras Sonatas Bíblicas de Johann  Kuhnau (1660-1722), três excertos da Missa sem Palavras de Eurico Carrapatoso (1962-  ), primeira Profecia em forma de Estudo de Almeida Prado (1943-2010), Nuages Gris e as Duas Lendas franciscanas de Franz Liszt, São Francisco de Assis Falando aos Pássaros e São Francisco de Paula caminhando sobre as ondas.

O link acima apresenta a rica programação do Festival de Música Religiosa de Guimarães no período mais introspectivo da cristandade, a Semana Santa. Merece ser acessado.

This post gives brief notes on the historical town of Guimarães, a UNESCO World Heritage site, referred to as the “birthplace of the Portuguese national identity” in the 12th century and also home to the Guimarães Sacred Music Festival - part of the Holy Week activities. This year I will take part in the festival by giving a talk and a recital with works by Johann Kuhnau, Eurico Carrapatoso, Almeida Prado and Franz Liszt.