Pianista, compositor, homem público e mecenas polonês
Foi depois a ascensão triunfal, o fanatismo dos dois mundos,
que nós acompanhamos com o orgulho
de ver o maior de nós todos, conhecer, em vida,
a glória dos semideuses.
E, coisa de certo modo inexplicável
tratando-se de outros artistas,
todos estes sucessos,
as recepções delirantes que em toda parte
esperavam o mais adulado dos pianistas,
somente nos enchiam de regozijo,
como se ele espargisse sobre cada um de nós
um pouco desta glória que parecia o seu destino.
Alfred Cortot (1877-1962)
Paderewski não foi apenas um grande pianista do período, como também compositor de mérito e uma das personalidades políticas mais importantes em momento crucial da História.
Após estudos preliminares, Paderewski ingressa aos 12 anos no Conservatório de Varsóvia, lá estudando até 1878. Após, durante três anos dará aulas na Instituição. Curto período, pois segue para Berlim no desiderato de estudar composição e se aperfeiçoar pianisticamente com o célebre professor Leschetizky. Em 1887 inicia em Viena sua trajetória triunfante como pianista, sendo saudado na Europa e nos Estados Unidos, país que o acolheu sempre com entusiasmo. Estreou em solo americano em 1891 e, durante sua longa carreira, realizou cerca de 30 turnês pelo país. Foi o primeiro pianista a tocar na nova sala do Carnegie Hall. Como curiosidade, em sua turnê pela Austrália e Nova Zelândia, acompanhado de sua segunda esposa, levou piano Erard, comitiva e seu papagaio.
Paderewski foi o orientador da monumental edição crítica da obra de Chopin, respeitada em todo o planeta. Frise-se que todos os direitos como editor reverteu-os para o Instituto Chopin de Varsóvia.
Clique para ouvir, de Chopin, Noturno op. 15 nº 1, na interpretação de Paderewski (gravação de 1911!!!):
https://www.youtube.com/watch?v=GyN9l2sSjRQ
Como compositor, legou cerca de 70 obras para vários gêneros, entre elas: Sinfonia em si menor, Concerto e Fantasia Polonesa para piano e orquestra, a ópera Manru, apresentada em vários países europeus e nos Estados Unidos, composições de câmara e uma série de criações para piano, sendo que algumas, como o Minueto em Sol, tiveram sucesso absoluto entre os estudantes de piano.
Clique para ouvir, de Paderewski, Minueto em sol, na interpretação do compositor:
https://www.youtube.com/watch?v=M9IBBd-9aRM
O grande sucesso que obteve com seus concertos tornou-o um homem de posses, mas, frise-se, foi Paderewski um dos mais generosos mecenas da música e das artes. Ajudou inúmeros músicos e estudantes em seu país natal, criou fundações nos Estados Unidos e Europa, ajudou financeiramente estudantes nos Conservatórios de Paris, Moscou e São Petersburgo. Em 1932 apoiou músicos desempregados nos Estados Unidos e, logo após, outros tantos na Inglaterra e na Suíça. Estendeu essa ajuda aos orfanatos e maternidade em Nova York. Participou de inúmeros projetos para monumentos a grandes compositores, tanto na Europa como nos Estados Unidos. Um de seus biógrafos, Henryk Opienski (1970-1942), polonês, escreve: “Todo o ouro que sua arte lhe proporciona a um simples apelo da vontade, um chamado do coração imediatamente o dissipa em largos benefícios. Chegaríamos a cifras fabulosas se quiséssemos avaliar, com alguma verossimilhança, o total de donativos feitos para instituições artísticas ou científicas, suas fundações de bolsas, prêmios e subvenções diversas em todo o mundo, principalmente se quiséssemos juntar os montantes das liberalidades ocultas pela sua discrição”. No peristilo da morte, aos 80 anos, realizou vários concertos para o Fundo de Auxílio Polaco.
Clique para ouvir, de Liszt, Rapsódia nº 2, na interpretação de Paderewski (1937):
https://www.youtube.com/watch?v=cdHATFk6AAA
A sua cultura humanística, assim como a proverbial oratória, fizeram com que edificasse, junto ao músico, a figura do político. Nessas últimas décadas, em que a quase totalidade dos homens públicos carece de uma visão humanística ampla, associada à ausência de outras mais virtudes, lembrar de Paderewski se faz necessário. Apresentações pianísticas consagradoras pelo planeta, a inteligência e o espírito patriótico, a generosidade para com músicos e necessitados atraíram a atenção dos poloneses e do mundo. Finda a primeira Grande Guerra, Paderewski, em 1919, é levado ao cargo de Presidente do Ministério do Governo de seu país, sendo um dos signatários do Tratado de Versalhes, em Junho de 1919. Ao se demitir do cargo em 1920 continuaria sua brilhante carreira, mas não deixaria de ser consultado pelos homens públicos em várias decisões para o bem da Polônia.
O pianista Paderewski, saudado pelo planeta, deixou como legado uma arte absoluta, a envolver o pianista e o compositor. Outros legados permanecem: como homem público, a figura – hoje inexistente – do político unicamente interessado no bem de seu país; como ser humano, a generosidade extrema.
Clique para ouvir, de Ignaz Paderewski, Miscellania – Nocturne, na excepcional interpretação de Nelson Freire:
https://www.youtube.com/watch?v=eBxDQ_UJ7MI