Respostas às Sábias Perguntas

Y aura-t-il  la nécessité à terme, dans la “guerre” psycologique artificielle
installée entre les différents courants et langages de la musique actuelle,
d’imposer un moratoire  pour que ne surgissent pas des incompéhensions définitives
qui pourraient nuire à l’essence de la musique
dont la base devrait être communion et harmonie ?
François Servenière (uma das perguntas destinadas à Témoignages)

Dans des textes précedents, vous avez fait preuve de méfiance
vis-à-vis de certains congrés et des actes de ceux-ci,
comme par rapport à d’autres publications universitaires.
Est-ce que vous maintenez cette position assez polémique ?
J.F. Bannwart (uma das questões propostas)

Após a participação em duas bancas de doutorado na Université Paris-Sorbonne em Janeiro-Fevereiro de 2011, a ilustre professora Danièle Pistone chama-me à sua sala e convida-me para ser um dos personagens da série “Témoignages”, uma das publicações do atuante Observatoire Musical Français, do qual ela é diretora. Senti-me honrado, mormente pelo fato de que três respeitadas figuras me precederam: Maria Paz Santibañez (2008), Jean-Louis Orengia (2008), Serge Nigg (2010). Sobre este último, notável compositor e pensador francês, escrevi um post (vide Serge Nigg – Captar o Passado, Apreender o Presente, Presentir o Futuro, 04/03/2011). O presente livro, José Eduardo Martins – un pianiste brésilien (Entretiens avec José Francisco Bannwart & François Servenière, 122 p.), publicado pelo OMF sob a égide da Université Paris-Sorbonne, teria gestação de mais de um ano.

Madame Danièle Pistone deu-me a liberdade da escolha de um ou dois entrevistadores. José Francisco Bannwart, doutor en musicologia pela Sorbonne, e François Servenière, compositor e pensador francês, foram os preferenciados. O primeiro, pelo longo convívio desde os tempos da Universidade de São Paulo, quando foi meu aluno em curso de extensão, tendo realizado posteriormente brilhante mestrado sob minha orientação. Integrei o júri que avaliou sua consistente tese de doutorado, defendida junto à Université Paris Sorbonne. Morou em Paris durante oito anos, ficando responsável não apenas pela formatação de Témoignages 4, como formulando e colhendo perguntas pertinentes de músicos franceses. Mantenho com François Servenière, compositor e pensador francês, uma assídua correspondência, principalmente depois do início de 2011. São mais de 700 páginas em que discutimos música, artes, literatura, política… Tendo escrito substancioso texto sobre todos os meus 22 CDs gravados no Exterior, competiria a ele formular segmento de perguntas objetivas, intrigantes e substantivas. Coube ao grande amigo parisiense, Antoine Robert, a tarefa da revisão de meu texto em francês.

Témoignages nº 4 está dividido em três partes precisas. Nas extremas, Bannwart busca entender primeiramente os primórdios de minha formação, meus estudos em França com mestres insofismáveis, como Marguerite Long, Jean Doyen e Louis Saguer.  Brevemente abordo metodologias por eles empregadas, o meio musical e a crítica em França, a cultura geral que veio acoplada ao meu aprendizado, assim como as reflexões que surgiram após meu regresso ao Brasil, em que nítida defasagem no plano da cultura musical se faz ainda sentir, e a adaptação necessária, sem perder contato com o que se passava na Europa, tornou-se imperativa. Na terceira parte, Bannwart questiona e colhe impressões de músicos para formular perguntas referentes à Universidade hoje. Sou bem cético quanto aos rumos atuais da Academia e busco nessa parte sintetizar o que penso. Na universidade como um todo, e na área musical em particular, os problemas que se sedimentam e a presença da endogenia, que tantos malefícios traz à evolução do pensar criativo no campo teórico-prático; a burocracia soberana intramuros, o excesso de reuniões e relatórios preponderantemente infrutíferos; vocação x carreirismo; a pós-graduação e o simulacro representado por quantidade de teses aprovadas sem qualquer valor, mas que servem unicamente à ascensão de um mestre ou um doutor; o abandono de um tema por parte de tantos tão logo dissertação ou tese findas, o que traz um enorme prejuízo ao país que subsidiou tantas delas; a tragédia das publicações que não se debruçam mais acentuadamente sobre as contribuições internacionais relevantes.   

François Servenière criou as questões para a parte central de Témoignages nº 4. Poderia salientar que o notável músico francês estabeleceria uma ampla abertura para o debate. Suas perguntas, por vezes extensas e desdobradas,  possibilitaram a atenção sobre temas fundamentais, que compreendem a criação escrita para o cravo barroco interpretada ao piano; a interpretação da música francesa, mormente Rameau, Debussy e Fauré; a música contemporânea e seus problemas, quiçá impasses; a ininteligibilidade voluntária de certas tendências composicionais;  o desconhecimento do piano por parte de muitos autores hodiernos, que “insistem” apesar de escritas canhestras; aspectos a envolver a estética; o acaso; gravação e interpretação ao vivo e suas confluências; repertório pequeno maximizado em detrimento de um imenso tesouro voltado ao esquecimento;  a imperiosa necessidade do músico ter cultura ampla. São esses alguns dos temas tratados no segmento.

Em torno de Témoignages o calendário ultrapassou um ano. Responder a mais de 50 perguntas argutas, inteligentes e formuladas por experts  mostrou-se tarefa das mais complexas, mormente ante a diversidade do questionamento, a propiciar minha descentralização de focos concentrados. Polivalentes, multidirecionadas, abrangendo aspectos fulcrais ligados à música, as indagações de Servenière e de Bannwart (recolhidas de outros especialistas e suas também) estimulariam o entrevistado a confrontar-se unicamente com a essência temática relevante. Contudo, décadas acumuladas num caminho musical voluntário, o atual distanciamento das lides universitárias, graças à aposentadoria, fizeram-me apreender as questões como maneira de externar o meu de profundis.

A fim de comemorar a honrosa publicação, darei recital de piano em Paris no dia 28 de Janeiro, na série “Concert dans l’Atelier”. Coerente com o meu pensamento exposto em tantas respostas de Témoignages e ao longo dos posts, escolhi programa a privilegiar dois ilustres compositores que foram amigos e sofreram mútua influência: Francisco de Lacerda (1869-1934) e Claude Debussy (1862-1918), assim como três peças de François Servenière dedicadas ao compositor português nascido nos Açores.

O livro Témoignages nº 4, José Eduardo Martins, un pianiste brésilien (Entretiens avec José Francisco Bannwart et François Servenière), publicado pelo Observatoire Musical Français sob a égide da Université Paris-Sorbonne, está a ser lançado. Esse livro ficará disponível ao preço de E$ 8 sob pedido encaminhado ao seguinte endereço: Observatoire Musical Français, Université Paris-Sorbonne, 1 rue Victor Cousin 75005 Paris, ou par émail à omf@noos.fr .

Next week Sorbonne University will release my book – the 4th of the “Témoignages” series – in which I address a variety of issues related to the musical career: my early studies in Paris and the problems faced upon my return to Brazil; bureaucracy and rampant careerism at the universities; musical societies and their aversion to risks; piano performances of the Baroque repertoire; the interpretation of French composers, in special Rameau and Debussy; contemporary trends in modern classical music. Most of the questions have been posed by the French composer and intellectual François Servenière and José Francisco Bannwart, PhD in Musicology from the Sorbonne. On the occasion, I will give a recital with works by Debussy, Francisco de Lacerda and François Servenière.