Navegando Posts publicados em dezembro, 2012

Missivas Cativantes de Musicista Norte-Americana

Posso afirmar que este livro é um bom livro,
tão bom como Charles Auchester, meu romance preferido,
e espero que ele fará compreender aos jovens que,
para se chegar ao conhecimento pleno de qualquer arte,
há a necessidade de muitos anos de estudo, de esforços e de disciplina.
O poeta H.W. Longfellow (1807-1882) ao editor das cartas,
após ter ouvido a leitura do manuscrito.

A literatura sobre música escrita durante o vasto período romântico tem características específicas. As biografias salientam a presença do herói, os escritos sobre a história apresentam períodos idealizados e as brisas românticas parecem circular em espaços etéreos. Compositores que deixaram larga produção epistolar debruçam-se sobre afetos os mais variados, mudanças de humor, nostalgia e dor. A troca de cartas entre memorialistas natos bem evidencia um universo muito distante de nossa atualidade.

Durante minha formação em Paris, na transição dos anos 1950-1960, um de meus prazeres era buscar nos bouquinistes livros que me pudessem entreter nos momentos de descontração. Obras epistolares me interessavam muito e lembro-me da  leitura das cartas de um mestre da língua francesa, Gustave Flaubert (1821-1880), ao seu colega russo, o poeta e escritor Ivan Turgueniev (1818-1883); a riquíssima troca de correspondências entre Wagner e Liszt, entre tantas outras obras do gênero. Aprende-se muito com essas confissões que se metamorfoseiam ao passar para personagens criados, literária e musicalmente. Em uma das investidas, encontrei o livro Music Study in Germany, na tradução francesa de Mme B. Sourdillon do original em inglês, sob o título Lettres d’une Musicienne Américaine (Paris, Dujarric, 1907, 299 pgs.). Interessou-me, li alguns trechos, mas em plena época de estudos pianísticos que chegavam, por vezes, a dez horas diárias, posterguei a leitura para… mais tarde. Chamou-me a atenção àquela época o precioso prefácio do ilustre compositor francês Vincent d’Indy (1851-1931) que, estando na Alemanha para estudos, conhece fortuitamente Amy Fay. Tantas outras literaturas percorridas durante décadas e o livro de Amy Fay acabaria em uma estante, bem ao alto. Há poucos meses, buscando outra obra a fim de fundamentar um texto, encontrei ao fundo de prateleira as cartas de Amy Fay à sua irmã Harriet Melusina Fay (Zina), primeira mulher do ilustre Charles S. Peirce (1839-1914), lógico, filósofo, matemático e também conhecido como o “pai do pragmatismo”.

Se a trajetória de Amy Fay, após a permanência durante  anos na Alemanha a partir de 1869, a fim de estudar piano, seria muito profícua não apenas para a didática pianística, mas através de incontáveis passos empreendidos no desiderato de fazer ver à sociedade o relevante papel que a mulher teria de desempenhar, considere-se que a força dessa valorosa musicista teria vindo desses anos a trabalhar seu instrumento com alguns dos maiores mestres do período.

O livro é simplesmente delicioso e traz a cada página traços marcantes das personalidades das figuras ilustres e de estudantes seus colegas, da vida musical em Berlin e Weimar, dos concertos e saraus, dos interiores das casas, dos passeios empreendidos, um deles com sua irmã e Charles Peirce. Diálogos mantidos com músicos relevantes dão a veracidade que pode ser comprovada através de estudos realizados, mormente a partir da segunda metade do século XX, por historiadores e musicólogos.

Foi uma privilegiada ao estudar com mestres como Carl Tausig (1841-1871), Theodor Kullak (1818-1882), Franz Liszt (1811-1886) e Ludwig Deppe (1828-1890). Ao visitar Friedrick Wieck (1785-1873), pai de Clara Schumann, comenta inclusive alguns aspectos ligados à sua didática. Debruça-se sobre cada professor e seus ensinamentos, distingue claramente métodos de ensino, características humanas no trato com alunos, interpretação de notáveis músicos como Joseph Joachim (1831-1907), Clara Schumann (1819-1896), Anton Rubinstein (1829-1894), Hans von Bülow (1830-1894), e capta na essência o perfil psicológico de um compositor que  admirava, mas de temperamento complexo, Richard Wagner (1813-1883).

O livro reúne parte considerável da correspondência à irmã, pois as mais íntimas não foram selecionadas por Zina. Não obstante, importa considerar que o panorama pianístico interpretativo e pedagógico, através da qualidade dos personagens, está nitidamente delineado.

Amy Fay, nesses anos germânicos, relata preferencialmente suas impressões musicais como estudante de piano, ouvinte e observadora da vida nas cidades em que esteve. É minuciosa ao  olhar para os interiores das casas, dos quartos, dos salões, pois nada lhe passa desapercebido. Sob aspecto outro, tem o gosto pela natureza e por vezes a descreve. Seria contudo no imenso conteúdo verossímil, e não tratado nos muitos compêndios biográficos ou da história da música, que a coletânea de cartas de Amy Fay adquire importância imensa, a apontar para as dezenas de edições nos Estados Unidos, assim como nas várias traduções feitas da obra.

Através do relato de Fay pode-se entender que pouco teria mudado em muitas das práticas didático-musicais. A denominada master class era algo habitual nos cursos oferecidos por Tausig, Kullak e Liszt, como exemplos. Reuniam alunos escolhidos, tutelados ou não, amigos e  visitantes.  Quanto ao repertório, as Sonatas de Beethoven, obras de Schumann, Chopin e Liszt eram as mais frequentadas. A missivista citou a irritação de Liszt quando uma aluna apresentou-lhe o Scherzo em si bemol menor de Chopin, pois, apesar da grande amizade e admiração que manteve com o compositor polonês, já estaria cansado de ouvir a conhecida obra. Em relação à mesmice repertorial, Amy Fay cita aquele que mais lhe transmitiu ensinamentos técnico-pianísticos, Ludwig Deppe, que também foi regente, diretor da Ópera Real e professor de piano da Imperatriz da Alemanha. Uma aluna apresentou ao maestro o Concerto para piano e orquestra nº 5 de Beethoven. Comenta a missivista “Ela havia preparado o grande concerto em mi bemol de Beethoven, que todos tocam aqui. Deppe sentiu, ao ouvi-la, o mesmo enfado e dificuldades que Liszt no que se refere ao scherzo em si bemol de Chopin. ‘Pobres regentes somos nós!’ diz ele, continuarão os artistas a nos trazer sempre o concerto em mi bemol de Beethoven? … Hoje todo mundo quer o grande repertório. A grande torrente rápida está na moda, mas quem pode simbolizar no seu toque o riacho e suas ondulações e as rugas graciosas nesse oscilar delicado! Ninguém mais destina sua interpretação a essas bonitas passagens”. Amy Fay ainda observa: “Contudo, o professr Deppe escutou pacientemente, pela milésima vez, o concerto em mi bemol que a jovem Steiniger apresentou”. O leitor poderá observar que a repetição repertorial, que reiteradamente tenho criticado, não é prática recente, mas tendência que se prolonga por bem mais de dois séculos!

Para um músico, sobretudo pianista, o conjunto epistolar de Amy Fay, escrito na Alemanha durante os anos de estudos, revela as tipicidades ainda existentes na transmissão professor aluno, quando em nível elevado. Tausig, jovem, impetuoso e pianista destacado, é apresentado com características pedagógicas a depender de provável “ciclotimia”. Kullak, autor de tantos métodos de piano, mormente os estudos de oitavas, surge como mestre capaz de solucionar os problemas do aluno através do exemplo em sala de aula. Liszt, generoso, atencioso, mas a atentar para as grandes linhas de uma obra, tem a aura do demiurgo. Seria contudo Deppe o professor que, sur le tard, propiciaria o trabalho técnico-pianístico laboratorial que se fazia necessário. Amy Fay teve não só de refazer desde exercícios e estudos que são a base do aprendizado de todo pianista, como, a partir de observação arguta, transmiti-los por escrito à sua irmã. Basicamente, a técnica dos cinco dedos apreendendo na abrangência escalas, arpejos, acordes, assim como a posição correta das mãos, articulação, relaxamento para a melhor execução e pedal representariam um regresso aos “princípios”, após ter trabalhado com mestres excelsos. Em nenhum instante se insurge contra o fato, apenas lamenta não ter iniciado o seu aperfeiçoamento na Alemanha pela orientação de Deppe. Considere-se que esses princípios fundamentais de Deppe são ainda muitíssimo válidos.

Se o livro é riquíssimo nessas observações que passam ao largo dos tratados de história ou das biografias, pois vivenciadas  por observadora sensível e atenta, não descartemos determinados tópicos de humor. Escreve Amy Fay na carta enviada à irmã da cidade de Weimar no dia 24 de Julho de 1873: “Segunda-feira tive um dos mais agradáveis tête à tête com Liszt, motivado pelo acaso. Tive a oportunidade de ir ao seu encontro e, coisa estranha, ele estava só, ocupado na escrita. Insistiu para que ficasse alguns instantes e tivemos uma conversa alegre e descontraída. Era a primeira vez que eu conseguia conversar realmente com Liszt. Ele estava bem espirituoso. Falamos da faculdade da mímica e ele contou-me uma anedota bem divertida sobre Chopin. Disse-me que, quando jovem, alguém revelara-lhe que Chopin tinha um dom de imitar personagens. Pediu, pois, que o amigo viesse à sua casa evidenciar essa habilidade. Certo dia Chopin o visita, coloca uma peruca loira e se veste com a indumentária de Liszt. ‘Eu era bem loiro nessa época, disse Liszt. Tendo um de meus amigos chegado,  Chopin foi ao seu encontro a imitar de maneira tão perfeita a minha voz que o visitante, acreditando dirigir-se a mim,  marcou um encontro para o dia seguinte. E eu estava no quarto. Não é extraordinário?’, completou”.

Quantas não foram as trocas de cartas entre estudantes fora de seus lares com familiares? Quantas obras não ficaram no ostracismo o mais abissal? Várias foram as confluências que levaram Music Study in Germany à grande difusão. Primeiramente, deve-se à irmã da autora, Harriet Melusina Fay, a edição, em 1880, da correspondência epistolar selecionada.  Outros fatores, como as qualidades de observação e redação de Amy Fay; os seis anos na Alemanha, um dos centros referencias para a música na Europa; conseguir ser aceita em classes de professores de primeiríssima linha e que permaneceram na história da música, como Liszt e Tausig na performance e Kullak e Deppe na didática; haver conhecido Wagner, Hans von Bülow, Joachim, Clara Schumann, Anton Rubinstein e tantos outros e deles traçar perfis acentuados; comentar recitais e concertos; narrar interiores das casas e a culinária típica; discernir costumes e o pulsar das cidades por onde passou; interpretar coleguismo e outros  pormenores vistos e assimilados fazem da obra em apreço, lida por mim na tradução francesa publicada em 1907, uma narrativa real. Seus personagens flutuam desde então na imensa bibliografia sobre música, sempre in progress. Verdadeiro deleite para o leitor. O livro pode ser encontrado através da internet nos sites especializados, pois continua a ser editado na língua inglesa. 

My comments on the book “Music Study in Germany”, written by the American pianist Amy Fay, in which – through letters written to her sister – she gives a vivid account of her music studies abroad from 1869 to 1875. The volume has had countless reissues and it can be explained by the fact that Amy Fay studied with la crème de la crème of those days: Franz Liszt, Theodor Kullak, Carl Tausig, Ludwig Deppe. She also went to concerts of celebrated musicians of the time, like Wagner, Anton Rubinstein, Clara Schumann. Observant, she offers little known details of her teachers’ methods and personalities, impressions of her concert-going experiences and of German customs and manners. A delightful detailed portrait of an era with an endless stream of luminaries, highly recommended for classical music enthusiasts.

 

Euforia Acalentada Desde Sempre

Víamos na televisão que tinha gente que vendia carro,
que deixava o emprego (para acompanhar o time no Japão).
Todas essas coisas, quando entramos em campo,
fazem a gente dar tudo que tem.
Elas merecem esse momento de felicidade.
Paolo Guerrero (autor do gol do título)
“Folha de São Paulo” (20/12/2012)

Após um evento relevante que a mídia disseca ad nauseam, prefiro aguardar um pouco. A reflexão faz bem e evita que o calor dos fatos altere a razão. Durante esses últimos dias não deixei de pensar a respeito do bicampeonato mundial interclubes FIFA conquistado pelo Corinthians. Vale a pena relembrar o primeiro deles, obtido em 2000 no Brasil e tão criticado pelos torcedores de outras agremiações. Posso tecer considerações sem quaisquer outras posições, pois meu time é a infortunada Portuguesa de Desportos. Contudo, quando da primeira conquista mundial do Corinthians, acompanhei meu saudoso genro José Rinaldo ao estádio do Morumbi, a fim de assistir ao jogo entre seu time e o poderoso Real Madrid. Lembro-me da tormenta que desabou sobre São Paulo, a nossa heroica caminhada até o estádio com água bem acima dos tornozelos. José Rinaldo, seu amigo Elias e eu assistimos à contenda literalmente encharcados. Um total descaso por parte da Prefeitura e do São Paulo Futebol Clube, proprietário da grande, mas desprotegida, arena. Em jogo memorável contra o Vasco da Gama no Rio de Janeiro, o Corinthians obteria a seguir o almejado título.

A equipe paulista, tão criticada pelos opositores por motivo ligado ao título conquistado no Brasil, sofreu dissabores posteriores, foi rebaixada para a série B, do campeonato brasileiro, mas reagiu, mesmo que bem amparada pelas transmissões de seus jogos na B sempre no mesmo dia e horário da semana, fato inédito, um privilégio de nenhuma outra agremiação sequer desfrutou. Frente aos milhões de torcedores – consumidores em potencial – espalhados pelo Brasil,  a mídia mostra sempre sua face pragmática. Nada a fazer. Todavia, desde jovem ouvia os torcedores de outros times desprezarem totalmente o apaixonado corintiano, considerando-o – quantas milhares de piadas não surgiram ao longo das décadas – um membro da plebe, da periferia, um ser menor, delinquente e outros atributos desairosos. Enfatizavam que o Corinthians só ganhava torneios regionais.

Após regressar para a denominada “primeirona” teve altos e baixos, mas, sob a tutela do controvertido Andrés Sánchez, certamente o melhor presidente da história do Corinthians,  conseguiu feitos extraordinários, mormente sob a direção técnica do competente Tite. Após titubeios iniciais, conquistou a tríplice coroa:  Campeonato Brasileiro, Libertadores da América e, agora, Campeonato Mundial de Clubes da FIFA. Nada veio ao acaso. Houve planejamento e sentido de dimensão de valores. Estou a me lembrar do vexame que o Santos proporcionou em 2011, após humilhante derrota frente ao Barcelona. Nesse caso, não houve o planejamento necessário, pois meses antes a equipe santista deixava de atuar com esmero no campeonato brasileiro, poupando-se para o confronto em Tóquio. Jogaram acanhados, como a reverenciar o forte time catalão e os 4×0 bem poderiam ter sido 6, 7, 8… Com o Corinthians deu-se o contrário. Aprenderam a lição desastrosa do time santista. Planificaram-se após a Libertadores e, sem abandonar o campeonato brasileiro, transformaram-no em um laboratório e o resultado positivo aconteceu, friso, não motivado por acaso.

Algo impressiona. Amigos do Exterior me escreveram surpreendidos pela imensa massa humana que viajou para o outro lado do mundo a fim de, tantas vezes com sacrifícios, prestigiar o carinhosamente denominado Timão. É para se pensar. Mesmo em situações calamitosas sob o aspecto técnico, o Corinthians leva multidões. Fiéis, bando de loucos e mais outras expressões engrandecem esse incrível contingente humano. Outras equipes brasileiras, quando em má fase, são praticamente esquecidas pelos adeptos. O Corinthians não. Um de meus amigos da Bélgica leu em site do país que consideravam o jogo final contra o Chelsea como a maior “diáspora” esportiva – tendo-se em vista a distância – já ocorrida em termos mundiais. Isso é fato e é bonito. Chegaram ao Japão torcedores vindos do Brasil,  Austrália, da Europa e dos U.S.A., sem contar as dezenas de milhares de brasileiros que lá vivem,  certamente muitos corintianos.

Estava eu a participar da Corrida de Rua Sargento Gonzaguinha (15km), verdadeira preparação para a São Silvestre (15km), no dia 16 último pela manhã. Prova em plena marginal Tietê, circundando Anhembi, sambódromo e tantas outras ruas e avenidas. A corrida começara pouco antes do início do jogo. Durante meu tempo a correr (1:43:08) só ouvia fogos e gritaria. Em todo o percurso. Finda a prova, no recebimento das medalhas de participação, veio o gol corintiano e aquela região da Av. Cruzeiro do Sul explodiu. Carlos (Batoré) e eu voltamos pelo trajeto da ida, ou seja, metrô Armênia até a estação São Bento, ônibus no terminal Bandeira até o Brooklin. Tudo a pipocar. Realmente uma festa.

Com certeza, essa torcida deverá crescer ainda mais. Tudo indica que o Corinthians, hoje o time brasileiro melhor ranqueado em avaliações internacionais, estará a receber patrocínios ainda mais interessantes. Bom para a “nação” corinthiana, ótimo para o Brasil, tão desprestigiado nos últimos anos sob o aspecto futebolístico. E ainda terá seu próprio estádio.

Minha opção foi torcer nessa competição para o Corinthians e, alegria maior, ver a efusiva manifestação de três de minhas netas, que reverenciam o time escolhido pelo saudoso pai. Eis um pequeno exemplo do que é ser corintiano. Isabel (18), a segunda neta, estava na Alemanha quando da Libertadores. O fuso horário não a impediu de assistir, via internet, à transmissão dos jogos. Finda a conquista, segundo seu relato, corria pela casa de sua tia paterna, em plena madrugada, a gritar em “silêncio”, pois todos dormiam na moradia. O valor de uma torcida é incomensurável. Hoje, a maior do Brasil. Merecem-se time e torcedores. Exemplo de amor e de dedicação. Não fosse esse “bando de loucos”, como se denomina a massa do Timão, o Corinthians não teria essa força. O título deverá dissipar traumas de outrora. Oxalá o “nação” corintiana continue a dar o belo exemplo proporcionado nesse bicampeonato. É o que todos esperamos.

A todos os generosos leitores desejo um Natal aconchegante. Que o espírito essencial da comemoração dessa data maior da cristandade contagie todos nós nessa busca eterna do aperfeiçoamento interior.

On Corinthians’ 1-0 win over Chelsea in the final of the 2012 FIFA Club  World Cup in Yokohama last Sunday and the fantastic mass pilgrimage of the club’s faithful followers from all continents to Japan, the “Corinthian” invasion that painted in black and white the Toyota stadium, hugely outnumbering Chelsea’s fans. Such show of force no doubt pushed the team from São Paulo to victory.

 

Tema Relevante a Despertar Reminiscências

Ele representou a  figura do pai no meu desenvolvimento psicológico
 - para o melhor e para o pior, como ocorre com a figura paterna.
Mas não me prejudicou. Poderia tê-lo feito.
Claudio Arrau (a respeito de seu professor de piano Martin Krause)

Novamente tivemos um post que propiciou inúmeras observações aos melômanos, músicos e praticantes de outras artes, mormente entre aqueles pertencentes à juventude da idade madura e à maturidade propriamente dita. Alguns pediram que fizesse comentários sobre o mencionado livro de Amy Fay. Prometo fazê-lo até o final deste ano.

Mencionei três casos típicos relacionados à idiossincrasia existente durante a transmissão da mensagem do magister e a assimilação ou não por parte do aluno. Não poucas vezes esse fato pode ocorrer pela inaptidão do discípulo ou mesmo negligência quanto aos estudos. Da parte do professor, temperamento e até situações do cotidiano podem determinar, inclusive, mudanças de atitude durante uma aula. Isso é absolutamente normal, mas não deveria interferir na transmissão musical. Preferiria restringir-me às mensagens que possibilitam estabelecer uma “estatística” concernente às atitudes de um professor, sejam elas tranquilas, atentas, generosas, indiferentes ou agressivas. Todas elas existem e, independentemente da competência do mestre, resultam num melhor ou pior aproveitamento por parte do discípulo.

Relatos por vezes pungentes atestaram o relacionamento do aluno com o professor de piano desde a tenra infância. A depender da condução na idade edipiana, difícil, desinteressada ou traumática, o miúdo poderá guardar pelo resto da existência uma postura até neutra com a música. A orientação serena tende a impulsionar o talento precoce na direção certa, a evidenciar os dons da criança, o técnico-pianístico sólido, a teoria, o solfejo, a leitura à primeira vista e as noções estilísticas dos vários autores. E foi esse tópico que mais me chamou a atenção, pois alguns jovens que estão em pleno e profícuo desenvolvimento – oxalá consigam singrar as águas que se apresentam no decorrer da existência -, têm ilusões e até certo temor de encontrar O Mestre, timoneiro a mostrar a rota segura com dedicação, competência e compreensão. Se bem aconselhado,  estará, em princípio, em terra firme, pois o comando não deixará dúvidas. Se cair em mãos não competentes ou negligentes, todo o mal estará concretizado e, se conseguir livrar-se dessas “garras”, terá um imenso caminho para recuperar tempo perdido.

Foi mencionada a cultura do professor a contribuir decididamente nessa transmissão professor-aluno. É item que tenho reiteradamente abordado como essencial. Oportuna a observação, pois mais um mestre é competente,  entendido como tal pelo aluno através do exemplo demonstrado na trajetória como pianista e preceptor, mais deveria estar engajado com a cultura, conduzindo o aluno às obras literárias relevantes, ao conhecimento das outras artes. A Música é parte essencial do todo, mas nunca deveria ser entendida como “o” todo. Sem a formação plena, uma lacuna estará aberta e quanto mais ela perdurar, mais claramente será sentida. Há intérpretes e professores que mantêm, inclusive, distanciamento voluntário do conhecimento, focando-se unicamente na performance ou na didática pianística. A formação plena do aluno não o interessa. E esses personagens existem, são reais, infelizmente.

Curiosamente, um amador adulto pergunta-me a respeito do professor “concurseiro”, ou seja, aquele que vê no jovem talentoso a oportunidade maior de desenvolvê-lo para os certames pianísticos. Já comentei esse tema em posts bem anteriores. Contudo, se a intenção no de profundis do orientador for essa, considero um simulacro a relação, menos por parte do aluno, que está em sala de aula para aprender, mas decisivamente por parte do que conduz, a entender o discípulo como a possibilidade de aumentar sua estatística pessoal de troféus. Se assim age, está-se diante de gigantesco equívoco, pois o menino ou jovem estaria a ser manipulado.  E volta-se ao post que deu origem a tantos e-mails. O concurso como única meta pode comprometer o relacionamento tranquilo e desejável, pois este tornar-se-á forçosamente mais tenso devido às pressões, ao stress e ao tempo existentes. Insisto que a transmissão objetiva, mas imbuída dessa serenidade interior desejável é a base sólida para o convívio. Sob aspecto outro, concurso pianístico basicamente não renova repertórios. E esse é um mal que atinge centenas, talvez milhares de jovens pelo mundo.

Um e-mail deixou-me a pensar. Refere-se um leitor à indiferença do professor, tema também tratado em vários posts. Meu dileto amigo Jorge tem razão ao comparar a indiferença ou desinteresse do professor na transmissão musical ao prato sem qualquer tempero. Ambos são insossos. O aluno poderá contagiar-se. Se tiver apoio familiar e chama interior, cedo buscará  safar-se dessas tragédias pedagógicas.

Amy Fay (1844-1928) comenta que seu professor, o legendário Franz Liszt (1811-1886), certa vez se indignou com uma aluna de apenas 15 anos, atirando a um canto da sala a partitura do Scherzo em si bemol menor de Chopin. O excelso pianista, compositor e magister arrepender-se-ia e, dirigindo-se à casa da jovem, prometeu-lhe duas aulas prolongadas, não sem antes pedir as desculpas devidas. As sessões se passaram  com a maior das atenções e a jovem cresceu com o episódio. Aliás, Fay considerava Liszt o exemplo mais perfeito do professor, pois supercompetente, pianista legendário e amável, generoso, mas enérgico se as circunstâncias assim determinassem. Essa generosidade ficaria expressa na ajuda referencial a Wagner e a tantos outros músicos. Pouco a pouco Liszt despojou-se de seus pertences e ao morrer não mais possuía qualquer bem material, mas legara à humanidade um acervo composicional dos mais importantes para a história da música.

O desenho de minha filha Maria Fernanda fixa uma de minhas últimas aulas na Universidade de São Paulo. Paulo Marcos Filla, aluno ouvinte desses derradeiros encontros na Academia, ofereceu-me bela montagem em acrílico, onde inscreveu frase sensível: “O verdadeiro professor não busca extrair o melhor do aluno, mas, sim, criar as condições para que este ofereça o melhor de si”.

O debate longe está de ser encerrado. Ao longo do tempo retornaremos ao tema, sob outra égide. 

This week’s post resumes the subject of the relationship teacher/student. Thanks to input received from readers, this time I consider the relevance of a teacher’s cultural background to encourage informal learning - outside the academic programs - among students as an enhancement to formal education; the risks of his interest in piano competitions as a means to promote himself; negligence and indifference in class. It ends with the words of my former student Paulo Marcos Filla: the true teacher does not seek to get the best from his students, but to create conditions for students to give their best.