Doenças que se não vêem, não são lastimadas.
Ilha de São Miguel
(Adagiário Popular Açoriano)
Dois blogs, pautados para esta e a próxima semana, entrarão atrasados, pois nesta que está a findar permaneci, entre os dias 8-12 no Hospital Santa Catarina, a fim de me submeter a cirurgia de divertículo faringoesofágico de Zenker. Comumente nos descuidamos e, após anos sem muito me importar, acatei os sábios conselhos do excelente cirurgião de cabeça e pescoço, Dr. Belmiro José Matos, docente pela USP, que já me atendera em 2004 quando estive inicialmente sob seus cuidados, pois era portador de um Linfoma T Células Pequenas. Dele guardei a imagem do médico atencioso, generoso e competente. Ajudou-me a transpor uma difícil situação.
Contrariando muitas opiniões médicas, o Dr. Belmiro entendeu que o fato de meu pai ter sido operado de um divertículo de Zenker em 1957 e meus três irmãos, sucessivamente após os 65 anos, finalizando com a minha participação aos 80 anos, há fortes indícios de ser, no caso, uma doença genética, mormente se considerado que o divertículo de Zenker tem baixa incidência na população. Quando da cirurgia de meu saudoso pai havia um risco muito grande. Estou a me lembrar de que o ilustre médico que operou meu pai – foge-me o nome – quis se reunir com a família, eu incluso, para explanar a gravidade da intervenção. Dois dias após, na véspera da cirurgia, apresentava-me na programação da Orquestra Sinfônica da Rádio Gazeta, sempre lotada às segundas-feiras, a fim de interpretar o Concerto para piano e orquestra de Grieg, sob a direção do competente regente Armando Belardi. O locutor César Abrahão, transmitiu ao público presente e aos milhares de ouvintes que o “jovem” pianista dedicava o Concerto ao seu pai, que àquela hora estava a ouvir o programa, mas que nas primeiras horas do dia seria submetido à cirurgia. Saí-me bem, a Rádio daria posteriormente a fita gravada ao meu pai, já amplamente restabelecido, conservando eu a gravação até hoje no formato CD.
Deve-se o nome do divertículo de Zenker ao patologista alemão Friedrich Albert von Zenker (1825-1898), que o descreveu em 1877. Acomete sobretudo pacientes acima dos 60 anos, mercê da redução sensível da elasticidade dos tecidos e do próprio tônus muscular. Sentimos a presença desse incômodo ao deglutir, pela pressão exercida no complexo sistema de deglutição, causando uma herniação da mucosa e submucosa. Verifiquei esse extraordinário sistema de deglutição a envolver língua, traquéia, laringe e esôfago ao assistir ao vivo o videodeglutograma a que fui submetido três dias após a intervenção.
Deveria permanecer um dia no Hospital Santa Catarina, mas prolongou-se a internação de acordo com os conselhos médicos. O procedimento, via endoscópica foi realizado pelo Dr. Renato Luz Carvalho com a assistência do Dr. Guilherme Schreiner, mercê da indicação do Dr. Belmiro, que me visitou durante todos os dias da internação, assim como seu assistente, Dr. Ricardo Fujiwara. O videodeglutograma esteve sob a supervisão da fonoaudióloga Dra. Roberta.
Só tenho elogios ao tratamento recebido no Hospital Santa Catarina. Equipe supercompetente, atendimento extremamente profissional a não faltar amabilidade. À janela do quarto lembrei-me de duas cirurgias dos rins a que minha saudosa mãe foi submetida, sob chefia do notável urologista e professor Dr. Darcy Villella Itiberê. Tinha eu 10 anos e com meu pai e irmãos a visitávamos quase diariamente, percorrendo o trajeto de bonde até ao hospital.
No próximo blog apresentarei a tradução de mensagem de grande interesse que recebi do compositor e pensador francês, François Servenière a respeito do mito do herói. Durante a internação finalizei livro de muita importância, “Messiaen – l’empreinte d’un géant” da professora, musicóloga e escritora francesa renomada, Catherine Lechner-Reydellet e que possivelmente será desdobrado em dois post, tantos são os depoimentos de alto nível colhidos pela excelente pesquisadora.