Gildo Magalhães frente à ciência

Tornou-se profundamente óbvio que a nossa tecnologia excedeu a nossa humanidade.
Somos um campo de energia, só que visível.
Albert Einstein (1879-1955)

Recebi, do meu dileto amigo Gildo Magalhães, o substancioso livro “Meu caro Einstein e outras histórias da ciência e da técnica” (Livraria da Física, São Paulo, 2023).

Gildo Magalhães, presente inúmeras vezes neste espaço, comentando com acuidade os meus blogs hebdomadários, é professor titular jubilado da FFECH-USP, onde foi docente na área da História da Ciência no Departamento de História. Foi diretor do Centro de História da Ciência da USP e é membro do Centro de Filosofia da Ciência da Universidade de Lisboa. Tem vários livros abordando a sua área de atuação. Ultimamente está a realizar uma profícua colaboração no Jornal da USP, focalizando paulatinamente a História da Ciência.

“Meu caro Einstein” apresenta um conjunto de artigos divididos em três grupos, como posiciona o autor. Num primeiro, insere “artigos que resultaram de pesquisas em bibliotecas e instituições especializadas de História da Ciência nos EUA e Europa”. Gildo Magalhães apresenta no segundo grupo três textos referentes à sua competente atuação junto ao Centro de Filosofia da Ciência da Universidade de Lisboa, frequentemente visitada pelo autor, partícipe dos vários simpósios realizados pela Instituição. Ele esclarece o terceiro grupo de estudos: “No último conjunto de textos, examino alguns tópicos da história da ciência e da técnica no Brasil, tendo como pano de fundo o desenvolvimento do país…”. Dez textos de Gildo Magalhães, publicados em vários países, foram por ele traduzidos para o português. A reunião de todos esses trabalhos revela o vasto conhecimento da História da Ciência, máxime pelo fato de que o autor sempre se baseou em pesquisas profundas,  que resultaram em deduções, tantas delas plenas de originalidade.

Engenhosamente, insere no primeiro texto título que daria nome ao livro, “Meu caro Einstein”, palavras iniciais que indicam as pesquisas do autor apreendidas da correspondência entre Felix Albert Ehrenhalf  (1879-1952) e Albert Einstein (1879-1955) sobre correntes magnéticas. Tem interesse maior essa troca de missivas dos dois cientistas. O interlocutor Ehrenhalf, em sua longeva atividade epistolar com Einstein, durante trinta anos buscou a anuência de suas descobertas, não obtendo a guarida esperada por parte de Einstein. Gildo Magalhães observa: “O problema é que suas teorias se opõem às de Einstein, e também às do eletromagnetismo clássico, pois afirma ter conseguido isolar os polos magnéticos Norte e Sul, observando uma ‘corrente magnética’. O relacionamento se complica com a intervenção de sua esposa, que escreve poesias provocadoras para Einstein, que responde também com poesias. A batalha verbal segue com lances surpreendentes”.

Em um dos textos do livro, “Sobre uma possível contribuição da matemática transfinita para a euritmia”, Magalhães considera que “O conhecimento nunca chega ao final. Qualquer sistema de teorias, por mais excelente que seja, termina gerando anomalias e paradoxos. Esta afirmação é válida para sistemas filosóficos, teorias científicas ou outras formas de conhecimento investigativo. Se se tomar, digamos, a história da física, há muitos exemplos para ilustrar o ponto, como o sistema geocêntrico ptolomaico, ou a mecânica de Newton, ou a teoria quântica ortodoxa”. Em todas as áreas, essas afirmações contundentes do autor encontram eco. Nos dois últimos posts tratamos do progresso e da evolução das artes, entendendo que, para a área musical, a aplicação do termo  evolução é mais adequada pela perenidade das criações dos grandes compositores do passado, máxime pela publicação das obras e pela sua permanente vivificação através da interpretação dos músicos através dos séculos .

Gildo Magalhães finaliza o instigante livro com quatro capítulos dedicados a temas brasileiros. No segundo, “Evolução no sertão: darwinismo, intelectuais brasileiros e o desenvolvimento da nação”, três figuras relevantes na nossa história são contempladas: Sílvio Romero (1851-1914), Euclides da Cunha (1866-1909) e Monteiro Lobato (1882-1948). Magalhães observa, após textos minuciosos sobre as suas atuações e farta produção literária diversificada: “Os três autores aqui apresentados tiveram uma fase de simples imitação dos cânones darwinianos, seguindo um padrão de ideias europeias importadas sobre a evolução, que começou com as obras de Spencer. Isso levou a um caminho ideológico que passou pelo darwinismo social e pela eugenia, agravado por uma visão naturalista. Muitos escritores assumiram a noção de que os problemas sociais e psicológicos eram características hereditárias, uma ideia prontamente assumida por pessoas que também acreditavam que doenças comuns – como tuberculose, sífilis e alcoolismo – eram herdados pelos pobres”.

O livro em apreço é de importância, mormente pelo fato de apresentar uma série de grandes descobertas na área da Ciência, reunidas e didaticamente explicadas. A não intimidade com as especialidades científicas – caso específico deste que ora redige – não impede que o leitor tome conhecimento das conquistas extraordinárias que têm ensejado o progresso da Ciência. “Meu caro Einstein” pode ser uma porta aberta a desvelamentos.

The recent book by Gildo Magalhães, a full professor at the University of São Paulo, “My dear Einstein”, is of great interest as it presents a series of studies published in Brazil and abroad over the years, dealing with his field of work, the History of Science.