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Respondendo aos incentivos recebidos

A música torna um homem sábio?
Só há sabedoria se associada à perenidade e serenidade:
A sabedoria não só é coextensiva com toda a vida,
como também nos traz calma e reduz a nossa inquietude.
Parece, no entanto, que a música nunca nos dá uma sabedoria total, mas apenas uma meia-sabedoria:
quando os seus efeitos são duradouros, são avassaladores;
e quando é tranquilizadora,
a serenidade que lhe devemos é geralmente efêmera.
Vladimir Jankélévitch

Agradeço aos leitores pelas inúmeras mensagens “provocadoras” posicionando-se a favor da continuidade das apresentações pianísticas públicas. Mencionam tantos retornos, após a definição de encerramento de ilustres figuras das artes ou de destacados esportistas, decisões essas que poderiam me levar a considerar resolução consciente tomada. Comove-me essa preciosa atenção.

Não tivesse havido um outro recente findar, referindo-me às gravações, cujo término se deu em 2019, igualmente voluntário e sem quaisquer sequelas, o término presente poderia estar sujeito à mudança de atitude. Anteriormente já mencionara que o período pandêmico, entre males e precauções, serviu para reflexões sobre a existência e finitudes, mercê de tantos que se foram, não poucas figuras conhecidas, inclusive uma querida cunhada. A incerteza quanto à vida levou-me à certeza da precisa finitude que se avizinhava, o encerramento da atividade pianística pública. “Qual a sua razão de não empregar a palavra carreira”, questiona um leitor. Jamais utilizei o termo, este destinado àqueles que se apresentam sistematicamente dezenas de vezes ao ano. Apesar de ter repertório tradicional, que poderia proporcionar quantidade de recitais e consequente repetição repertorial, tinha a convicção de que obras do passado criadas por notáveis compositores, mas pouco ou nada frequentadas, assim como determinadas tendências da composição contemporânea que me encantam, ajudaram-me a descortinar o desconhecido, revelando soluções incríveis que, ao longo dos séculos, grandes mestres têm depositado nas partituras. Farol que me permitiu singrar a via musical sempre amorosamente. Reza a história que o grande público gosta de ouvir as obras consagradas, repetitivamente apresentadas, necessidade que a ele se impõe de manter referências.

Clique para ouvir, de Alexandre Scriabin, Feuillet d’Album Op. 45, nº 1, na interpretação de J.E.M:

https://www.youtube.com/watch?v=ug7MD8jWo4M&t=61s

Ao longo de dezesseis anos e meio de blogs ininterruptos não deixo de salientar compromisso com a música. A finalização da apresentação pública não significa a interrupção abrupta. Continuarei a perpassar quantidade expressiva de obras que me ajudaram a entender o potencial da música sobre o homem. Irei apresentá-las em reuniões reservadas, precedidas de comentários sobre a criação musical. Aprofundamentos estão em andamento a respeito de algumas composições eleitas ou a redescobrir.

Um dos meus autores preferidos, o filósofo-musicólogo Vladimir Jankélévich (1903-1985), tantas foram as suas obras que percorri desde os anos 1970, tem uma passagem basilar em um de seus livros essenciais: “La Musique et l’Ineffable” (Paris, Éditions du Seuil, 1983). Escreve: “Há na música uma dupla complicação, geradora de problemas metafísicos e morais, feita para distrair nossa perplexidade. De fato, a música é por sua vez expressiva e inexpressiva, séria e frívola, profunda e superficial; ela tem e não tem uma razão. Seria a música uma diversão sem limite? Ou talvez se trate de uma linguagem cifrada e como o hieróglifo de um mistério? Ou talvez os dois juntos?”.

Marcelo, um amigo várias vezes mencionado nos blogs, fez-me anos atrás a pergunta descontraída e que está, coincidentemente, explícita no texto de Jankélévich. Seria a música entretenimento e diversão ou algo mais? Respondi-lhe na ocasião que, fosse ela diversão ou simples entretenimento, não estaria eu a dedicar a existência cultuando-a. Jankélévich insere palavras fulcrais: “séria e frívola, profunda e superficial”. Séria teria toda relação com profunda, razão e conhecimento se aplicam à música clássica, culta, erudita ou de concerto. Frívola e superficial inserem-se no “codinome” efêmero. Os séculos apenas ratificam a imanência da música de concerto. Apesar da desproporção gigantesca entre a música permanente e a efêmera, é esta última que tem aumentado assombrosamente a divulgação frente às multidões que acorrem aos espetáculos, majoritariamente em amplos espaços. Para o gênero frívolo, a mutação constante e o esquecimento do que foi apresentado no espetáculo anterior norteiam aqueles que a ele se dedicam, promovem e arregimentam numeroso público, geralmente mais jovem. A mutabilidade do efêmero torna-o motivo de anseio para milhões de adeptos em busca de ídolos, incensados no ato, substituídos rapidamente por outros.

 

Não sou insensível à música não pertencente à denominada clássica. Admirei alguns “clássicos” da música popular e a lista é longa: o jazz band norte-americano sob a condução de Benny Goodman, Tommy Dorsey, cantores como Ella Fitzgerald, Bing Crosby, Frank Sinatra, Charles Aznavour e os nossos Lupicínio Rodrigues, Ataulfo Alves, Dorival Caymi, Tom Jobim e tantos outros. Suas criações, que perduraram durante décadas, basicamente estiolaram-se com o emergir frenético de tendências outras em mutação impactante e musicalmente duvidosas e descartáveis.

Essas divagações apenas ratificam algo que entendo como dádiva, a de continuar a cultuar a música denominada clássica. O repertório é imenso. O pianista teria de viver gerações para conhecer parte do legado deixado por mestres que escreveram para cravo, pianoforte e piano.

Finda a apresentação pública, abre-se um caminho novo que me entusiasma, o intimismo diante de amigos fiéis. Precedida de uma explanação sobre determinado tema, interpretarei periodicamente algumas obras referenciais. Regina participará executando criações que a História preservou. Se as sonoridades estarão presentes, dois livros começam a ganhar forma em minha mente.

Acredito ter respondido aos inúmeros leitores que generosamente me pedem para prosseguir. Nestes próximos meses outras gravações, constantes nos meus CDs, serão introduzidas no Youtube. Bem hajam.

Clique para ouvir, de Jean-Philippe Rameau, “Les Niais de Soligne”, na interpretação de J.E.M:

https://www.youtube.com/watch?v=xdKjHjNx700&t=299s

I have received many messages encouraging me to continue with the public performances. I’d like to make a few comments on the subject and thank the readers for their kindness.

Trinta e tais anos após

Quer-me parecer que um compositor deve ser,
antes de mais, um homem de cultura
que saiba traçar grandes linhas de força sobre o tempo.

Eurico Carrapatoso

Surpreendi-me ao receber e-mail de uma ex-aluna dos anos 1980 que esteve sob minha orientação na universidade. Jovem, aplicada, após a conclusão de seus estudos nunca mais tivemos contato. Ao ler a entrevista publicada pelo Jornal da USP (vide blog “Entrevistas e entrevistas”, 23/07/2023), obteve meu endereço eletrônico e escreveu.

A razão do contato foi motivada pelos estudos pianísticos que sua filha, hoje com 17 anos, está a realizar. Tem ela imensas dúvidas quanto ao repertório para piano, escolhas a serem feitas, níveis de dificuldade das obras e penetração junto ao público. Esses questionamentos revelam inicialmente um aspecto que considero fulcral, a curiosidade, senda que leva à vontade de saber, independentemente das palavras do seu orientador.

Prometi à minha antiga aluna que escreveria oportunamente um blog sobre o tema, que serviria mais como sugestão, dado o fato de o repertório para piano ter dimensão oceânica. Não obstante, há obras para cravo que se perenizaram, compostas a partir do século XVII, penetrando com ênfase o séc. XVIII, mas que são interpretadas ao piano e que hoje fazem parte do seu imenso repertório. Entre os meus 25 CDs gravados no Exterior, cinco foram dedicados a compositores daquele período glorioso, Johann Kuhnau (1660-1722), Jean-Philippe Rameau (1683-1764) e Carlos Seixas (1704-1742). Considere-se também as criações da segunda metade do século XVIII ao império do piano no século XIX a avançar pelo século XX, períodos em que o piano reinou entre todos os instrumentos. Apesar da imensidão do repertório para piano, parte substancial qualitativa a ele destinada está submersa, poucas vezes ou nunca visitada e fatores claros mostram-se presentes.

Teria a considerar que há basicamente três caminhos quanto à escolha repertorial. Uma, tradicional, em que o intérprete se fixará, e que corresponde ao grandioso repertório exaustivamente visitado. A maioria dos pianistas a ele se dedica. O notável compositor Gilberto Mendes (1922-2016) é incisivo ao criticar “…parte dos pianistas rotineiros, que já se tornaram como que mecânicos datilógrafos de um repertório burocrático”. Estes o fazem em detrimento de uma infinidade de outras criações dos luminares da composição, mas que, por motivos tantas vezes desconhecidos, não alcançam a graça do intérprete, seja por desconhecimento, pela própria exigência do mercado que prefere as obras já sedimentadas no gosto do público e pelo empresário que, na opinião do ilustre musicólogo argentino Juan Carlos Paz (1897-1972), só visa ao lucro. No que concerne aos concursos para piano que proliferam pelo planeta, a repetição ad nauseam das mesmíssimas, mas extraordinárias obras, diga-se, serve de efeito comparativo entre os concorrentes e desfaz seus prováveis interesses pelo desconhecido ou novo repertório. Administradores desses concursos, empresários, professores, patrocinadores e o jovem executante se satisfazem com essa engrenagem. Findas essas etapas de concursos, uma extensa maioria de concorrentes persistirá, durante a existência, a reverenciar em público o mesmo repertório hiperdivulgado.

Uma segunda escolha, sem desprezar o repertório tradicionalmente oferecido, embrenha-se na criação do passado que permanece oculta. Diria que se tem nesse compartimento a parte submersa de um iceberg. Nele, composições extraordinárias dos grandes compositores, possivelmente o volume maior de suas criações, lá se insere pelo fato de não ter havido, no momento histórico preciso, a divulgação necessária. Partituras depositadas em arquivos ou publicadas em edições urtext, aguardam a redescoberta. Somam-se, às criações sepultas de compositores bem aceitos, outras, de músicos qualitativos que jamais tiveram desvelamentos por motivos os mais diversos. Apenas a curiosidade que conduz ao aprofundamento motiva essa opção.

Uma terceira alternativa seria a da música contemporânea. Nesse item há de se ter cautela, mas se o aluno for bem orientado, encontrará criações excelsas. Necessária a prospecção e, a depender da orientação, o repertório contemporâneo pode ser uma opção de grande interesse. A proliferação de compositores das mais variadas tendências na atualidade exige do intérprete atento um espírito seletivo. O notável compositor francês Serge Nigg (1924-2008) afirmaria que “Quando um Festival especializado anuncia, como exemplo, ’80 criações mundiais’, tem-se frio na espinha”.

Antolha-se-me que, desde jovem, o intérprete deve saber ouvir as interpretações relevantes que, mercê da tecnologia, estão à inteira disposição através dos aplicativos. A escuta dos grandes mestres do teclado enriquece o gosto, aperfeiçoa o estilo e desperta o espírito crítico, pois quase todas as obras basilares compostas para piano têm várias gravações à disposição.

Se as três opções básicas mencionadas evidenciam vasto repertório e possibilidade de aprofundamentos, imperioso se faz, inicialmente, a dedicação ao repertório tradicional. Dele se extrairão as bases seguras para a visita às duas outras alternativas elencadas neste espaço e a escolha de um caminho. Todavia, de suma importância a atenção à Cultura Geral, como apregoa o autor da epígrafe, o notável compositor português Eurico Carrapatoso (1962-).

O questionamento de minha ex-aluna direcionava-se ao repertório. Contudo, consideraria ainda que, durante a formação, iniciada para muitos ainda na idade edipiana, há a imperiosa necessidade da formação daquilo que se considera como “técnica do piano”. Dezenas e dezenas de métodos, que partem da técnica mais elementar às formulações arrojadas, existem há mais de dois séculos. Não obstante, o jovem, tão logo tenha o domínio do teclado, deve ater-se às formulações técnico-pianísticas que se apresentam nas obras do repertório. Jean Doyen, um dos meus grandes mestres e inefável pianista (1907-1982, http://www.musimem.com/Doyen_Jean.htm), dizia que as fórmulas que foram essenciais no aprendizado, perpassando tantas vezes todas as tonalidades com a utilização do mesmo dedilhado, não serão empregadas durante a existência, mas sim cada desafio técnico exposto nas composições estudadas.

Disciplina, perseverança, dedicação, concentração e amor à Música são elementos basilares para que a evolução nos estudos se concretize de maneira harmoniosa.

Meus sinceros votos à minha ex-aluna e à sua filha que está a escolher uma atividade plena de sacrifícios, mas que traz resultados extraordinários não apenas musicais. Considero uma dádiva ser músico.

A former student writes to me asking for repertoire advice for her 17-year-old daughter. I consider three basic categories possibilities concerning the solo piano repertoire.

O leitor diante da realidade

Esperança, ventura da desgraça.
Trecho puro de céu sorrindo às almas
Na floresta de angústias da Incerteza!

Annibal Theophilo da Silva (1873-1915)

A recepção ao blog anterior foi considerável. Os amantes da estrutura formal do Soneto são muitos, pois essa organização tem, entre outros atributos, a peculiaridade da rima, que corrobora a memorização do poema. Foram diversas as mensagens que, atendo-se ao conteúdo do Soneto, testemunham integralmente o triste fato de a nossa língua falada e escrita estar a se deteriorar numa rapidez jamais sentida. Concordam com os últimos parágrafos do blog anterior, acrescentando exemplos diários de jornais, revistas, televisão aberta e fechada, sites diversos em que a língua mater é vilipendiada, sem contar o conteúdo, ou melhor, a sua ausência. O descaso nesses veículos, como vírus, infecta os leitores e ouvintes e o erro passa a ser entendido como norma, passo essencial para a derrocada.

Gildo Magalhães, professor titular da FFLECH-USP, escreveu: “Foi ótima a sensação de que despertou um livro que faz sonhar. Tocou-me fundo, cultor de sonetos que sou, forma sublime porque é como a sonata musical: o conteúdo é aberto dentro do que aparentemente é uma imposição fechada. É este o caso ainda mais extremo do hai-kai. Lembrei-me de minha avó paterna, que sabia declamar de cor um rol enorme de sonetos e me acordou o gosto da poesia. Enfim, há ainda a grave advertência que o amigo lança, de estiolamento da língua pátria, dessa ‘última flor do Lácio’. A ignorância é medonha, porque ela tem o poder de crescer e tomar de assalto mesmo almas puras. Enfim, há que lutar – e viva Laudelino Freire!”.

Estou a me lembrar de meu saudoso Pai, admirador confesso do Soneto. Sabia de cor mais de três centenas de Sonetos e aos 100 anos fazia questão de memorizar um novo, português ou brasileiro, para recitá-lo numa tertúlia acadêmica paulistana nomeada “Pensão Jundiaí”, frequentada por Lygia Fagundes Telles, Paulo Bonfim, Geraldo Vidigal…. Entre os autores preferidos do meu progenitor, Antero de Quental, Guerra Junqueiro, Olavo Bilac, Raimundo Corrêa, Virgínia Vitorino, esta, poetisa portuguesa cujos versos amorosos meu Pai recitava para minha também saudosa Mãe. Sob outra égide, tinha na memória a fala dos três prelados da “Ceia dos Cardeais” de Júlio Dantas, e era um prazer para aqueles que o conheceram vê-lo a declamar. Possivelmente devido à verve paterna, meu irmão Ives Gandra, mercê de raro talento poético, escreveu tantos Sonetos.  Somente para sua saudosa esposa Ruth, mais de um milhar!

Flávio Amoreira, poeta, escritor e crítico literário, teceu comentários: “Emocionado realmente visitei o blog do imenso esteta dedicado ao piano e virtuose internacional que me honra com sua amizade José Eduardo!  A arte de Petrarca em destaque pelo relance da sua estante de uma furtiva brochura revelando antologia de versos conforme a quase milenar arte de Petrarca!  Não bastassem os mestres Bilac e Bandeira, a delicadeza dum soneto do Imperador-mestre, a tragicidade do Menotti, deparo-me com o sonetista atlântico Vicente de Carvalho! meu conterrâneo a quem dedico toda minha paixão literária, de quem herdei livros pelo seu filho caçula dentre os 16 e por quem minha terra deve desde os jardins da praia até os mais belos poemas marítimos da nossa língua.  ‘Velho Tema’ que encantou Pessoa e até hoje um dos poemas mais reveladores sobre a débil condição humana….ah José Eduardo sem palavras este que vive delas e para elas…que resgate!”.

Nossa filha Maria Beatriz escreveu: “Gostei que contrapôs a beleza da criação dos sonetos à pobreza a que chegou o uso corrente da língua portuguesa nas redes sociais. E, nem causa mais espanto, encontrei um erro crasso em uma manchete de jornal de grande circulação, no domingo passado. Sim, em veículo onde anteriormente isso seria inconcebível. Talvez porque não haja mais revisores… A forma do soneto exprime uma ordem e uma beleza (não é linda a melodia ritmada que se ouve ao se recitar um soneto?) que, por sua vez, derivam de uma ordem e beleza da criação primeira, formada justamente pela Palavra: ‘No princípio era o Verbo.’ ‘Faça-se a luz… Façamos o homem à nossa imagem e semelhança…’ No entanto, pai, como você detectou no artigo, ‘com os novos rumos’ advindos do modernismo, ‘sempre in progress quanto à forma e conteúdo’, não se encontrou e não há mais freio à desconsideração desse trato das palavras. A palavra só existe porque endereçada a alguém que a receberá. A forma da mensagem será tão mais arbitrária quanto menos consideração se der ao seu receptor, hoje tão impessoal… mas resta o alento de se poder acessar belos textos com beleza e ordem próprias, ainda que escondidos na estante entre livros maiores…”. Referência que Maria Beatriz faz ao volume de dimensão diminuta da “Pequena Edição dos Sonetos Brasileiros”.

Tantos outros atentos leitores enviaram mensagens curtas, demonstrando preocupações com o trato do idioma, que está a evoluir mal.

Ao longo dos anos não deixo de salientar essa progressiva degeneração da linguagem, que se soma àquelas dos costumes e da moralidade. Diariamente o cidadão comum e laborioso assiste, pelos veículos de comunicação, a língua mater ser vilipendiada sem rubor algum por próceres. Erros gramaticais entre políticos proliferam e são entendidos como corretos, aparência da verdade.

Quando na vida universitária, incontáveis foram as vezes em que a leitura de projetos no âmbito da pós-graduação deixava claro que os textos estavam eivados de erros gramaticais, inviabilizando da minha parte a aceitação do candidato às titulações acadêmicas. A rápida transformação sem tréguas da internet levará à certeza do desmonte linguístico, a contrastar com a histórica lenta adequação da língua escrita e falada. Em menor grau, pode-se notar essas transformações nos idiomas inglês e francês, plenos de neologismos transitórios, mormente na área da economia e do entretenimento.

Seria possível acreditar em uma recuperação lenta, mas constante, nessa árdua luta a visar à perpetuação de estruturas básicas da linguagem. Para tanto, haveria a necessidade imperiosa de não olvidar as origens. Nesse quesito, a leitura dos autores que a História preservou seria o alento. Sem essa indispensável âncora, corre-se o risco de se pensar apenas no presente, que contamina o futuro incerto.

A música como “poesia incorpórea” na definição de Guerra Junqueiro encontra na figura do nosso maior compositor romântico, Henrique Oswald (1852-1931), o exemplo sonoro de inúmeros Sonetos selecionados por Laudelino Freire para a “Pequena Edição dos Sonetos Brasileiros”.

Clique para ouvir, de Henrique Oswald, “Tre Piccolli Pezzi”, na interpretação de J.E.M.:

(364) Henrique Oswald – Tre Piccoli Pezzi – José Eduardo Martins – piano – YouTube

Da “Pequena Edição…”, comentada no blog anterior, extraio um Soneto que traz uma precisa mensagem:

Filinto de Almeida (1857-1945)

“Dor Ignota”

Como eu te amei! Que santa idolatria
Na minha santa infância eu te votava!…
Se mais do que te amei, eu não te amava,
É que amar inda mais eu não podia.

Qual o martírio, pois, que te mogoava?
Qual era o espinho então que te pungia?
Que amarguranublava-te a alegria?
Que dor cruel teu peito angustiava?

Teus olhos, nunca enxutos do teu pranto,
Tinham, às vezes, o funesto brilho
De crua dor que eu nunca adivinhei

Que tinhas, pois, tu que sofreste tanto?
Responde à triste voz do triste filho,
Mãe! terna Mãe, que eu nunca mais verei!

Readers wrote with comments on the six sonnets of the previous blog. They also made brief, unanimous remarks about the current disdain for good speaking and writing skills. I have selected comments from three readers.