Navegando Posts publicados em julho, 2007

Questão de Estilo

ESMAE/IPP

Retornei à bela cidade do Porto para a segunda sessão do 1º Concurso, a nível nacional, de provas públicas para provimento de uma vaga de Professor Coordenador do quadro da Escola Superior de Música e das Artes do Espetáculo do Instituto Politécnico do Porto, para a área científica de Música, na especialidade de Piano. Foi a primeira vez em Portugal que houve Concurso para essa finalidade.
As primeiras reuniões deram-se em fins de Maio, quando estava eu em Portugal para recitais em várias cidades, constando minhas observações das Impressões de Viagem deste blog. As reuniões posteriores foram agendadas para a primeira semana de Julho em sua integralidade. Ponderações mereceriam comentários, a fim de que compreendamos outro estilo de procedimento, um olhar diferenciado sobre este ritual da vida acadêmica.
A Escola teve o cuidado de convidar professores pianistas desconhecedores dos seis candidatos inscritos, assim como professora de área teórico-musical de outra Instituição de Ensino em Portugal. Uma das características essenciais era a experiência internacional dos inscritos: teses, apresentações artísticas, textos publicados com inserções em Portugal e fora de suas fronteiras. Só essa constante já estava a apontar qualidade dos candidatos. Logicamente, diferenças havia, mas foi inegável o nível de um Concurso visando apenas a um cargo. Com a desistência de um dos candidatos, tivemos pois cinco concorrentes. Aulas teóricas e práticas, recital dos competidores, análise dos currículos, o fato é que o desiderato precípuo esteve sempre a apontar preocupação única pela qualidade daquele que deveria ocupar o cargo. Apesar da dificuldade em escolher o candidato, pois realmente os dons diferenciados dos pianistas professores foram uma surpresa, na apuração verificou-se um consenso quanto à vencedora. A preferência recaiu sobre a pianista e professora Madalena Soveral, de longa trajetória como intérprete em Portugal e em outros países, mormente na interpretação de autores referenciais da música contemporânea.
Ficou-me a nítida certeza de uma total isenção quanto à escolha do futuro Coordenador para a área específica de Piano. Esse desconhecimento prévio dos candidatos, por parte dos membros pianistas do júri, razão transparente da comissão organizadora e do Presidente do Concurso, o Professor Fernando Beja, de outra área que não a Música e impecável na condução do processo, deu consistência fundamental ao todo desse Concurso histórico em Portugal. Entre os membros, tive o grato prazer de rever meu colega de longa data, pianista e professor Caio Pagano, assim como a Professora Elisa Lessa, Diretora do Departamento de Música da Universidade do Minho. Sob égide outra, o comprometimento do Instituto, no sentido de custear passagens aéreas e outras despesas num Concurso em duas etapas, evidencia o rigor em relação ao objetivo almejado, exemplo a ser seguido.

Considerations regarding my experience as member of a hiring committee for the selection of a coordinator of piano teachers at ESMAE/IPP (School of Music and Performing Arts of the Porto Polytechnic Institute).

Meliponideos – Abelhas do Convívio

A colméia entre as ramas da unha-de-gato. Foto J.E.M.

O inverno está a começar e raios solares atenuam-se graças à sua menor incidência sobre o hemisfério sul nesse período. Num fim de tarde agradável, quando o sol já buscava ocultar-se, observei que um pequeno foco de luz recaia diretamente sobre a entrada de uma colméia logo abaixo de minha janela. Presenciava um espetáculo rotineiro extraordinário. A luz mostrava-se tênue, realçando o cenário. As pequenas abelhas negras, sem ferrão, mergulhavam em vôos rápidos e rasantes no orifício de pouco mais de sete centímetros de diâmetro, a buscarem proteção durante a longa noite. Era uma sucessão contínua, que se prolongou. Pouco a pouco fazia-se sombra e rapidamente começou a escurecer.
Fiquei a pensar durante um bom tempo. Que relação plena com os filmes de ficção, onde pequenas naves espaciais recolhem-se à nave mãe! Exatamente da mesma maneira e com a mesma precisão. Nos filmes, geralmente não há equívocos, a depender dos roteiros. Na natureza, as abelhas fazem essas incursões sem jamais errar. Absoluta competência.
Há trinta e tal anos convivo com essa colméia. Diria que faz parte da família. Essas abelhas, em suas muitas gerações a povoarem o mesmo local, inicialmente construíram sua morada na compacta vegetação conhecida como unha de gato, que com o tempo tudo cobriu, exceção à entrada. Um volume apreciável é possível perceber. Não ferroam, mas causam um grande transtorno àqueles que se aproximam, a fim de aparar as ramas da unha de gato. Estou a me lembrar de um velho jardineiro, que durante muitos anos freqüentou nossa casa para podar essa trepadeira tão comum. Munia-se de um pano sobre a cabeça, óculos de piscina, tampão para os ouvidos, luvas e ia ao corte. Praguejava sempre quando nesse mister. Após o ótimo trabalho do bom homem, tinha por hábito olhar para a entrada da colméia a ver, com mais clareza, a rotina de entrada e saída das pequenas abelhas negras. Num determinado dia, não vi esse movimento. Subi numa escada e, devidamente protegido, verifiquei in loco que o apavorado jardineiro havia introduzido um pano embebido em querosene à entrada da colméia de minhas velhas amigas. Retirei o trapo com o devido cuidado, elas vieram sobre mim, mas tudo se passou bem, pois entendia de longa data as reações desses insetos tão necessários. Dizem que essas abelhas produzem ótimo mel e, como não ferroam, imiscuem-se pelos cabelos, tornando-os uma pasta, ou então azucrinam os ouvidos. Alguns as chamam de Abelha Cachorro, mercê do ruído, outros de Jataí… O certo é que todas as abelhas são insetos Hymenopteros, da extensa comunidade Apoidea. Se denominações variam, dependendo das regiões, o certo é que as pequenas abelhas negras em questão, minhas vizinhas tão próximas, são familiares. Não raras vezes, uma delas entra em meu quarto, permanecendo longos momentos. Após, busca o seu habitat original. Essa colméia tão antiga integrou-se à minha história. Partilhamos uma convivência tranqüila. Que continuem seu destino de fidelidade à velha morada!