Navegando Posts publicados em março, 2011

“Adagiário Açoriano”
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Parece-me, Sancho,
que não há rifão que não seja verdadeiro,
porque todos eles são sentenças tiradas da própria experiência,
mãe das ciências todas.
Miguel de Cervantes
Don Quixote de La Mancha, Livro III, cap. XXI

 

Luca Vitali, o excelente artista plástico, mora hoje no Guarujá. Sempre que vem a São Paulo visita sua cidade bairro, Brooklin-Campo Belo. O prazer de estarmos juntos para uma conversa descontraída em um dos cafés do bairro torna-se uma constante.

A certa altura me pergunta o porquê dos ditos populares açorianos frequentarem meus blogs em forma de epígrafe. Não é a primeira vez que fazem tal observação.

Se considerarmos a arte e todas as suas categorias ou a literatura como perenidades, o povo, essência essencial, tem sempre de ser lembrado. Ao longo dos séculos, é a manifestação popular que subsiste e transpõe gerações. Geralmente sofrido, tendo de gerar a riqueza dos países, essa massa anônima, tanto no campo como nas cidades, recebe todas as agruras da natureza e pior, o tacão do Estado através de impostos abusivos, mormente a ele destinados e, tantas vezes, a exploração dos poderosos. Porém, a tradição tem de continuar e assiste-se anualmente em todo o planeta à perenização das festas populares, das venerações às figuras sacras, da descontração e do recolhimento interior coletivo em datas especiais. Permanece na história das histórias das civilizações esse pulsar, que é ainda uma das salvaguardas da humanidade.

Em posts anteriores já mencionara o impacto que a tournée que realizei em 1992 por três ilhas do arquipélago dos Açores me proporcionou. No meu imaginário, o Arquipélago está como um dos paraísos possíveis, tão grande foi a minha empatia com as terras percorridas e com aquele povo singular. E de pensar que aquelas ilhas estão numa primeira terça parte, se considerada for a distância Lisboa-Nova York. Sob outro aspecto, fica em região por onde passa uma fenda que se estende do Círculo Polar Ártico à Antártida. Abalos sísmicos por lá são constantes, assim como ondas, por vezes, gigantescas. Presenciei uma delas aproximar e defrontar-se com estrondo sobre uma falésia em Angra do Heroísmo.

O arquipélago dos Açores foi descoberto em 1427, quando os marinheiros portugueses já vislumbravam o além-mar por ordem precisa do Infante D. Henrique (1394-1460). Pertencentes a Portugal, as nove ilhas ocupam 2.300km2, sendo a maior São Miguel, com seus 747km2, e a menor, Corvo, com apenas 18km2. Os Açores foram povoados paulatinamente. A população do arquipélago não chega a 250.000 habitantes, mercê de imigrações acentuadas, mormente para os Estados Unidos. No Brasil, em séculos anteriores a imigração açoriana se fez presente, principalmente em Santa Catarina.

Daquelas terras visitadas para recitais e palestras trouxe quantidade apreciável da literatura açoriana, traduzida em romances, livros de arte e de história. Entre as obras acalentadas, o Adagiário Popular Açoriano (Armando Cortes-Rodrigues. Adagiário Popular Açoriano, Angra do Heroísmo, Antília – Secretaria Regional da Educação e Cultura, 2 volumes, 1982).

Há muitos termos que se apresentam como sinônimos parciais. Adágio, provérbio, ditado, dito popular, rifão e outros mais. Há, contudo, determinadas nuanças interpretativas. Como exemplo, provérbio tem carga a exprimir veracidade a ser considerada, enquanto o adágio contém, por vezes, um certo sentido imediato e jocoso. Como observa Francisco Carreiro da Costa, autor do prefácio do Adagiário Popular Açoriano, “os adágios são um prodigioso manancial para o estudo das tradições populares”. Os ditados populares, de origem anônima e constituídos de frases curtas, são atemporais, pois impossível precisar o nascimento de determinados rifões. Depositados durante anos, decênios ou séculos, os adágios podem sofrer alterações em um ou outro termo, mas restringem-se ao conteúdo essencial, a ser transmitido através da oralidade.

Apesar de profundo parentesco com o adagiário do continente, o popular açoriano é rico em peculiaridades, com distinções, por vezes tênues, entre ditos populares nas várias ilhas. Estudos aprofundados foram realizados ao longo das últimas décadas a respeito do adagiário açoriano, inclusive teses acadêmicas. Há debruçamentos pormenorizando-os em Portugal, nos Açores e no Brasil. O espaço a que me proponho semanalmente no blog impede-me de detalhar essa profícua literatura de estudos, que poderá ser acessada via internet.

Sempre que um tema do cotidiano penetra em seara mais descontraída ou a necessitar de qualquer conceituação, instintivamente lembro-me desse precioso Adagiário Popular Açoriano. Primeiramente pela riqueza e, a seguir, pela proximidade tão evidente entre os ditos populares dos Açores e os frequentes no Brasil. O autor da coleta, Armando Cortes Rodrigues, organizou-o alfabeticamente, o que proporciona o prazer de se apreender as diferenças ocorridas nessas frases nas ilhas espalhadas pelo Atlântico Norte, numa latitude idêntica à continental portuguesa. A metodologia empregada torna mais fácil a busca temática. Sob aspecto outro, o Adagiário reflete bem “a idiossincrasia, os costumes, as tradições e preconceitos morais dos Açorianos”, segundo Francisco Carreiro da Costa.

Faz-se necessária a exemplificação, a traduzir a atávica observação do povo açoriano naquilo que lhe é familiar. Insular, em terras sujeitas a constantes tremores, tem mais acuradamente o senso da percepção. Selecionamos alguns entre os milhares mencionados nos dois volumes.

Arquipélago dos Açores.

Adágios advindos do captar meteorológico:

Abril chuvoso,
Maio ventoso
e Junho amoroso,
fazem um ano formoso.   (Flores)

Baleia no canal,
terás temporal.  (S. Jorge)

Dia de Maio,
dia de má ventura,
m
al amanhece,
logo escurece. (Santa Maria)

Em Janeiro dá a capa ao marinheiro
e em Maio, tira-a. (Pico)

Em Maio,
a chuvinha da Ascensão
dá palhinhas e dá grão. (Terceira)

Em Outubro, Novembro e Dezembro,
quem come do mar,
tem que jejuar. (Pico)

Névoa pela manhã,
sereno hoje,
sereno amanhã
. (S. Jorge)

Nuvens paradas, cor de cobre,
é temporal que se descobre
. (Pico)

Trovão no Verão,
Água na mão
. (Flores)

De ordem moral:

A boca que mente,
Mata a alma. (Pico)

Antes morte
Que vergonha. (Terceira)

Antes uma saia velha
De boa fazenda
Do que uma saia nova…
Nosso Senhor nos entenda. (Flores)

Chuva goteira,
mulher trameleira,
põem um homem na rua. (S.Miguel)

Do amor, que não convém,
nasce o mal e pouco bem. (S.Miguel)

Mais vale honra
do que riqueza. (Corvo)

Ninguém diga o que não sabe
nem afirme o que não viu. (Flores)

Quem perde a honra, por causa do negócio,
perde o negócio mais a honra (S.Jorge)

Viúva honrada,
Porta fechada. (S.Jorge)

Da mesa, do alimento e da bebida:

Antes um naco de pão com amor
do que galinha com dor. (S.Jorge)

Da tigela à boca
se perde a sopa. (Flores)

Disse o leite ao vinho:
- Venhas em boa hora, amigo. (S.Miguel)

Em cima de comer,
nem carta ler. (S.Miguel)

Em cima de melão,
de vinho um tostão. (Santa Maria)

Em Janeiro,
um porco ao sol,
outro no fumeiro. (S.Miguel)

Sabe da panela
quem mexe nela. (Flores)

De ordem do cotidiano jocoso:

Divertido ! Divertido !
deu a mulher no marido. (Pico)

Mula que faz him
e mulher que fala latim
raramente há boa fim *. (S.Miguel)
(* “Na linguagem popular micaelense fim é sempre feminino”)

Mulher barbuda,
de longe a saúda. (Faial)

De categorias várias:

Bem toucada,
não há mulher feia. (S.Miguel)

Dinheiro compra  pão,
não compra gratidão. (S.Miguel)

Enquanto há dívidas,
não há herdeiros. (S.Miguel)

Mais vale muito saber do que muito ter. (Santa Maria)

Mulher de janela,
nem costura nem panela. (S.Miguel)

Não há oiro
sem fezes. (S.Jorge)

Quem menos sabe, mais finge saber. (Santa Maria)

 

Gostaria imenso de inserir tantos outros ricos adágios que se espalham em diversas categorias do viver. O espaço de um blog pressupõe determinados limites. Fica, contudo, nessa diminuta exemplificação, o pulsar do povo insular que permanece através dos séculos, nessa ladainha repetitiva e saborosa que está sempre a sofrer acréscimos. Diferentemente dos modismos das frases que têm vida breve e geralmente oriundas dos meios televisivos, o que realmente se pereniza é essa fala incisiva, ingênua, despretensiosa e, sobretudo, anônima. A única certeza, o adágio não morre.

 
A friend, the graphic designer Luca Vitali, asked me why so many of the epigraphs in my posts are Azorean proverbs. His question brought back memories of my trip to the Azores islands in 1992 and the book of Azorean adages in 2 volumes I bought on the occasion. In this post I comment this collection of short sayings, some brilliantly phrased: their straightforwardness, irony and practical wisdom.

 



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O Interesse dos Leitores

Eu tenho que confessar meu espanto, por vêzes consternação,
face a atitude de certos públicos “especializados” nos santuários
daquilo que nesciamente nomeou-se arte contemporânea.
Por que não falarmos de masoquismo ?
De outra maneira, eu não explicaria essa espécie de empenho
em aceitar a chatice de se ouvir sempre os mesmos disparates técnicos
destinados a “preparar os ouvidos”,
depois esse tipo de  servidão que leva, após o concerto,
expressões fabricadas (“interessante ! divertido ! muito forte !…”),
somente destinadas a mascarar a decepção.
Por que tanta gentileza e amabilidade
quando acabamos de ouvir verdadeiros horrores ?
O que poderia justificar, entre os melômanos sinceros,
a aceitação de tais sofrimentos, a absorção de poções também amargas ?
Serge Nigg

Tantas são as impressões que um livro pode nos causar. A leitura pressupõe interesse, e quão mais uma obra nos diz algo, mais referências ficam gravadas. Livro bom não é esquecido, nem na memória, tampouco na estante.  Acalentado, pode esclarecer-nos,  abrir novos rumos, fazer com que mudemos, inclusive, determinados conceitos.
Resolvi escrever um blog sobre o livro “Serge Nigg, compositeur” porque constatei que, através daquelas páginas que não atingiam a centena, havia conceitos de extraordinária força, pensados por um músico que no final da vida estava a planar sobre o infindável campo do conhecimento. A recepção às ideias de Serge Nigg foi imensa. Leitores – músicos, amadores e leigos -  pronunciaram-se, inclusive um arquiteto, a apreciar trecho de sua área de atuação. Selecionei alguns comentários mercê do espaço proposto para o blog.

Dois compositores brasileiros da maior dimensão escreveram a opinar. Ricardo Tacuchian observa: “Não conheço a obra de Serge Nigg e fiquei impressionado com as ideias dele que você resumiu de modo primoroso. Vou procurar conhecer mais a obra e o pensamento deste homem que, tão solitariamente, desmistifica o mundo ‘populista e oficial’ das artes. Me identifiquei com quase tudo que você cita em seu post. Mais uma vez, parabéns pelo seu trabalho semanal e obrigado por esta valiosa informação  sobre uma figura tão eminente e com um pensamento tão próximo ao meu”. Mario Ficarelli comenta: “Que prazer foi para mim ler o depoimento de Serge Nigg. Foi como estar lendo algum depoimento meu de agora ou no futuro. Compartilho plenamente todo o seu pensamento a respeito da composição”.

De Portugal, a competente professora e gregorianista Idalete Giga considera: “Gostei demais do seu post sobre o compositor Serge Nigg, que eu desconhecia. As respostas a Gérard Dénizeau revelam-nos um compositor profundo, que está já  muito para além do barulho do mundo. São uma verdadeira lição de sabedoria, de coragem, de despojamento. É curioso que, quando fala de modismos, do dodecafonismo, do ‘progresso em arte’, da música electroacústica, dos compositores snobs, da obra aberta, etc. entra em cheio no meu pensamento. Estou em plena sintonia com ele. ‘Captar o passado, Apreender o presente, Pressentir o futuro’  é o essencial para a criação de uma obra de arte, que não deve estar sujeita a ‘modismos’. De facto, são raros, muito raros os compositores que conseguem sintetizar o passado, criar  a partir dele no presente e projectar-se no futuro. Isto sempre senti, por ex., no nosso genial J.S. Bach.”

O compositor e orquestrador francês de reais méritos, François Servenière, tece comentários: “Li e reli seu post consagrado a Serge Nigg. Conhecia, não pessoalmente, o professor compositor do Conservatório de Paris, mas foi ele mestre de inúmeros amigos meus compositores, entre eles Josef Baán, eslovaco. Concordo com muitas de suas conclusões, assim como com sua lucidez em relação ao dodecafonismo através das impressões anteriores de Schöenberg… e sobre muitos outros temas abordados”.

O arquiteto Marcos Leite atém-se à sua área e discorda da comparação feita por Serge Nigg a respeito da comparação arquitetura-música: “A solidez é só parte e consequência da concepção do projeto. A criação é resultado de uma bagagem obrigatória do Arquiteto que sabe que seu projeto tem solução estrutural exequível e, muitas vezes, já o apresenta ao engenheiro calculista. A estética aceitável é bom uso da técnica disponível aplicada à nova proposta de desenho e atendendo à funcionalidade do uso “.

K. Vertessem, da Holanda,  enviou e-mail via site: “Serge Nigg é para mim referência. Colegas meus estudaram com ele e entendiam o seu pensamento enciclopédico, mas coerente quanto à sua linha adotada, do dodecafonismo às obras menos herméticas.  Interessa-me muito essa publicação da Université Sorbonne. Vou providenciar”.

Curiosamente, os três primeiros, competentes músicos, sentem a identificação plena, dizendo que poderiam até ser os autores de determinadas posições adotadas por Serge Nigg. Sobre a música eletroacústica, Serge Nigg mostra-se absolutamente refratário. Recordo-me de ter assistido pela televisão em Paris, na década de 1990, mesa redonda em que dirigentes de gravadoras e jornalistas discutiam sobre a indústria fonográfica. À música erudita ou de concerto estava reservada uma fatia irrisória quanto à vendagem – comparada com a música popular – e dessa fatia a música eletroacústica representava parcela ínfima… da música erudita ! Seria possível pressupor que o contato humano, geralmente inexistente, esteja a apontar as causas, mesmo que Festivais tenham público aficionado. Seria essa ausência “humana”, no complexo elo criação e interpretação, que motivaria Nigg a refletir sobre a matéria. Diferentemente da gravação, onde o pulsar e até a respiração do intérprete podem ser ouvidos, a música eletroacústica apontaria para outro direcionamento. Mesmo quando há interação nessa intermediação eletroacústica e intérprete, haveria sempre uma metamorfose, não dos segmentos eletroacústicos registrados, mas do próprio ato instantâneo do executante. É algo para outras reflexões, apesar de, paradoxalmente, projetos relacionados à eletroacústica serem os que estão a  receber polpudas verbas de institutos de fomento. Acrescentaria, tendências não inteiramente compreendidas pelos fomentadores e minimamente aceitas pelo público de concertos. Voltemos ao blog sobre Serge Nigg que despertou tanto interesse: modismos ?

Importa considerar que os testemunhos de Sérgio Nigg despertaram um tão grande interesse. Prova inconteste de seu pensamento incisivo.

Readers of my post on Serge Nigg  – among them many professional musicians –  wrote to me giving their views on Nigg’s words. The post of this week is a selection of some messages I received.

Cidadão, Figura Indefesa

Catador de papel. Desenho de Manuel Martins.1936. Clique para ampliar.

Que falta nesta cidade ?… Verdade.
Que mais por sua desonra ?… Honra.
Falta mais que se lhe ponha?… Vergonha
Quem a pôs neste socrócio ?… Negócio.
Quem causa tal perdição ?… Ambição.
E no meio desta loucura ?… Usura

Gregório de Matos

Não foram poucos os posts em que deixei registrada minha indignação contra o acúmulo da falta de respeito que governo e iniciativa privada têm pelo cidadão comum. Falou-se, e isso continua a ser prioridade na conversa e nos textos de articulistas conscientes, sobre a corrupção, outra endemia que atinge ambos os setores, o público e o privado. O cidadão que paga tributos, entre os mais elevados do mundo, não tem sequer o mínimo ressarcimento através de atendimento de saúde, educação e segurança. Se recursos ele não tiver, estará condenado às filas intermináveis, ao atendimento o mais burocrático – abusivamente lento – por parte do governo. Realmente, vive-se o desrespeito ao mínimo anseio do indivíduo. Ele só existe perante o governo desde que contribua com os polpudos impostos, e que não falhe nesses pagamentos, pois o Leviatã estará pronto para atingi-lo no cerne. Um dia de não pagamento e o aparelho de contagem sempre ascendente do Estado será impiedoso até às últimas consequências.

O desrespeito estaria demonstrado em pequenos atos que se tornaram rotineiros. Uma das empresas de telefonia tem gravação automática com a frase “esse telefone não existe”, sempre que, por qualquer motivo, o aparelho estiver fora do gancho ou em outra função. Aquilo que não existe é inexistente, daí o prefixo in + existente. Ora, o número existe, mas está por alguma razão indisponível. Essa frase seria passível de ação judicial, houvesse vontade individual ou coletiva, caso não estivesse o cidadão comum tão anestesiado pelos sucessivos desrespeitos. Sem pensar em outras categorias de desrespeito: crianças e adultos jogados nas calçadas e levados ou às drogas ou à difícil situação de catadores de latas e papelão.

Empresas as mais diversas e instituições governamentais em quantidade desrespeitam o cidadão comum ao fazê-lo esperar para ser atendido ao telefone, através de vozes gravadas e “músicas” repetidas ad nauseam. Se paciente o cidadão comum não for, terá, por vezes, de aguardar minutos, ou dezenas deles. Essas vozes eletrônicas desfilam números sequenciais para orientar o infortunado por caminhos sem respostas, causando irritação, preocupação que inexiste para senhores que instituíram tal procedimento. Criada pelo homem a fim de afastar questionamentos por parte do usuário, só ao final indica a gravação que haverá alguém – humano ! – para atender o incauto. Com sorte, como num jogo de azar, tem-se esclarecimentos. Se houver atendimento, dirá a voz do atendente – tantas vezes – “orientando” o desorientado para que busque outro número, ou mais, instante estressante, cai abruptamente a ligação. Havia regulamentação, s.m.j., a respeito de penalidades contra esses abusos diários e quantitativamente assustadores. Hoje a voz gravada quando adentramos um estacionamento para a  retirada do ticket retrata nosso fracasso frente à máquina erigida por quem pode. Se problema houver, todo o mecanismo trava.

Nada acontece neste país para que regulamentação seja feita em defesa do cidadão comum, pois poderosos não são punidos. Pelo menos é o que parte consciente da mídia escrita e falada cotidianamente professa com outras palavras. Como se não bastasse, há o rosto oculto, o total obscurantismo, quando dados só são transmitidos via internet. Generalizou-se esse processo. Os poderosos ficam ainda mais protegidos. Sem solução prevista, pois um ser “humano” sem rosto, o lobista,  saberá no momento preciso articular a vontade dos “interessados”  junto aos legisladores. Nada mais a fazer, pois radicada a prática nas entranhas do poder. E todo o mal está feito.

Foi pois com indignação que verifiquei esse desrespeito ao cidadão quando leitores generosos me escreveram ou me comunicaram por telefone, no início de Março, que meu blog “não mais existia”. Graças ao meu dileto amigo Magnus Bardela, conhecedor profundo dos meandros da internet, chegamos a recuperá-lo a duras penas. Numa das “conversas” via chat, informaram-me que haviam escrito e-mail em Novembro a dizer que o blog, pago religiosamente, seria desativado em Fevereiro. Não apenas não acusei ter recebido, como a empresa deveria, semanas ou dias antes, prevenir-me do desligamento abrupto, a fim de que pudesse comunicar aos meus leitores bem antecipadamente. Mercê da ação rápida e longa de Magnus, através de inúmeras “conversações” com a empresa, conseguiu a migração do blog para o site, assim como, mais tarde, recuperar o antigo e atual endereço. Se eu, com minhas limitações na área, tivesse de resolver o problema, hoje o prezado leitor não mais teria acesso ao blog, tampouco eu poderia postá-lo.

Houve, contudo, modificações no menu e na estrutura, o que foi resolvido por Magnus após longo labor. Nada que altere o conteúdo, esse que pretendo manter intocado e a atender a fidelidade semanal que me acompanha desde 2 de Março de 2007. Toda a dedicação de meu ex-aluno, hoje meu mestre nessa mutante internet que não consigo acompanhar, merece meu agradecimento pleno.

Continuarei. É o que sei fazer. Enquanto o pensar estiver a produzir textos, eles surgirão. Isso máquina alguma poderá estancar. A não ser o imponderável. Mas aí, só dependemos de um Poder Maior que nos concede tréguas para que trilhemos nosso destino.

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O post foi publicado e horas após já recebia da Alemanha comentário do excelente maestro Roberto Duarte. Transcrevo-o sob sua permissão:

“Só gostaria de acrescentar mais um desrespeito, porém em nossa área de trabalho. Segundo consta, a OSB no Rio de Janeiro resolveu, unilateralmente, fazer uma ‘avaliação de desempenho’ em t-o-d-o-s os seus integrantes, sob pena de demissão. Qualquer empregador tem o direito de avaliar os seus funcionários, é verdade, mas, onde está o respeito àqueles que há décadas partilham com a OSB dos dias de glória e das grandes dificuldades financeiras que a instituição passou ? O ser humano, no caso o instrumentista, será uma peça descartável e sem alma que o seu ‘dono’ poderá dispor ao seu bel prazer ? Transformar-se-ão as nossas orquestras em meros robôs ? Qual é o futuro desta ‘nova’ humanidade ? A situação é preocupante”.

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