O Leitor como Destino

Só existem dois dias do ano que nada pode ser feito.
Um se chama ontem e o outro amanhã,
portanto hoje é o dia certo para amar,
acreditar, fazer e principalmente viver.
Dalai Lama

E chegamos novamente a uma cifra redonda. O contador é inflexível e apresenta uma realidade interessante. A curva lembra a de um cardiograma, sobe e desce, mas temporariamente atinge um pico não alcançado, para declinar a seguir. Essa cumeeira de tempos em tempos é superada e assim o blog caminha nessa flutuação ascendente, nas asas da imaginação.  

O fato dos temas serem diversos – abrangendo música, artes, cotidiano, política, resenhas e comentários, impressões de viagem, esportes – poderia indicar que giramos em torno de um núcleo. Contudo, a riqueza desses tópicos é tal que, como um leque, um universo de novas ideias está sempre a se abrir.

Madalena, colega dos anos 1950, perguntou-me há dois anos algo que me levou à reflexão. A mídia divulga resenha de livros que estão a ter vendagem expressiva e, tão mais comenta, maior notoriedade autor e obra passam a ter junto ao público. Há quase uma “histeria” quando se trata de obra super ventilada, não importando o seu valor intrínseco, desde que venha acompanhada de farta ação mediática. Disse-me ela, em tom quase nostálgico, que eu resenho livros novos, outros relativamente recentes e outros mais, segundo ela, “jurássicos”, mas não desprovidos de forte interesse. Respondi-lhe àquela altura que estamos diante de duas situações distintas. O livro recente é resenhado, um bem mais antigo, mesmo sob o olhar do observador, é comentado, pois já merecera ao longo dos anos, ou dos séculos, muitas resenhas e comentários, por vezes tratados e teses. Curiosamente, o tema levou-me a considerar leituras anteriores a partir de uma certa idade, pois tenho o prazer de reler obra que me agradou décadas atrás. Nossa finitude infalível dá-nos essa oportunidade da revisita, tantas vezes inesperada, a um determinado livro. Isso ocorre após observar a lombada de um volume em uma estante. Lembro-me dos momentos vividos a sorver a leitura, retiro o livro e uma surda alegria retoma seu curso. Anos atrás criamos a página Resenhas e Comentários (lista). Encontra-se ao alto, à direita do menu. Todas as obras lidas lá estão, com a data em que o post lhes foi dedicado desde que iniciei, em Março de 2007, a trajetória compartilhada. Sob outra égide, essa relação com o passado, sensorial, só pode existir com a obra impressa, uma das razões da salvaguarda do livro. Não saberia dizer se sob efeito do saudosismo, mas, quanto mais releio obras que me foram sensíveis, vivo uma sensação de visitação emotiva, à la manière do encontro com alguém de que gostamos e que o tempo distanciou. Continuarei atento ao presente, mas farei incursões periódicas ao passado. Não é essa metodologia que sempre apliquei à música, do barroco à contemporaneidade? Tanto na leitura, como na interpretação pianística, o amálgama realiza-se.

As Impressões de Viagens por vezes se confundem com o cotidiano, pois o olhar está a percorrer paisagens da natureza e humanas. Ficaria transparente que todos os meus deslocamentos geográficos têm finalidade musical. Não obstante, contemplar além do sonoro torna-se imprescindível.

Num momento de angústia notória, Zeca Pagodinho, famoso por sua popularidade musical, falou recentemente em Xerém, no Rio de Janeiro, o que milhões de brasileiros pensam dos políticos. Ao ver a destruição da região onde mora e o descaso das autoridades, disse, visivelmente emocionado: “Tenho nojo dos políticos”. Se por vezes, sem ser minha vontade, escrevo sobre a nossa triste realidade política nos vários níveis, na extrema morosidade de uma Justiça atolada em milhões de processos a serem julgados, na impunidade que destrói a ética, a moral, o respeito, na insegurança plena em que vivemos, no desprezo que governantes têm pela Educação e pela Saúde e, sob outra égide, no capitalismo irracional de nosso Brasil, é por imperiosa necessidade de fazê-lo. Princípio da panela de pressão. Em determinado momento…

A Música. Dedico-me quase que inteiramente a ela e não passo um só dia sem meu coloquial estudo pianístico. Este me leva ao aprofundamento além da partitura.

Por vezes há temas sobre as corridas de rua. Desde 2006 os três treinos semanais e as 57 corridas de rua trouxeram-me outra razão para o aprimoramento. Não há maldade entre corredores em atividade. As corridas de rua conseguem reunir nos trajetos legião de pessoas com o mesmo ideal. Jamais vi um corredor de rua mal humorado. O equívoco pode vir dos organizadores, como acentuei no caso da última São Silvestre, não dos atletas amadores. Nestes, um só sentimento. Bom, certamente. E é nas passadas ritmadas dos treinos que a inspiração dos posts surge. De madrugada, frente ao computador, é só vertê-la para o teclado.

Meus agradecimentos profundos a sete figuras exemplares em toda essa trajetória do blog: Regina Pitta, que revisa o post e escreve o resumo em inglês; Magnus Bardela, meu ex-aluno, amigo fidelíssimo e o sempre guru informático; Luca Vitali, o extraordinário designer, que capta determinadas leituras que a ele faço de pré-posts, criando desenhos que me surprendem; François Servenière que, diretamente de Blangy-le-Château, na França, em e-mails de rara densidade, disseca o blog da semana com sua fina percepção de compositor e pensador; Jenny Aisenberg, que pacientemente ouve minhas ideias para o post e transmite, via telefone, suas sensíveis impressões; Mônica Sette Lopes que, de Belo Horizonte, com regularidade desde os primórdios do blog, observa o conteúdo com o olhar de professora e juíza;  Elson Otake, amigo maratonista,  responsável pela minhas gravações introduzidas no YouTube e tantas vezes mencionadas nos textos.

Continuarei a digitar. A família me dá alento. Estimula-me sempre. Minha âncora profunda. Amigos escrevem me apoiando e até sugerindo temas que sabem que poderei acolher. O  fato é que não estou ligado a nenhum veículo de comunicação e isto, à maneira de um pássaro, dá-me a liberdade de pensar sem quaisquer pressões. Continuemos cúmplices. 

Last week my blog reached 300.000 visitors, leading me to reflect on the pleasure of posting an entry every week – a way to ponder upon life – and on how proud I am of such a large following – thanks in part to positive word-of-mouth from readers. In this post I recall the subjects that are dear to me, thanking visitors for sending me stimulating messages and expressing gratitude for the services of those who, behind the scenes, help me in this endeavor.