Recepção e resposta a um amigo

 

A Arte da Vida consiste em fazer da Vida uma Obra de Arte.
Ghandi

Ouso apenas acrescentar, na minha qualidade de psiquiatra,
tratar-se Sabedoria e Felicidade
de um verdadeiro manual de psiquiatria,
bela síntese que é,
de tudo quanto se tem escrito sobre filosofia da vida,
obra que vai figurar na minha estante,
bem ao meu alcance,
tantas vezes serei obrigado a consultá-la.
Dr. Antônio Carlos Pacheco e Silva

O tema suscitou uma série de mensagens solidárias, entusiasmadas e reverenciais, no caso, à figura de meu pai. Meus irmãos e eu recebemos esses e-mails com surda alegria, pois restaurava-se algo que, deliberadamente ou não, incomodava-nos. A praça é pequena, mas o significado para nós é gigantesco, pois preserva o nome de um homem impoluto que, tendo nascido em berço humilde, cresceu a abraçar as causas as mais dignificantes. Jamais soubemos de um só ato que o desabonasse. Como sempre repetia aos quatro filhos: “O Homem é ou não é”, ou o velho chavão “A palavra a valer pelo fio da barba”. Cuidou da elevação cultural e cívica de sua prole masculina e teve sempre em mente a imagem de Deus de uma maneira singular, sem uma fixação específica, pois era propenso à teosofia e seus grandes mestres foram Jiddu Krishnamurti, Annie Besant, Helena Blavatsky, São Paulo e o escritor Maurice Maeterlinck.

Marcelo já esteve presente em vários blogs através de questionamentos argutos, instigantes, mas precisos. Sempre que o encontro, preferencialmente na feira livre de sábado na minha cidade- bairro, Brooklin-Campo Belo, já espero algo que me levará à reflexão. Disse ter gostado imenso do blog sobre a praça que teve as placas em homenagem ao nosso pai, José da Silva Martins, recolocadas pelo ágil e diligente Prefeito João Dória Jr. Os dois burgomestres anteriores simplesmente ignoraram nossos apelos. Perguntou-me se, mercê do amor filial, não exagerara nos elogios ao pai. Fiquei a pensar. Não caberia neste espaço a luta realmente hercúlea de nosso progenitor durante a longa existência. Disse a Marcelo que aguardasse o blog ora em tela.

Ative-me tão somente aos comentários de ilustres figuras de nossa história recente, que comentam as obras literárias de José da Silva Martins, que, ratifico, iniciou sua trajetória de escritor aos 86 anos, sendo que o último livro seria lançado em Março de 2000, um mês após sua queda que o levou ao coma e à morte no peristilo dos 102 anos!

Mencionei, no blog anterior, comentário do grande Menotti Del Picchia, que prefaciou seu primeiro livro. Seguiram-se outras obras: “Saúde”, elogiada calorosamente pelo notável cardiologista Adib Jatene, “Santo António de Coimbra, de Lisboa e de Pádua”, “J.S.Bach” e as várias versões, sempre aprimoradas, de “Sabedoria e Felicidade”, a culminar com ” Breviário de Meditação”.

O pai deixou uma pasta que ficou sob minha guarda. Há dezenas de cartões criteriosamente arquivados. Perfurava cada cartão ou carta recebidos de personalidades de nossa vida cultural como um todo. Os elogios são competentes, pois dificilmente uma das figuras que menciono assinaria apenas para lisonja fácil. Sob outra égide, as décadas de 1980 e 1990 basicamente desconheciam as mensagens internéticas, mormente se considerada for a faixa etária dos remetentes. É realmente um prazer estético e sensível seguir os comentários através das caligrafias de seus autores. Citarei algumas opiniões sobre a obra literária tardia de nosso pai.

Entre os documentos, leem-se nomes referenciais: Carlos Drummond de Andrade, Josué Montuello, Austregésilo de Athayde, Jorge Amado, Maria de Lourdes Teixeira, Hernâni Donato, Dinah Silveira de Queiros, Cardeal Evaristo Arns, Alceu Amoroso Lima, Roberto Campos, Francisco Resek, Erwin Theodor, José Guilherme Merquior, Mário Covas, Abgar Renault, Ministro Moreira Alves, Oscar Dias Corrêa, Américo Jacobina Lacombe, Alfredo Buzaid, Antônio Soares Amora, Antônio Carlos Pacheco e Silva, entre tantos outros igualmente ilustres.

Citarei algumas opiniões sobre a obra literária tardia de nosso pai.

O professor, escritor e poeta Antônio Soares Amora escreve: “Sabedoria e Felicidade é das obras mais bem escritas, mais profundas e mais impressivas que li nos últimos anos. Enriqueceu-me o espírito, ensinou-me muito sobre a existência e o transcendente e, embora noutra ordem de efeito, empolgou uma minha neta que está na linda idade dos quinze anos”.

Manoel Gonçalves Ferreira Filho, professor titular de Direito Constitucional da USP: “Eminente mestre. Permita-me, sim, Dr. José da Silva Martins, chamá-lo de mestre. Com efeito, considero-me um de seus discípulos, de há muito marcado por suas sábias lições de vida. Renovo o meu aprendizado com este magnífico livro, Sabedoria e Felicidade – que teve a grande gentileza de me enviar. Agradeço-lhe, de coração, o régio presente que recebi. Nele – estou certo – vou haurir lições e renovar as já recebidas”.

Do Embaixador e Senador Roberto Campos: “…louvo os críticos nacionais que exaltaram a importância de seu livro, colocando-o entre as nossas obras raras deste século. E não receio cometer erro quando afirmo que não há na bibliografia brasileira coletânea de pensamentos que se compare à que o senhor com tanto esmero oferece ao nosso público. Trata-se de uma obra que, em cada página, reflete conhecimento profundo, amparado na paciência beneditina que é companheira inseparável dos sábios”.

Carlos Mário Vellozo, então Presidente do Supremo Tribunal Federal, assim se pronuncia: “Com cordial visita, agradeço ao ilustre e prezado amigo, a quem considero mestre de nós todos, a remessa do seu livro Sabedoria e Felicidade, edição compacta, que leio com especial interesse e real proveito. Os seus livros que cuidam dos principais valores da vida, encantam e ensinam. Que Deus o guarde e conserve para alegria de sua família e de todos que se honram com a sua amizade”.

Lembro ao Marcelo que o culto ao pai independe da área de atuação do progenitor. Estou a me lembrar de um homem do campo da região de Santa Izabel, não distante de São Paulo. Visitei aquela região durante mais de dez anos, numa longa pesquisa relacionada à arte sacra popular perpetrada desde o século XVII por artistas nativos – inicialmente transmitida por padres – e várias vezes mencionada em posts. Dito Lima era seu nome. Tomávamos um café bem ralo preparado por sua tia. Falou-me de seu pai, que o ensinara a amar a semeadura. Plantava as sementes e, com o advento das chuvas, já na primavera, via brotar tenuemente aquelas pequeninas folhas verdes. Dizia ao miúdo “É Deus, meu filho que mostra sua vontade de nos alimentar”. Quando lhe perguntei sobre o efeito da frase de seu pai, respondeu. “Amo semear e sentir Deus arranhando a terra”.

Creio que Marcelo entenderá o significado para nós da placa que leva o nome José da Silva Martins, fincada em pequena praça da megalópole. Ele também semeou e acreditava com convicção que um Poder Maior guiava nossos passos através de tantas manifestações.

Reitero, em nome de meus três irmãos, os agradecimentos ao pronto gesto de nosso atual Prefeito, João Dória Jr.

The subject of last week’s post – a square named after my father – had much feedback from readers. I resume the subject, now to explain who my father was: a man of humble origins, strong-willed and with power of discernment, who invested in a good education for his four sons. He began writing at the age of 86. I transcribe here a series of comments on his books written by relevant personalities of the Brazilian culture, so that readers may understand the reason why we – his four sons – are so proud of having his name given to a public square in São Paulo.