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Um dos mais abrangentes músicos de seu tempo

Primeiramente se reconhece o detalhe a ser dominado
até a submissão.
É a dificuldade que merece uma prática maior.
Por que perder tempo na prática de passagens
que podem ser tocadas perfeitamente bem?
Ferrucio Busoni
(“Important Details in Piano Study”)

Ferrucio Busoni foi um músico total. Nascido em Empoli, na Toscana, e filho de pais músicos, cedo iniciou seus estudos com o progenitor. Como menino prodígio teve a ajuda de um mecenas e passou a estudar em Viena ainda miúdo. Apresentou-se com recepção calorosa em récitas solos ou com orquestra. No efervescente ambiente vienense tocaria para Franz Liszt, que o incentivou, e também para Brahms, que o recomendou ao renomado Carl Reinecke (1824-1910), compositor e professor, uma das razões que contribuiu para sua evolução em várias áreas da música, piano, regência e composição.

Em 1886 reside em Leipzig e dois anos após, por indicação do musicólogo Hugo Riemann (1849-1919), Busoni leciona na Finlândia, país em que se apresentará dezenas de vezes e onde desenvolve sua técnica de composição. Em 1890 obtém o primeiro prêmio no concurso Anton Rubinstein nas duas áreas, piano e composição. Nesse mesmo ano leciona no Conservatório Imperial de Moscou.

Atividade pianística e composição despertam-lhe interesse. Logo após, ei-lo a lecionar no New England Conservatory em Boston, prosseguindo a brilhante carreira. Futuramente aceita o convite para ser diretor da Meister-schule no Conservatório Imperial de Viena. A atividade intensa como pianista, regente, compositor, professor e autor de textos importantes sobre a estética musical tornaram Ferrucio Busoni nome referencial. Vem a falecer aos 58 anos, legando inúmeras composições relevantes, algumas gravações fixadas nos primórdios tecnológicos e uma expressiva colaboração relativa às transcrições para piano, mormente da obra de J.S.Bach.

Em Leipzig, na juventude da idade madura, ao ouvir a execução ao órgão da Tocata e Fuga em ré menor, de Bach, é aconselhado pela mãe de seu futuro aluno Egon Petri, que se tornaria um ilustre pianista, a transcrever para piano a famosa criação do Kantor (vide blog: Egon Petri – 1881-1969 -, 08/05/2021). Possivelmente data desse período sua inclinação para com a obra de J.S.Bach, dele transcrevendo, para piano, inúmeras composições para órgão e coral que obtiveram enorme sucesso. No primeiro lustro dos anos 1950 estudei com fervor as célebres transcrições dos corais de Bach realizadas por Busoni, assim como trabalhei o Cravo bem Temperado, através da revisão minuciosa do mestre italiano. Busoni não apenas transcreveu, mas, sem perder as características primevas dos originais de J.S.Bach, por vezes propiciava determinadas intervenções.

Se Bach foi uma de suas metas, considere-se suas inúmeras outras transcrições de obras de Mozart, Cramer, Schubert, Schumann e tantos mais.

O adentrar a segunda metade do século XX “condenaria” a inclusão nos repertórios das transcrições, mormente as de Bach, realizadas por compositores expressivos como Liszt, Tausig, Siloti, Kempff, entre outros. Não houve o mesmo processo relativo às composições para cravo executadas ao piano? Nos dois casos eram consideradas despiciendas. Nas últimas décadas, tanto a transcrição como a interpretação ao piano das criações para cravo ganharam número expressivo de executantes. Quanto a estas, o insigne musicólogo François Lesure (1923-2001) já observara: “O tempo do Barroco integrista passou. A utilização de instrumentos de época deixou de ser um dogma ao qual os músicos são obrigados a aderir sob pena de serem tratados de heréticos”.

Clique para ouvir, de J.S.Bach, Prelúdio Coral, BWV 734, e de Beethoven, Escocesa, em Mi bemol Maior, na interpretação de Ferrucio Busoni (gravado em 1922):

https://www.youtube.com/watch?v=KS5JNn7CJGc

Como compositor de suas próprias criações, Busoni legou quantidade expressiva de obras a compreender inúmeros gêneros. Seu catálogo é imenso, sendo que Busoni evolui de um romantismo tardio a processos atonais. A capacidade de trabalho de Busoni tornou-se antológica. A pontuar em seu catálogo, saliente-se o monumental Concerto para piano e orquestra em Dó Maior, op. 39, em cinco movimentos, sendo que o último com a atuação de coro masculino.

Clique para ouvir, de Ferrucio Busoni, o Concerto em Dó Maior op. 39, para piano, orquestra e coro masculino, na magistral interpretação de Marc-André Hamelin acompanhado pela Lahden Kaupunginorkesteri dirigida por Osmo Vänskä:

(175) Busoni, Piano Concerto in C Major Op. 39 – YouTube

Os pensamentos de Ferrucio Busoni sobre Estética serviram a gerações. Quanto à sua preocupação com os que buscavam o aperfeiçoamento pianístico, no final da existência elaborou processos que poderiam ajudar. Em uma de suas conferências a abordar o estudo pianístico, pormenoriza-se sobre o detalhe.

Afirma:“No estudo da acentuação e do fraseado nada suplanta as obras de J.S.Bach. Porque é que Bach é tão valioso para o aluno? Esta é uma pergunta fácil de responder. É porque as suas obras são tão bem construídas que obrigam ao estudo aprofundado do detalhe. Ouvir uma nota, sua relação com outras notas, o valor proporcional do todo são propósitos que devem ser estimados pelo intérprete altamente capacitado. No meu próprio desenvolvimento como artista tem sido evidente, vezes sem conta, que minha trajetória se moldou pela observação cuidadosa dos detalhes. Todos os estudantes devem esforçar-se por apreender com muita precisão a sua própria capacidade artística. Uma estimativa errada conduz sempre a uma condição perigosa. Se eu não tivesse atendido a certos detalhes há muitos anos atrás, teria parado muito longe de qualquer objetivo preciso”.

Clique para ouvir, de Franz Liszt, La Campanella, na interpretação de Ferrucio Busoni (1922):

(175) BUSONI PLAYS Liszt LA-CAMPANELLA – YouTube

Ferrucio Busoni was one of the most complete musicians in history of all time. Pianist, conductor, composer, teacher, musical thinker, reviewer and editor, Busoni excelled in all the areas multiple fields in which he worked.

O jurista Ives Gandra da Silva Martins e a revelação para poucos

Só podes ser tu se fores de tudo ou de nada.
Agostinho da Silva
(“Espólio”)

Exclusivamente, portanto,
Para familiares, amigos e alunos,
foram escritas estas reminiscências.
Ives Gandra Martins

Poderia avocar suspeição ao redigir um post laudatório às lembranças que têm marcado a vida de um jurista, mormente sendo meu irmão. É que Ives, como jurista ímpar neste país atormentado, pautou sua existência na probidade absoluta, na batalha sem tréguas contra as mazelas que assolam há décadas nosso país. Recentemente comoveu-me ouvir de alguns dos mais importantes jornalistas brasileiros, como Augusto Nunes, Alexandre Garcia, José Maria Trindade, Guilherme Fiuza e tantos outros, menções ao meu irmão, inclusive um deles a proclamar que Ives é a figura basilar entre os juristas e que, na plena obediência ao que reza a nossa Constituição, tem a autoridade moral e jurídica para tecer críticas ao descumprimento, por parte do STF, de preceitos da Carta Magna. Ives, aos 87 anos, entende que excessos têm sido cometidos pelo Supremo Tribunal em quantidade inusitada e em uma só direção, procedimento jamais visto na história do judiciário brasileiro.

Após a morte de sua amada Ruth, vítima da Covid, com quem esteve casado durante 62 anos, Ives resolveu registrar instigantes lembranças que percorrem quase um século. Não quis ele a grande tiragem, a preferir uma edição limitada para familiares e amigos, entregando os manuscritos ao seu fidelíssimo e competente editor Cláudio Giordano.

Para um irmão que conviveu durante quase duas décadas na mesma morada de nossos pais, as qualidades humanísticas de Ives já se mostravam insofismáveis. No quarto lustro, o orador infalível já se revelava, pois após a leitura de segmento da excelsa literatura portuguesa, Sá de Miranda (1481-1558), Camões (c. 1524-1580), Padre Vieira (1608-1697), Padre Manuel Bernardes (1644-1710)…, o jovem Ives interpretava textos lidos para os nossos Pais após o jantar. Saliento que nosso Pai privilegiava a leitura dos clássicos portugueses. Nosso irmão João Carlos e eu, a seguir, tocávamos obras que faziam parte de nossos estudos pianísticos. Quanto ao José Paulo, estudou violino por pouco tempo, mas era exímio na gaita de boca, tendo ganho concurso em rádio paulistana. Dedicou-se com brilho à atividade comercial, seguindo basicamente a atividade de nosso Pai, ampliando-a. Minha convicção plena é de que a gestação do grande jurista que se tornaria Ives deu-se naqueles anos, nessas “tertúlias” em família. Impressionava-me, àquela altura, seu espírito de síntese, pois Ives conseguia traduzir em apotegmas conceituações extensas dos grandes autores.

Suas reminiscências daqueles anos inesquecíveis fazem-me pensar na leitura individual que cada um dos quatro irmãos teceu naquelas primeiras e decisivas décadas. Tardiamente elas se revelam basicamente similares, apesar de interpretações individuais diferenciadas devido às estruturas mentais distintas do quarteto. Essa assertiva só dimensiona nossos Pais, que se empenharam com sacrifícios na edificação cultural de seus filhos. Estou a me lembrar das palavras do ilustre Professor Catedrático de Direito de Família da Universidade do Minho, António Cândido, ditas em Braga, após um recital de piano que apresentei no salão nobre da Reitoria. Conhecedor da numerosa imigração de portugueses do Minho para o Brasil nas décadas fronteiriças dos século XIX e XX, entendia que meu Pai se agigantava como única figura (no singular) daquela precípua diáspora com um projeto cultural para seus futuros descendentes.

Antolha-se-me que o longo e substancioso capítulo “Reminiscências”, que aborda inicialmente os anos da infância, adolescência e juventude, faz entender todo o caminhar de Ives. Ao se casar com Ruth, em 1958, uma indissolúvel união em todos os planos se estabeleceu. Foram colegas no curso de Direito da USP. Tiveram seis filhos, dos quais três seguem com brilhantismo os caminhos fundamentados no Direito. O casal cresceu na fé católica e, com o passar dos anos, Ives deu provas dessa integral e irreversível religiosidade. Pertencer ao Opus Dei foi consequência. Insofismável a sua extraordinária carreira como jurista, professor e autor de uma centena de livros, a grande maioria versando sobre Direito Tributário, Constitucional e Administrativo, bibliografia que dimensiona ainda mais o significado de seus anos primevos. A verve poética o acompanha desde os primórdios, e os mais de mil poemas à sua saudosa Ruth o colocariam como recordista de poemas dedicados a uma só mulher em toda a história da poesia, creio eu. Apesar de ter partido há mais de um ano, Ruth continua a povoar escritos e poemas que lhe são dedicados. “Quando assim ajo, sinto-a próxima”, afirmou-me.

Em “Reminiscências de um cidadão comum” todas as recordações são autênticas e verídicas, a não ser, a meu ver, o título, pois Ives jamais foi uma pessoa comum. Todos conhecemos as qualidades que o tornaram uma das vozes mais respeitadas do Brasil.

Ives perpassa a existência no alto de sua sabedoria. Nas “Reminiscências de um Cidadão Comum” o trajeto é descrito sem traumas, sempre na ascensão. Como chegar aos 87 anos cultuado pelos letrados, políticos – mesmo aqueles que não comungam com suas convicções – e também pelo “cidadão comum”, sem jamais ter tido um ato que o desabonasse. Após a morte de nosso saudoso Pai no ano 2000, Ives é a nossa referência.

As reminiscências não excluem a menção às dezenas de homenagens que recebeu de instituições públicas e privadas ao longo da carreira, assim como a sua participação como docente no Brasil e alhures.

Ives insere quatro decálogos de sua lavra nas “Reminiscências…”: Decálogo do Advogado, Decálogo do Não, Decálogo da Convivência, Decálogo do Trabalho Ordinário. Do primeiro, extraio um parágrafo: “O Direito é a mais universal das aspirações humanas, pois sem ele não há organização social. O advogado é seu primeiro intérprete. Se não considerares a tua como a mais nobre profissão sobre a terra, abandona-a porque não és advogado”. Frases que deveriam ser o norte para a maioria dos advogados.

O meu clã visitou-o dias atrás. Uma alegria. Apesar das limitações físicas, Ives continua a ser um dos faróis a iluminar o agitadíssimo oceano que nos cerca.

Dedico-lhe, pois, uma gravação que é um devaneio na Via Láctea. Se a sua Ruth paira nas esferas, abrigada pelo Poder Maior, o sensível passeio pela Via Láctea diz tanta coisa… O ilustre compositor francês François Servenière compôs uma lírica peça a partir de “O Pequeno Príncipe” de Saint-Exupéry. As “Reminiscências” retornam…

Clique para ouvir, de François Servenière, “Promenade sur La Voie Lactée”, na interpretação de J.E.M.:

https://www.youtube.com/watch?v=JQDkWn1HcpQ

In his book “Reminiscences of an ordinary citizen”, the illustrious jurist Ives Gandra Martins reveals key events lived since childhood that have been fundamental in his development. At 87, respected by intellectuals, politicians and ordinary people, he has been a beacon for our family since the death of my father in 2000.

Uma sensível mensagem de François Servenière

É ciência subir os Himalaias
E criar matemática sem fim
Mas é cultura vê-la poesia
E ter os Himalaias dentro em mim.

Agostinho da Silva

Há tempos longe deste espaço, o ilustre compositor francês François Servenière soube tardiamente da morte de meu amigo-irmão, o notável musicólogo português José Maria Pedrosa Cardoso (vide blogs: “José Maria Pedrosa Cardoso”, 11 e 18/12/2021).

Admirador incondicional dos trabalhos “arqueológico-musicais” de Pedrosa Cardoso e amigo do pesquisador, escreveu uma mensagem à viúva Maria Manuela, enviando-me no ato uma cópia. Após a autorização de ambos, repasso aos leitores, pois a carta revela o apreço e a sensibilidade do músico Servenière.

“Minha estimada Manuela,

Soube nesta semana pelo José Eduardo do desaparecimento, no dia 8 de Dezembro de 2021, de nosso querido José Maria. Só apreendi essa triste notícia em fins de Janeiro, pois uma pane no meu site bloqueou a recepção de mensagens. Devido a esse percalço não recebi, durante meses, os artigos do José Eduardo, inclusive aquele em que menciona o infausto acontecimento.

Assim como José Eduardo, demorei um tempo para assimilar a notícia. Estava entre meus projetos ir a Portugal e visitar meus amigos… Soube que os grandes sinos da Universidade de Coimbra soaram longamente no dia de sua partida. Que sublime atenção para um espírito que voava naquele momento em direção ao Nirvana! Sim, José Maria e eu não éramos tão próximos, mas as relações que tivemos foram parêntesis luminosos, sinceros e crísticos, se considerarmos nossa conjuntura tão sombria. José Maria era a centelha mesmo da vida, estruturada numa espiritualidade fundamentada e senhor de uma cultura musical fenomenal, um farol para seu ser e sua obra transparecendo através de sua alegria de viver, tão evidente no fervor de seu olhar. José Eduardo me falou um pouco a respeito de sua resignação nos derradeiros tempos face à cruel prova a que a doença o obrigou. Nosso amigo brasileiro disse-me ainda que, mesmo nos estertores da vida, José Maria se preocupava com uma justa homenagem que Portugal deveria prestar ao seu pai, nascido no Minho. Prometida, essa homenagem deverá se realizar, acredito.

Reiteradas vezes meu olhar recai sobre o livro, que me foi enviado gentilmente pelo José Maria, sobre as tradições vocais em Guimarães durante a Idade Média (vide blog: “Passionário Polifônico de Guimarães”, 23/11/2013). Ele trona no meu estúdio como obra de referência, motivo de apetite e de curiosidade de todos os meus visitantes, família e colegas. Começarei em Abril os trabalhos de meu novo estúdio, magnífico projeto para o último terço de minha vida, assim espero. Findo o trabalho, colocarei o livro do José Maria em evidência na minha biblioteca, como é feito ao se expor uma obra única, mercê de um presente único… (trata-se de obra investigativa, mas de arte também, graças à publicação integral do manuscrito em cores e à dimensão do Passionário… Nota: J.E.M.). Ao mesmo tempo, como prometera a José Eduardo em e-mail anterior sobre o infausto acontecimento, devo enquadrar em patchwork numerosas fotos escolhidas entre aquelas que tenho de meus amigos do Brasil e de Portugal, José Maria, Manuela, Idalete Giga, Eurico Carrapatoso, Luca Vitali, Regina e, logicamente, José Eduardo. Os seus sorrisos do sul serão faróis para a minha criação e me indicarão o nascer do sol e seu ocaso, a estrela polar e o farol à noite, em resumo, direcionando meu espírito para a escrita musical, gravação e mixagem de minhas obras.

Clique para ouvir Natal de Elvas, canção alentejana (harmonização: Idalete Giga). Coro Capela Gregoriana Laus Deo, sob a direção de Idalete Giga:

https://www.youtube.com/watch?v=l5YnExjckwU

Externo esta minha posição, lembrando à Manuela que figuras como o notável e saudoso pintor Luca Vitali e o iluminado José Maria me foram essenciais para compreender o essencial da arte e nossos caminhos artísticos sinuosos por vezes, pois a vida é necessariamente sinuosa e não é raro explorarmos caminhos como em estado de cegueira quando em densa neblina.

Na França, o cerebral domina o coração da música. Durante nossa longa formação da escrita musical, com sólidas bases no passado, constatamos sempre a mistura incessante e não justificada com as teorias de matemáticos (tantas vezes cientistas), adeptos dos algoritmos evanescentes como única lógica da música e, mais globalmente, da arte dita ‘moderna’ ou ‘contemporânea’. Eurico Carrapatoso, por sua vez, proclama como um exorcista: ‘Darmstadt, saia do meu corpo’. Estando longe dessas preocupações, por obrigação profissional meus estudos superiores me obrigaram a trabalhar essas tendências, sem contudo aderir a nenhuma delas. Na França o ambiente intelectual está sempre voltado à Revolução, à guilhotina! E o satanismo niilista não está suficientemente distante…

Clique para ouvir, de Eurico Carrapatoso, Ó, meu Menino – Magnificat em Talha Dourada, na interpretação do Canticorum sob a direção de Rui Teixeira:

https://www.youtube.com/watch?v=2V5pwjbGpKA

Cansado das admoestações elitistas como único caminho para trabalhar a música dita ‘séria’, contatei José Eduardo em 2007, após a escuta excepcional de ‘Il Neige’, de Henrique Oswald, publicado no web. Responde-me no dia… Desde lá nós nos correspondemos semanalmente e entrei no círculo de seus amigos que ele me apresentou. Os portugueses Eurico Carrapatoso e suas sublimes músicas, que voam em direção às estrelas… Idalete Giga e seus sublimes cantos gregorianos descendo dos céus… José Maria e suas sublimes inspirações vindo do além… o também brasileiro Luca Vitali e suas visões galácticas…

Clique para ouvir, de François Servenière, o Étude Cosmique nº 4, Níquel, a partir de pintura em acrílico de Luca Vitali. Interpretação de J.E.M.:

https://www.youtube.com/watch?v=6twd8WP_9js

Por trás desses personagens notáveis havia uma constante. Todos estão sob a égide da beleza e do amor, únicos estimulantes.

Apesar de já ter quantidade de obras no meu catálogo, o início desse novo paradigma de vida coincidiu com uma nova porta em minha vida. Por ela entrei em um novo mundo, cujo endereço situava-se no Novo Mundo, da mesma maneira que um explorador coloca um novo país de coração na lista de suas peregrinações e de seus anseios, sempre a continuar sua incessante busca em direção ao horizonte fugidio. Seguindo a lógica, esse período resultou em novas obras magníficas, interpretadas sublimemente ao piano por José Eduardo.

Em 2020, José Maria presenteou-nos com uma crítica elogiosa do CD ‘Retour à l’Enfance’, produzido por José Eduardo, Johan Kennivé e por mim. Releio por vezes aquelas palavras escolhidas e algumas frases como se estivesse a observar as pegadas históricas de um musicólogo eminente que se debruça sobre nosso laborioso trabalho. José Maria permanecerá ao longo do tempo.

Querida Manuela, queria me desculpar por não tê-la contatado antes, fato a me deixar consternado. Aceite, eu lhe peço, minhas sinceras condolências pelo desaparecimento de José Maria. Tanto a Manuela como José Maria me perdoarão, talvez.

Com a minha amizade e minha tristeza, mas também com minha alegria, pois a vida é fonte de alegria.

François”. (tradução: J.E.M.).

Clique para ouvir, de François Servenière, Promenade sur la Voie Lactée, na interpretação de J.E.M.:

https://www.youtube.com/watch?v=JQDkWn1HcpQ

I publish in this blog a belated and sensitive message from the French composer François Servenière to the widow of the noted musicologist and friend José Maria Pedrosa Cardoso, with authorization from both. Touching words that testify to the dimension of his affection.