Continuamos a Divulgar Repertório Luso-Brasileiro
As apresentações em Lisboa tiveram ouvidos atentos. O lançamento do álbum com dois CDs dedicados a Lopes-Graça foi precedido por argutos comentários do ilustre Professor Catedrático da Universidade Nova de Lisboa, Mário Vieira de Carvalho. Em minha breve palestra salientei a presença inequívoca, no panorama mundial do século XX, dos dois mestres maiores da luso-brasilidade: Villa-Lobos e Lopes-Graça, este ainda não tão divulgado mundialmente, mas que a História deverá, inexoravelmente, colocar entre as figuras mais extraordinárias do século que passou, não apenas como compositor, mas também como intelectual do maior peso.
Tem-se sempre a necessidade do culto aos premiados. Mais e mais a sociedade caminha para reverenciar agraciados ou aqueles, sob outro enfoque, entregues aos holofotes. Lopes-Graça está a encontrar, paulatinamente, o lugar que sempre mereceu. Por puro merecimento, sem “badalações” não confiáveis. Chegará o dia.
Apresentamos Canto de Amor e de Morte, constante do álbum, e músicas extraprograma do repertório luso-brasileiro. A identificação Portugal-Brasil deveria estar em diferente patamar de entendimento, não fossem outros interesses nem sempre transparentes.
O recital de Regina Normanha Martins, no dia a seguir, teve a maior acolhida. Apresentou na íntegra o delicioso Livro de Maria Frederica, do excelente compositor português Frederico de Freitas. Comoveu a todos, que raramente ouviram a coletânea por inteiro. Suspeito como marido, afirmaria, contudo, que a interpretação das Sete Miniaturas de Fructuoso Vianna e da magnífica Sonata nº 1 de Francisco Mignone surpreendeu. Estava eu a rememorar, pois foi nessa sala da Academia de Amadores de Música, em Lisboa, que dei, a convite de Lopes-Graça, meu primeiro recital na capital portuguesa, no longínquo 14 de Julho de 1959. Jamais poderia imaginar um primeiro recital de Regina em Portugal, quase 53 anos após! Vale a pena viver.
No recital que dei na bela Igreja do Convento Nossa Senhora dos Remédios, promovido pelo Eborae Musica, tivemos duas primeiras audições absolutas: de João Nascimento, o Estudo Fúrias, Volutas e Saraivadas; de Eurico Carrapatoso, a introspectiva Missa sem Palavras (cinco estudos litúrgicos) constituída de Kyrie, Gloria, Credo, Sanctus e Agnus Dei. A extraordinária obra, de cerca de 20 minutos, necessita de tão grande recolhimento, mercê de toda a estrutura e da mística que a envolve, que ao final sentia-me feliz e exausto. Concentração plena, que foi reconhecida pela acolhida generosa de Eurico Carrapatoso.
Nos três dias subsequentes ofereci master classes no Departamento de Música da Universidade de Évora. Foi um prazer enorme ter sido o curso inteiramente voltado à música portuguesa para piano. Alegria ter ouvido, durante o transcorrer das audições, alunos de raro talento da excelente pianista e professora do Departamento, Ana Telles, que se tem dedicado com intensidade ao repertório composto em Portugal. Que dedicação, carinho e atenção desses promissores pianistas! Ter ouvido de Carlos Seixas (1704-1742) a Jorge Peixinho (1940-1995) e muitas obras do grande Lopes-Graça foi emocionante para o velho músico, que, entre outros repertórios, tem especial apreço pelo que foi criado em Portugal.
O recital de Regina, promovido pelo Eborae Musica, entusiasmou a todos. Fiquei orgulhoso.
Seguimos para o Algarve, a convite do ilustre Professor e musicólogo José Maria Pedrosa Cardoso. Os pais de sua esposa, Maria Manuela, esperam-nos. Breve repouso, onde não faltarão as iguarias do mar, preparadas pelo mestre das águas algarvias, Firmino, aquele que, em blog bem anterior, definira que o segredo do mar é o vento.
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