A crítica política em versos do jurista Ives Gandra

Esclareço que os termos mais duros,
nos versos relacionados ao poder,
são destinados aos cidadãos já condenados.
Quanto à incompetência governamental,
apenas reitero o que escrevi
em artigos jornalísticos ou pareceres jurídicos.
Ives Gandra da Silva Martins
(Extraída da Breve Introdução à obra)

Petulância e incompetência
Há no governo de sobra,
Seu veneno, na indecência,
Lembra peçonhenta cobra.
(quarteto de 28/02/2015)

Autor de dezenas de livros a abordar áreas do Direito, o notável jurista Ives Gandra tem na poesia, desde a juventude, uma de suas paixões. Traduz-se essa verve poética num também sem número de livros em que privilegia temas essenciais do condicionamento humano, a família, o amor, o cotidiano. Não por outro motivo ocupa cadeira na Academia Paulista de Letras, um de seus orgulhos, a somar-se a tantas outras Academias que honra com seu prestígio.

Como irmão, Ives não deixa, a cada publicação, de me enviar o novel livro com simpática dedicatória ao casal. Foi com prazer que li seu novo diário, que, junto àquele neste espaço resenhado, forma um conjunto invejável (vide blog “Meu Diário em Sonetos”, São Paulo: Pax & Spes, 4 vol., 2010, 21/05/2011). O presente “Meu Diário em Sextetos”, também apresentado com o nome completo do autor, Ives Gandra da Silva Martins, tem características, diria, mais abrangentes (São Paulo: Pax & Spes, 2016). Razões poderiam explicar essa assertiva.

O jurista poeta, aos 81 anos de idade, adentra mais profundamente o benfazejo espírito de síntese, e a forma sexteto, multum in minimo, é resultado de longa decantação. Diria que arabescos são dispensados e Ives penetra na senda estreita da essência essencial. Debruça-se, a interpretar seu entorno – fundamento da existência -, sem deixar, porém, a visão mais hermenêutica – mas em termos acessíveis – dos amplos temas que afligem hoje a imensa maioria dos brasileiros. Nessa altura da vida, livre das amarras que fatalmente levam o profissional a manter convivência “politicamente correta” com adversários tantas vezes ferrenhos durante a fase mais intensa da carreira, Ives sobrevoa e vê a floresta da vida sem concessões. Não que tenha cessado a brilhante carreira como advogado, mas o tempo da dissecação de cada árvore dessa floresta passou e, vê-la do alto, após tantas conquistas, deu-lhe a sabedoria serena.

“Meu Diário em Sextetos” apresenta um sexteto para cada dia do ano e, ao fim de cada mês, duas ou três quadras. Divide-se o livro em três compartimentos preferenciais: a família-religião, o declínio físico e a crítica política. O primeiro, fulcro de uma paz advinda de seu catolicismo convicto e da família como estrutura fundamental ao equilíbrio pleno, tem em sua esposa, Ruth, o epicentro, pois tantos são os sextetos a ela dedicados que se torna nítida a união indelével. O declínio físico, que não altera minimamente o pensar em ebulição e a defesa de princípios que apoia com fervor, está presente em muitos breves poemas. Artrite, artrose, doença autoimune, nada impede que, apesar do sofrimento expresso em versos, o corajoso Ives percorra, ainda hoje, o país inteiro a pregar aquilo que entende justo, correto, honesto e voltado à democracia almejada e ao cidadão comum, sem dele selecionar ideologia. O terceiro compartimento representa a síntese absoluta das centenas e centenas de artigos ou pareceres jurídicos expostos ao longo da vida, com uma ressalva. Se tantas vezes Ives teve de se conter – assim acredito, após leitura de infindável número de artigos publicados na grande mídia através das décadas -, pela tipificação profissional e também pelo coleguismo “diplomático”, não mais o faz nos sextetos. São estes transparentes, cristalinos como a água mais pura. Aponta a corrupção, estilhaça para o leitor a incompetência deste governo que desde 2003 aí permanece. Não poupa Lula, tampouco a criatura Dilma. Uma força moral o conduz ao desvelamento pleno e com que autoridade, diria, vocação libertária!!! Seus sextetos crítico-políticos são o filtramento de tantos de seus pareceres e artigos.

Selecionei muitos deles entre os que se atêm à especificidade crítico-política e à endêmica corrupção que teve acelerada evolução após 2003. Não obedeci à cronologia, pois dia após dia os sextetos foram sendo escritos, muitos pontuais após as desastrosas medidas governamentais de 2015, ano preciso que reúne a criação poética do livro.

Sobre Dilma e Lula, não cessa de apontar a incompetência, a ignorância e até… a loucura.

Disse Dilma que vai bem
Seu governo e que também
Não mudou a sua trilha,
Ou é mentirosa ou cega,
Esta louca que navega
A “Versailles” de Brasília.

O Brasil se desfigura,
Vive só de sinecura
E da esquerda truculenta,
Quanto mais ele vai mal,
Do mundo não tendo aval,
Mais se esconde a “Presidenta”.

Foram seis meses corridos,
Os ânimos revestidos
De repulsa ao mau comando,
Com seu ar tão prepotente
E seu jeito incompetente
Dilma afunda com seu bando.

Dilma vive prepotência
Com enorme incompetência
Em governar o Brasil,
Nunca tanto se roubou,
Mas sempre faz o seu show,
Num de pólvora barril.

Todos querem Dilma fora
E a presidente não cora
Em ver o gesto do povo,
Seu fracasso é retumbante
Mas ela bem segue avante
E quer fracassar de novo.

Mais uma fala na classe,
Falando no negro impasse
Que Dilma pôs o Brasil,
Nunca vi roubarem tanto
Que a todos nós causa espanto,
Descarados, sem ardil.

Se não ladra, foi omissa,
Eis a única premissa
Neste assalto a Petrobras,
Que a Polícia Federal
Descubra a origem do mal
Pra nação estar em paz.

Dilma cai como um foguete,
Foi o Brasil seu joguete
Para afundá-lo de vez.
O povo desesperado
Não sabe para que lado
Caminhar a cada mês.

Dilma não sabe o que diz
Para a nação infeliz
Que seu governo gerou,
Desce por ladeira abaixo,
E seu governo eu bem acho
De ingovernança dá show.

Esta fala com mentira,
que do sério a mim não tira,
desta horrível presidente,
preciso ter muita fé
para que mantenha em pé
a vontade de ir à frente.

Bem afunda meu Brasil
E o povo está num barril
De pólvora a explodir.
É Dilma a mãe da inflação
E seu governo ladrão
Devia daqui partir.

Dom Pedro no dia sete,
Num gesto que se repete,
Proclamou a independência.
Há muito que este país
Passou a ser infeliz
Com Dilma na presidência.

Quanto mais a presidente
Mostra ser incompetente,
Mais luta pelo poder,
Desgraça a nação inteira,
Que segue na sua esteira,
Sem mesmo sobreviver.

Nosso país tem futuro,
Será, sem Dilma, seguro,
Pois haverá governança,
Enquanto a turba do assalto
Viver do roubo bem alto
Não há qualquer esperança.

Dilma e Lula que tristeza,
Afundaram com certeza
O meu Brasil tão querido,
Seus amigos saqueadores
São da pátria traidores
Tirando-lhes sonho e vida.

É Lula um agitador,
Tisna a sua presidência,
Parece mais “batedor”
Do que ter sido “excelência”.

Lula perde as estribeiras
Sente ser lançado às beiras
Por verdades reveladas,
Sendo quase analfabeto
Fez das palestras projeto
Com que recebe boladas.

Quanta verdade escondida
Quanta mentira vertida
Neste mundo tresloucado,
Quando se fala em PT
Tudo que sempre se vê
É o patrimônio roubado.

Este assalto permanente
De um partido indiferente
Ao que é público e privado,
Tornando seu o dinheiro,
Ganho pelo brasileiro,
Tem que ser bem apenado.

Ives Gandra insiste no termo canalha. São vários os sextetos que expõem essa categoria instalada em Brasília:

A canalha de Brasília
Que o fruto do roubo empilha,
Assaltou de todo lado
Nunca tanta podridão
Do Governo em seu porão
Foi ao povo desventrado.

O poder sempre me enerva,
É sempre a mesma caterva
Que o mantém com suas tralhas,
Os poucos de bons princípios
Desabam nos precipícios
Derrotados por canalhas.

Quanto mais vejo a canalha,
Que o Brasil tanto atrapalha,
Empoleirada em Brasília,
Eu continuo a gritar,
Com outros, para levar
O país a boa trilha.

As vezes tenho vontade.
Pois parece-me verdade
Dizer o que o povo espalha,
O poder vive do achaque,
Que ganha maior destaque,
Quanto mais se faz canalha.

O saque da canalhada,
Que jamais teve parada
Liquidou o meu Brasil,
Muitos estão na cadeia,
Outros tecem sua teia
Na busca de um bom ardil.

Em Curitiba falei,
Aborrecido com lei
Escrita pelo Supremo.
São bandidos, são canalhas
Os governantes que as tralhas
Põem no povo em peso extremo.

Sobre o Fisco e o STF:

Um difícil parecer
Eu principio a escrever
Sobre o Fisco sem moral.
Tais horríveis publicanos
Ao mundo só causam danos,
Pois dedicados ao mal.

“Longa manus”, o Supremo
Transforma seu ato extremo
Esteira do Executivo,
Se o Governo faz apelo
Nunca decide, em seu zelo,
De ser um mero adesivo.

Não poucas vezes o jurista poeta está a apontar a podridão governamental instaurada, a mentira deslavada, o inchaço da máquina pública e a corrupção à solta, endêmica, mas que teve aceleração progressiva a partir de 2003:

Todo o excesso tributário
Tem sempre um destinatário
Sustentar corrupção
E quem quer se aboletar
Sem precisar trabalhar
Nos cabides da nação.

A podridão cada dia
Tira do povo a alegria
Quanto mais é revelada.
O retrato faz-se mórbido
Pois este governo sórdido
Finge não saber de nada.

Da algibeira sempre tira
O governo uma mentira
Para o seu povo enganar.
Do roubo nada sabia,
Apesar de cada dia,
O roubo solto deixar.

Cada dia um novo saque
Merece em jornais destaque
Deste Governo malandro,
O mar de lama é tamanho,
Que não me parece estranho,
Nele descer de escafandro.

Quando vejo meu país,
Triste, abatido e infeliz
E os governantes felizes
Dá vontade de gritar
E toda a lama esfregar
Na ponta de seus narizes.

São a mentira e a promessa
Para a qual jamais há pressa,
As armas dos governantes.
Nada fazendo de novo,
Sempre sufocam o povo
Muito mais que meliantes.

Todos amigos do rei
São mais de cem mil, eu sei,
Convidados sem concurso.
Obama tem quatro mil.
É que no pobre Brasil
O roubo está sempre em curso.

Ter poder pelo poder
Mesmo sem o merecer,
É próprio do governante.
Mandar tem suas delícias,
No peculato as premissas,
O que o torna delirante.

Quanto mais podre o poder
Mais busca se defender,
Negando o mal praticado.
Ataca os acusadores
Os tornando “mal feitores”,
Pelo crime demonstrado.

Faz-se o governo malandro
E nem mesmo de escafandro
Se desce ao mar de sujeira,
Precisamos nos livrar
Desta podridão sem par
Cortando-lhe pela beira.

República e monarquia
Se comparo dia a dia,
A República falhou.
O Brasil em sobressalto
Tem a moral no asfalto,
Onde a lama é que dá show.

E em nostálgica esperança:

Apesar da incompetência
De um governo cuja essência
Foi o roubo sem limites,
Eu creio no meu Brasil
Que sob um céu cor de anil
Ao futuro faz convites.

Para o leitor de meu blog, diria que essa coleção de sextetos, a acentuar o desalento do jurista Ives Gandra, tem, como belo contraponto, a família. Evidencia nesse segmento o caráter impoluto do Homem, a dimensionar ainda mais, todas as críticas aos desvarios dos últimos desastrados governos.

My eldest brother, the prominent Brazilian jurist Ives Gandra, is also a poet with a significant number of poetry books published. The last one, Meu Diário em Sextetos (My Diary in Sestets), comprises 365 poems in sestet form, one for each day of 2015. It may be divided into three sections: family/religion, physical decline and the Brazilian political crisis. In the last one, he touches the weak spots and, without constraints, denounces the corruption, incompetence, ignorance and cynicism of the current government. I selected for this week’s post some of such verses that fulminate against political chicanery.

 

 

 

 

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