A partir de um primeiro aos 2 de Março de 2007

É um velho adágio Atula, não de hoje:
“Acusam aquele que está em silêncio,
acusam aquele que fala demais,
até acusam aquele que fala moderadamente.
Não há ninguém neste mundo que não seja acusado”.
Dhammapada
(As palavras de Buda – 227)

Magnus Bardela é aquele amigo impecável. Em fins de Fevereiro de 2007 conversávamos no terraço de minha casa a respeito de vários temas, música a preponderar. Foi a diversidade que fez com que, a certa altura, Magnus tenha proposto uma pergunta: “Por que você não cria um blog?”. Esse questionamento, já o mencionei em blogs bem anteriores. Hesitei inicialmente, mas mantenho até hoje uma ignorância notória relacionada aos avanços internéticos. Magnus orientou-me e ainda agora, diante de minha absoluta incapacidade de resolver problemas que surgem, sana-os por telefone, sabedor da deficiência crônica e, sobretudo, voluntária do amigo na área. Foi Magnus que acionou meu computador e, minutos após, chamou-me, a dizer que a partir daquele momento tinha eu um blog. E iniciava-se a saga que perdura. Aprendi, após dois ou três anos titubeando, a lidar com o blog, montando o texto e escolhendo as imagens apropriadas a cada post.

Ao longo do tempo, fiz referências várias à ideia que leva ao tema da semana. Ela tem um fluxo natural e desliza pela mente com serenidade durante meus treinos de corrida a visar à qualidade de vida e às provas de rua da cidade ou alhures. Diria, há todo um esquema que é elaborado e construído na sequência das passadas a correr. Escolho um tema, organizo-o e desenvolvo-o mentalmente, inclusive com a divisão em segmentos e armazeno o futuro post no cérebro. Na primeira madrugada, esse tema flui no teclado do computador. Redigido, transmito-o à nossa dileta amiga e vizinha, Regina Pitta, que  verifica algumas incorreções geradas no texto escrito num só impulso. Esse é o roteiro a levar o blog até o leitor. O nosso maior compositor romântico, Henrique Oswald (1852-1931), já dizia que o pior revisor é o autor e que ele sentia-se o pior entre os piores nesse mister.

Nestes 9 anos e tais meses, não houve a interrupção de um sábado sequer. Aos cinco minutos desse dia, o post é publicado e ao leitor julgá-lo.

Seria relevante mencionar que considero econômica a divulgação de meu blog. Sem propaganda alguma, nesse ato voluntário de jamais ter buscado apoio, entendo essa atitude pessoal, mas salutar. Dá a mais absoluta liberdade quanto ao que escrevo, assim como responsabilidade pela temática escolhida semanalmente, possibilitando-me singrar mares com ondulações cotidianas. Não sofreria a ideia que leva à criação de um texto constante mutação? Nem sempre, mas quando isso ocorre, existe a chancela de um resultado melhor. Parafraseando o grande escritor português Guerra Junqueiro ao tratar de obra finda, aplico sua conclusão aos meus modestos textos: “Um livro atirado ao público equivale a um filho atirado à roda. Entrego-o ao destino, abandono-o à sorte. Que seja feliz é o que eu lhe desejo; mas, se o não for, também não verterei uma lágrima”. Frase dura, mas que reflete no âmago a autenticidade do autor, inequívoca, a saber, a razão do escrito, sua viagem e voo livre.

A música sempre foi meu norte, mas faz parte de um conjunto de outras matérias que me encantam, surpreendendo-me nessa travessia. Ávido leitor, jamais me fixei unicamente na área pianística. Ver o mundo, mesmo que pelo olhar competente de especialistas aventureiros, na acepção meritória do termo; participar de um romance, quando relevante; ler livros da área, hoje bem mais aqueles em que compositor ou intérprete se abre inteiramente, a desvelar seu processo criativo e visão do mundo; penetrar na literatura esportiva, que traduz tantas identidades com a atividade musical no que concerne ao preparo físico e à determinação. Eis algumas de minhas incursões relacionadas à leitura,  resultando resenhas e comentários que faço habitualmente (vide Resenhas e Comentários no menu).

Não poucas vezes encontro pessoas que têm acesso ao blog. Apraz-me saber que se interessam pela diversidade temática. É claro que o número restrito dessas consultas aos textos nada tem a ver com o acesso ao monotematismo blogueiro existente em outros tantos e infindáveis exemplos que existem em nosso país. Impressionam-me os milhões de acessos diários a esses blogs precisos em suas intenções, mas voltados a uma área apenas de atuação. Nesse mundo tão complexo, estranho, específico, unem-se patrocínio, divulgação e notoriedade alcançada. Palavras como “famosos”, “celebridades” e “estrêlas” convergindo para possantes luzes, são aplicadas ad nauseam. A qualidade seria apenas um pormenor em parcela considerável dos blogs que proliferam com enorme acesso. Bons ou maus no conteúdo, bem ou sofrivelmente redigidos, atingem as “tribos” ávidas pela informação buscada com finalidade precisa. Por vezes leio ou ouço que determinado blog atinge diariamente número incomensurável de acessos. Alimentados diariamente, em reiteradas oportunidades durante um dia, o leitor encaminha-se ao que prega o “oráculo” de sua predileção. Há nessa atitude uma tendência milenar de fuga da solidão, do cotidiano que pode massacrar, da procura da companhia certa em momento certo.

Continuo desde 2007 a ter o blog hebdomadário. Os poucos milhares de leitores semanais têm acesso todos os sábados ao novo texto, que diversifica a temática, sempre a atender ao meu restrito universo de opções, mas que traduz na realidade o meu olhar este mundo, que a cada dia está a nos surpreender para o bem, e hélas, principalmente para o mal, para a crueldade sem limites, para a ideologia insana que fatalmente leva às ditaduras de toda ordem, mercê da política predominantemente torpe, para a saúde pública inexistente, para a educação em crise descendente, para o desmonte da cultura erudita a cada ano mais restrita a guetos, que ainda não necessariamente compreenderam o fato irreversível, diria. Sim, a cultura erudita não desaparecerá, mas a massificação, que nivela por baixo, só tende a crescer. Todos esses fatores têm implicação em nossas reflexões e se, por algum motivo, escrevo um blog a respeito desses desmandos, faço-o atristado.

O leitor bem sabe que os “comentários estão desabilitados” em meu blog. Que não veja nesse ato uma vontade de privá-lo dessa participação, que pode ser feita através do contato assinalado no menu. Tenho todo o prazer de responder aos e-mails, fazendo-o regularmente. No sentido “aberto”, forma-se uma rede de mensagens e de respostas às respostas, o que, ao meu ver, polui tantos blogs meritosos. De repente, o autor se vê partícipe de comentários que extrapolam o texto, motivo das discussões.

Música, blog e corridas fazem parte de meu universo mental. O apoio irrestrito da família é fulcral e a assistência permanente de meus amigos Magnus Bardela e Regina Pitta, para a tecnologia a cada dia trazendo inovações, e a revisão e o abstract precisos, respectivamente, são estímulos diários. Nesses últimos cinco anos, meu dileto amigo, ilustre compositor e pensador francês, François Servenière, tem-me honrado com mensagens substanciosas logo após a publicação do blog. De Le Mans, onde habita com a família, já lê com desenvoltura os textos em português, o que facilita seu entendimento. Traduzo suas mensagens impecáveis, a enriquecer meus textos. Por fim, estou a me lembrar do saudoso amigo e imenso artista plástico, Luca Vitali. Durante uns poucos anos num caminhar conjunto, Luca ilustrou com imaginação singular inúmeros blogs. Sinto muitas saudades de nosso convívio.

Chego esperançoso aos 500 posts. As décadas acumuladas jamais me trouxeram desalento. É bom assistir ao andar do homem pela História. Continuarei como observador.

This week my posts reach number 500 with an unbroken flow of publications since March 2007. To mark the occasion, today I talk about my ways of coming up with new topics each week, covering a wide variety of subjects, with emphasis on music.