Considerações de um simples observador

O povo não se importa com os salários desmesurados dos jogadores
como o faz para com os dirigentes das grandes empresas.
O patrão é menos legítimo para o grande público
do que o artista da bola de futebol.
Seria temerário assim considerar.
Mas o patrão impõe restrições, licencia, fixa as regras do jogo.
Em suma, ele possui o poder.
O jogador de futebol, tão rico quanto, oferece o espetáculo.
Um se apresenta e faz sonhar, o outro impõe.
Os imperadores romanos do baixo império
ofereciam ao povo “pão e circo” para governar em paz.
Os dirigentes do ocidente contemporâneo
Oferecem-lhes consumo e espetáculos.
O esporte e as emissões televisivas constituem o essencial do espetáculo.
Patrick Aulnas
(“Contrepoints” – 15/07/2018)

Assisti a muitos embates da Copa do Mundo, que premiou com justiça a seleção francesa, apesar das empolgantes participações da Croácia e da Bélgica na competição maior do esporte bretão. Friso, sempre pela FOX, a meu ver a melhor transmissão dessa competição. Creio mesmo ter sido a melhor Copa, desde a primeira de 1950 quando, com meus pais e irmãos, assistimos ao jogo Brasil x Suécia no Maracanã, com resultado surpreendente para o Brasil. De lá para a atual, estive atento a acompanhar igualmente jogos importantes de inúmeras seleções.

Assistir a jogos pela televisão, apesar dos avanços tecnológicos com quantidade de câmaras fixando todas as jogadas, não tem a mesma garantia de avaliação daqueles presenciados in loco, pois temos a possibilidade de observar todos os jogadores e melhor julgar estratégias. Todavia, pouquíssimas vezes fui a um estádio, sendo que jamais voltaria por motivos óbvios, pela faixa etária e também pela violência que pode advir a qualquer momento nos eventos no Brasil, marcados pela chaga representada pelas torcidas organizadas.

Primeiramente, apesar de saber que todos os continentes têm de ser contemplados, é lamentável não termos na Rússia seleções como as da Itália e da Holanda, como exemplos. Seleções que conseguiram com esforço se classificar em continentes menos qualificados futebolisticamente chegaram quase como sparring partners, figurantes apenas do que estava por vir. Tornaram-se presas fáceis das seleções mais fortes. Se necessárias as participações para contemplar cotas dos continentes, enfraqueceram o campeonato na primeira fase, que poderia ter outra dimensão se países mais representativos estivessem presentes. Contudo, a FIFA é a FIFA, com tantos imbróglios através da história. Em 2026 teremos 48 seleções!!! Sempre interesses estranhos que desconheceremos.

Gostei muito da Bélgica, que nos eliminou. Futebol moderno, defesas sólidas, linhas bem ajustadas, contra-ataques rápidos e organizados. Percebia-se a orientação do treinador. A seleção inglesa não decepcionou. Muitos são jovens e campeões de ligas de faixa etária mais baixa. Creio que em 2022 poderá ir mais longe, com a geração atual amadurecida. A experiência e o entrosamento da seleção belga mostraram-se presentes e os ingleses não resistiram. Ambas as seleções praticaram o jogo coletivo.

Quanto à América Latina, a cada ano ficamos mais distantes do futebol jogado na Europa. Um exemplo que se concretiza todos os anos é a diferença abissal existente entre jogos da Liga dos Campeões da Europa e a nossa triste Libertadores da América. Estádios espalhados pela América sem condições, gramados por vezes semidestruídos, iluminação nem sempre condizente, participação de equipes sem a mínima condição, mas contemplando interesses. Verdadeiramente tristes “espetáculos”. Na Copa ora finda, os países da América Latina sucumbiram. Menção apenas à seleção do Uruguai que lutou com determinação, mas também não suportou a superioridade europeia no presente. Assisti aos seus jogos e era notório o empenho, a raça, como costumam dizer, dos jogadores do Uruguai, capitaneados pelos excelentes Godin, Suarez e Cavani, este que, contundido, não esteve presente no jogo da eliminação de seu país frente à poderosa França. A Argentina realmente decepcionou.

Quanto ao Brasil, já se podia prever a desclassificação. A tantos amigos dizia eu em Março que o treinador Tite poderia ser seduzido pela mídia e por poderosos patrocinadores e que não deveria levar Neymar, que retornaria aos treinos um mês antes da competição, após operação a que foi submetido no pé direito. Não só não estaria em condições ideais como poderia desestabilizar estratégias antecipadamente preparadas. Tite não considerou a hipótese de não contar com o jogador, mantendo-o no elenco, sempre a precisar sua importância decisiva na competição. Um dia possivelmente saberemos as razões da manutenção de Neymar entre os jogadores, assim como outros que vinham de lesões e não deveriam estar na Rússia. A essa observação soma-se a tendência de nossos treinadores em manter as “famílias” constituídas pelos jogadores eleitos. Parreira (2006), Dunga (2010) e Scolari (2014) assim agiram e Tite continuou a famigerada sina. Tirou Gabriel Jesus ou Neymar, que não estavam bem? Não. Manteve a “família”. Tite não soube introduzir mudanças fundamentais durante os jogos, como outros técnicos o fizeram. Na desclassificação frente à Bélgica não agiu a tempo após estar a seleção em desvantagem. Faltou-lhe esse algo a mais, decisão no momento certo. Sob outro aspecto, em todas as suas entrevistas mantinha constantemente o discurso ex-catedra. Contudo, paradoxalmente, não teve pulso para evitar a distração fatal causada pelo excesso de familiares e amigos dos jogadores, destes retirando o foco essencial. A TV cansou de mostrar esse cerco, que desvia a atenção fulcral.

Estratégias dos técnicos dos quatro países que chegaram às semifinais bem evidenciaram o jogo coletivo, distanciando-se do pensamento a ter como eixo paradigmático um salvador da pátria, caso específico de nossa seleção. Os quatro técnicos semifinalistas mudaram estratégias no decorrer dos embates. Uma constatação é evidente, pois não há um só técnico no Brasil que possa ser convidado para dirigir um médio ou grande time europeu. Triste retrato de nosso futebol, mal congregado em torno de uma CBF totalmente desmoralizada.

Decantado em prosa e memes, o caso Neymar foi emblemático. Talentoso, muito acima da média, está a se perder pelo excesso de autoconfiança e pela visualização excessiva, sempre a querer figurar acima de seus reais méritos. Tem como ídolos a serem ultrapassados Cristiano Ronaldo e Messi. Seu talento não está à altura dos dois e essa evidência só não é vista por alguns cronistas, que teimam em considerá-lo superior (sic). Em recentíssima pesquisa da Pluri Consultoria, especializada no ramo esportivo, na qual aborda a desvalorização do jogador, lê-se: “Neymar entrou na Copa do Mundo cercado de expectativa Global pela condição de protagonista da maior transferência da história do futebol mundial (€ 222 milhões), e frequentemente apontado como sucessor natural de Cristiano Ronaldo e Messi”. Prossegue a consultoria: “O jogador, porém, não se comprometeu com a bola nos pés, não foi decisivo como se esperava dado seu talento. E, sem a bola, amplificou em escala planetária os piores aspectos que há tempos se apontavam sobre sua carreira”. O tempo dirá.

Não vejo a menor possibilidade de haver uma elevação do futebol praticado na América Latina. Não há como. Confederações eivadas de corrupção, agremiações tendo de vender para o Exterior talentos recém-surgidos e repatriar jogadores em faixa etária a apontar para o fim de carreiras, resultando na contratação de outros no mercado local ou de países latino-americanos apenas de qualidade bem mediana, fazem com que o futebol praticado no Brasil e no continente seja sofrível, sem exceções. Chauvinismo “impede” para todos esses países a contratação de descendentes imediatos de imigrantes, daí termos seleções “puras”. Assim procedia a Europa. Hoje, países como a França, Inglaterra, Bélgica, Alemanha, entre outros, já entenderam não poder prescindir em suas seleções do talento de afrodescendentes de última geração ou, então, de originários do Médio Oriente. Acredito que dificilmente nossa América Latina chegará às próximas finais.

Essas observações de um apreciador do futebol-arte desde os 12 anos de idade impedem-me de assistir aos jogos de nossos campeonatos e até da Copa Libertadores da América. Fundamento essencial como o passe não é tido como prioridade e o número errado desse quesito nos confrontos é extraordinário. A Europa se reestruturou no âmbito do futebol de base, tido como essencial pelas categorias acima. Crianças aprendem prioritariamente os básicos fundamentos. Sob outros olhares, a violência em campo e fora dele, as estratégias pobres de treinadores que permanecem fazendo rodízio, trocando constantemente de clubes durante as temporadas, são alguns fatores que inibem quantidade cada vez maior de admiradores, induzindo-os a assistir ao melhor futebol do mundo, já há tempos praticado na Europa. Na falta de bons espetáculos em nossas terras, observo com entusiasmo, tantas vezes, jogos importantes dos campeonatos espanhol, alemão, inglês, italiano e francês. A ida de Cristiano Ronaldo para a Juventus na Itália despertará enorme curiosidade para milhões de aficionados pelo esporte bretão da península itálica. Espalhados pelo mundo serei um desses admiradores do magistral jogador português.

As Russia 2018 World Cup came to an end with the victory of France, I raise some considerations about the sad situation of Brazilian football today. South America didn’t do well. Brazil, as I have expected, did not make to the finals. The time the Brazilian squad was an example to be remembered is gone. We are not part of the elite soccer any more. At domestic cup competitions we see second class coaches and players, no game plan, corruption, violence, the need to sell the best players to the European soccer leagues, stadiums in very poor conditions, with ruined pitches and defective lighting. Without good matches at home, I can do no more than watch with envy the outstanding technical quality offered by the European championships.