Acúmulos da Escuta e do Olhar

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Quem adiante não olha,
atrás fica.

Setembro que enche o celeiro,
salva o rendeiro.

Adágios Açorianos

E em Setembro chegávamos a termo em mais uma coletânea a reunir 72 textos do blog, mesmo número de posts publicados no primeiro livro de Crônicas de um Observador. Reiteradas vezes observei que o blog passou a ser respiração, da mesma forma que a música sempre o foi, desde a remota infância. Todas as semanas ideias fluem naturalmente, pois há permanente observação, seja introspectiva, através de leituras, seja pela própria visão ou escuta de fatos. A permanência em minha cidade bairro, Brooklin-Campo Belo, proporciona-me a magia da rotina. Ela pode ser degustada de tantas formas diferentes. O dia a dia, esse cotidiano inexorável, é perenemente outro a cada amanhecer. São as notícias ouvidas pelo Rádio em três das principais emissoras da cidade, do acordar ao café da manhã, a atitude das pessoas do convívio, cada uma a apresentar diariamente outra face da rotina. Os posts reunidos tem certa atemporalidade. Não levam aos flashes característicos do imediatismo, tampouco se prendem às temáticas estanques. O olhar e a escuta não deixam de ver e de ouvir esse pulsar diário que a observação registra. Muitas vezes o baú mental fica prenhe de idéias que, compartimentadas, aguardam o vir a ser. Seria possível dizer que estar mais fixado em meu canto, a cuidar de estudos pianísticos e mais leituras após a aposentadoria, tenha-me proporcionado benfazejas reflexões. Os tempos do Eclesiastes são reais. Cuidar com carinho das viagens internacionais para recitais ou palestras, configura, sob outra égide, diversos temas que entram no blog motivados pelas impressões. Há sempre repertórios super qualitativos não frequentados que encantam a mente, mas que permanecem negligenciados. São tantos os motivos para esse descaso. Outras vezes, o inusitado, ou fato que merece anteceder ideia amadurecida, tem preferência. Em Crônicas de um Observador (II) , as mortes de dois diletos amigos causaram-me forte impacto. Não deu para esperar, daí terem os textos fluido de imediato.
A rotina das corridas ficou incorporada. Se correr é bom para a mente e para o corpo, tem sido a fonte da sedimentação das ideias. É quase sempre nesse compasso, ritmo rotineiro e prazeroso, que tudo acontece. Aos 71 anos, prefiro deixar tudo registrado na mente, verdadeiro exercício para a memória, e apenas lá pelas altas horas, tendo ela filtrado a essência do pensar, transmite ao teclado o post que corre desde logo por inteiro. Outras madrugadas e há o burilar frases, nessa incessante busca do encantamento que a escrita livre de amarras proporciona. Não se trata de privilegiar uma temática. Fosse esse o objetivo dos posts, procuraria um meio convencional, como revista ou jornal. A liberdade da escrita tem seus comprometimentos com as categorias do pensar e com o almejar a verdade, essa palavra envolta em infindáveis metáforas. E, sobretudo, sem quaisquer pressões. Pouco a pouco esse hebdomadário contato com o leitor transforma-se em ato de comunhão, seja qual for o tema. As narrativas continuam em flutuação. Música, Literatura, Impressões de Viagem, Personalidades e Cotidiano preenchem largamente os meus desideratos.

Uma das ilustrações do livro. Tim Heirman (Bélgica). Retrato de J.E.M. Óleo sobre madeira, 2009.

Em Crônicas de um Observador II a Música é um dos temas mais visitados. O contato diário com a matéria sonora torna-me seu cúmplice, e reflexões estão sempre em ebulição em minha mente. A permanência nessa ideia da impermanência repertorial proporciona à minha vida constante maravilhamento ao ler obras relevantes, primeiramente fora do piano e, em segunda etapa, junto ao teclado, conduzindo-me, com o passar do tempo – esse acúmulo inexorável – ao amadurecimento das essências musicais. Essa busca incessante não me distancia do repertório tradicional, revisitado com prazer, mas homeopaticamente. Todavia, preferencio as criações extraordinárias escondidas em bibliotecas, baús e espólios que, se sob um prisma, levam-me a uma constante renovação, sob égide outra fazem-me refletir a respeito de aspectos sociais que teimam em não se desviar das repetições de programas de concerto, mormente no que se refere ao piano. Nesse quesito, décadas somadas a outras décadas apontam para a impossibilidade de oxigenação. Ícones de que o homem não se desvia.
São inúmeros os livros percorridos anualmente. Leituras mais reflexivas acompanham-me pela madrugada, antes do sono. Na categoria Literatura está o mais longo post que escrevi. Os Últimos Intelectuais, livro de Russel Jacoby, relido em viagem, cerca de 15 anos após a primeira leitura, levou-me a pensar a respeito do papel da universidade hoje, o carreirismo acentuado, a luta pelo poder, a oferta de bolsas sem o debruçar maior sobre a qualidade e a visão voltada ao quantitativo nas várias esferas avaliativas. A queda qualitativa do quadro docente nas universidades públicas do Brasil e de vários centros alhures é sintoma preocupante. Jacoby é agudo em suas observações. Livros sobre música, sobre o medo do palco e outros sobre a temática budista e a do Himalaia foram algumas das temáticas visitadas.
O convívio humano tem sido o fator mais importante nas viagens empreendidas. Retornar aos lugares já visitados e conhecer outros, quando relações novas são acrescidas, proporcionam enriquecimento. Cidades e locais merecem sempre a atenção e, por mais que queiramos, apenas uma pequena parcela pode ser vista. Mesmo em uma vila, a cada retorno há muito a explorar. Monumentos, museus, a natureza nas várias estações e o afeto característico que é oferecido àquele que sente e faz música. A retribuição vem na transmissão da mensagem musical.
Lembranças especiais levam-me a alguma personalidade, conhecida ou não, que me marcou profundamente. O texto sobre Louis Saguer não apenas aborda seu arguto livro sobre a música portuguesa, como traz-me recordações desse grande professor, que me mostrou caminhos desconhecidos em reação ao pensar musical.
O cotidiano apresenta-se como a categoria mais frequentada em Crônicas… É um passeio mágico pela rotina transfigurada, o cruzar com gente do convívio ou o fato que teima em recrudescer ou estiolar. Personagens desse dia a dia, observação do que causa impacto, o simples fluir da correnteza têm seus encantos. Não escapam da retenção nesse baú mental que registra e espera o momento do resgate através da digitação morosa do pianista que emprega apenas dois dedos no teclado, para que a transição para o blog seja feita.
Magnus Bardela, discípulo e mestre, ensinou ao velho professor os meandros do blog. Ainda me ajuda nos momentos de impasse tecnológico, que não são poucos. Regina Pitta pacientemente faz revisões e abstracts. Os dois têm essa visão imediata, fundamental para aferições. Luca Vitali continua leitor dos pré-blogs. Imaginação imensa, quando um texto desperta sua curiosidade criativa vem o desenho via internet, espontâneo, de um verdadeiro artista da observação. Desenhos de minha filha Maria Fernanda e do ilustre Carlos Oswald, assim como a reprodução de óleo sobre madeira do artista belga Tim Heirman, enriquecem as ilustrações. O editor e amigo Cláudio Giordano da Pax e Spes cuidou com esmero de toda a preparação do presente livro. O estímulo desses amigos diletos e do leitor fiel representam a fonte da esperança. Continuemos cúmplices, como deixei registrado no primeiro blog em Março de 2007. A certeza de ter em você, leitor tantas vezes oculto, o partícipe, faz-me continuar. Há muito para contar. O tempo colabora.
Bem haja !

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A collection of seventy-two posts stored in my blog have been gathered in a book entitled Crônicas de um Observador II (Chronicles of an Observer II). Embracing various categories of thoughts or events (books, travels, personalities, everyday life and reminiscences), the book will be released on 15 December 2009 at the Brazilian Academy of Arts (Brooklin branch) at 8 p.m.

Artista da Hiper-Super-Ação

Você não se sente livre sendo filho,
você não se sente livre sendo mãe.
Livre é um caminho crítico,
por felicidade na liberdade.

Luca Vitali

Mestre Luca Vitali e Evilásio Cândido. Clique para ampliar.

Em posts anteriores, referi-me ao emprego inadequado de certos termos. Outros mais, à força da reiteração, banalizam-se e não mais correspondem à sua real acepção. Incluiria nessa categoria a palavra superação. Igualmente mencionada ad nauseam em propagandas e nos meios de comunicação, raras vezes adequa-se ao verdadeiro sentido que deveria ter. É um fato com que nos deparamos a todo instante. Em qualquer das atividades humanas há aqueles que conseguiram a superação após vicissitudes de toda a ordem, assim como há a sua “aparência” em tantas mais figuras divulgadas pela mídia. Todavia, legião de verdadeiros heróis poderia ser citada. Felizmente esta existe, a fim de que exemplos dignificantes sirvam como faróis para a trajetória do homem. Já mencionei no post anterior Edson Dantas, bi-campeão da Maratona de Nova York na categoria amputados, como cidadão forjado no destemor e que soube superar o que poderia parecer impossível.
Há contudo uns poucos, raríssimos, que ultrapassam a aplicação do termo superação. Incapacitados para a vida e dependendo inteiramente de ajuda diuturna, representam esses seres extraordinários exemplos para todos aqueles que, pelos mais variados pretextos, tendem a viver na lamentação. Quando a fé inabalável – a que remove montanhas – tem a alimentá-la a força criativa sedimentada pelo tempo, surge o herói verdadeiro, o demiurgo que encontrará seu espaço e será paradigma para todos os mortais. Ergue-se sob a égide da Hiper-Super-Ação, figura acima das tão decantadas superações, válidas, inquestionáveis, mas apenas superações.

Evilásio e seu universo. Clique para ampliar.

Através de relatos pungentes de Luca Vitali, habituara-me a ouvir a saga de Evilásio Luiz Cândido, um vitimado pela paralisia cerebral. No inícío dos anos 90, o adolescente, assistido pela Associação de Assistência à Criança Deficiente (AACD), com extrema dificuldade externou a Luca Vitali o seu desejo de pintar, de mostrar ao mundo as aspirações acalentadas às quais o destino parecia opor-se. Foi Luca que, ao conhecer o drama de Evilásio, indicou-lhe a senda da luz, aquela que, ao ser percorrida, pode explicar a passagem do homem pelo planeta. Torná-lo exemplo. Apreendeu o mestre que a vocação de Evilásio seria a de pintar, sonho aparentemente irrealizável. Mas como ajudar alguém que em cadeira de rodas, sem poder fazer uso dos membros superiores e inferiores, com sérios problemas de coordenação da fala e de outros movimentos corporais, inclusive da cabeça e da boca, a encontrar realização na pintura? A AACD já adaptara uma tiara, a fim de que Evilásio pudesse escrever. Luca adaptou à tiara um pincel. Isso se deu em 1992. Magia. Tiara do desvelamento, possibilidade única para que o imaginário rico de Evilásio pudesse vir à superfície. Tiara da esperança, da concretização da luz. Pincel, instrumento a fixar os mistérios da mente. Houve momentos de desalento por parte do discípulo, não relacionados ao desejo final, mas às próprias dificuldades sobre-humanas do aprendizado. A técnica lhe foi ensinada com paciência e relação de afeto: planos, cor, perspectiva a partir dos tons claros aos escuros, entrada da luz e das sombras, a noção das distâncias, harmonia, dimensões dos quadros, do pequeno à grande tela, misturas, limpeza de pincéis. Evilásio dedicou-se com afinco, aprendeu o métier e hoje, amparado pela dedicadíssima mãe Dilza – entre outras tarefas, é ela que diariamente carrega o filho ao subir os 12 degraus que levam ao quarto de dormir -, pela irmã Juliana e a ter como verdadeiro anjo protetor Eliana Pereira Bento, carinhosa especialista a cuidar dessa difícil comunicação de Evilásio com o mundo que o circunda. Eliana é fonoaudióloga e tem acompanhado o desenvolvimento de Evilásio há longos anos, não apenas a solucionar problemas do cotidiano, mas também estabelecendo contatos com os que se interessam por arte. Frise-se o apoio que o artista recebe até o presente do Núcleo Assistencial Irmão Alfredo.

Flora. Pintura de Evilásio Cândido. Clique para ampliar.

Luca confessou-me que jamais interveio nos desideratos do discípulo. Ele é o mestre a guiá-lo, tão somente. A temática criativa de Evilásio passaria a brotar como o magma das profundezas da terra, e o interior singular do pintor tem emergido em deslumbramento da cor, em apelo à vida e à compaixão. Como não pensar no Douanier Rousseau (1844-1910) e suas florestas tropicais, fauna e flora, oriundas da imaginação?

Primavera. Pintura de Evilásio Cândido. Clique para ampliar.

Impressionaram-me pinturas brotadas não apenas do espírito criador, mas de uma reflexão concernente à vida, seus embates e conflitos, mas igualmente dessa incessante busca da pureza do espírito e da luz como almejo final. Se pinturas como Flora e Primavera traduzem um universo que o homem teima em extinguir; se Recanto leva-o a pensar num abrigo tranquilo para um Evilásio morador em casa simples e prestes a vê-la demolida pelas máquinas impiedosas da modernidade; se Israel, representado pela árvore enroscada por galhos que a sufocam, estaria a lembrar um país sem paz duradoura, mercê de intolerâncias; uma outra árvore, aquela que conduz o olhar à luz em Iluminada, não seria a confissão desse artista que tem como fim único a aspiração do bem e do belo? Não representaria a Ponte, a transição do “impossível” a almejar a plena humanidade?

Recanto. Pintura de Evilásio Cândido. Clique para ampliar.

Quis conhecer Evilásio. Sua figura, constantemente exaltada com emoção por Luca, contagiou-me. O amigo agendou esse encontro. Ao leitor diria que Evilásio é um ato de fervor. Entrevistei-o, a questionar-lhe os porquês da opção, a relação com a vida, possíveis desencantos pelo impedimento quase que absoluto de participar do cotidiano de todos. Suas necessidades básicas têm de ser acompanhadas. Tem alma pura e seus sentimentos revelam grandeza de espírito. Evilásio ultrapassa qualquer julgamento a respeito da superação. É ele essa encarnação da Hiper-Super-Ação, pois as vicissitudes imprimiram em seus 33 anos de existência o sentido do espírito solidário, do amor vertido nesse pincel preso à tiara que pouco a pouco traduz o que sente em cores vivas, a natureza em festa ou em paz, os miúdos em seus folguedos. Deles participa na imaginação e no olhar, sem jamais ter tido a oportunidade de fazê-lo fisicamente. Sente ternura pelas crianças. Ama a vida e a humanidade, sem quaisquer barreiras. Um iluminado.

Israel. Pintura de Evilásio Cândido. Clique para ampliar.

Fiz-lhe muitas perguntas. Respondeu a todas, apesar da complexidade da fala. Pergunta: O que é liberdade para você? Resposta: É poder ir a qualquer lugar sem sair de minha cadeira de rodas. Apesar de todas as dificuldades, sou livre e viajo quando estou pintando e procurando as cores, que são a minha luz. P: Luz, indaguei? R: Sim, luz é coisa de Deus e eu me sinto um iluminado ao fazer o que mais amo. Realizar tudo sem medo de ser feliz e de poder sonhar. P: O Evilásio gosta da natureza e das crianças. Qual a razão dessas preferências? R: Amo a natureza, pois os grandes espaços me dão o sentido da vida e da liberdade. Amo as crianças, pois participo interiormente de suas brincadeiras. P: A natureza parece estar sempre em harmonia nos seus traços. Como você a recria? R: Eu sei que ela está lá. Televisão e livros mostram imagens que nunca conhecerei. A natureza que eu pinto, árvores, campos, é aquela que está dentro de mim. P: Há uma quase fixação em cenas do Natal, como demonstram seus cartões postais, que propiciam parte de sua subsistência. Seria fruto de sua infância difícil? R: Jesus e Natal representam uma coisa só. Sem o menino Jesus o que seria do Natal? P: E Luca em sua vida? R: Não tenho o que falar, só a agradecer pelo fato de ter acreditado em mim. Incentivou-me a ser o que sou. Mesmo quando está longe, ouço a sua voz me aconselhando. P: Sei que você gostaria de conhecer a França e que estuda não apenas francês, como português. R: Estudo para estar preparado. Francês com a professora Maria Lúcia Vaz Guimarães, mas também português, pois tenciono escrever um livro.
Eliana Bento Pereira ratifica as palavras de Luca Vitali. Para a fonoaudióloga, tudo é extremamente difícil para Evilásio, mas jamais o artista desiste. “Há uma força descomunal nesse ser humano que não conseguiria sobreviver sem atenção diuturna. Procura retribuir carinhos com o amor que suas pinturas traduzem.”

Iluminada. Pintura de Evilásio Cândido. Clique para ampliar.

Observa-se que, para aqueles que superaram adversidades, geralmente a compensação acabará dando alento novo à vida. Para Evilásio, o impasse permanente está sempre a apontar ou para o naufrágio à espreita, ou para a absoluta impossibilidade física, com exceções da mente criativa e da tiara-pincel redentora. Para Evilásio, a hercúlea vontade de expor ao mundo a vocação artística, apesar dessa sofrida dependência, é inequívoca. A arte não trouxe a restauração física, tampouco a possibilidade do ir e vir. A pintura é para Evilásio a própria mensagem divina, a revelar ao homem a sua fraqueza ao lamentar-se seja qual for a situação. A paralisia de Evilásio que, paradoxalmente, tornou-o pintor e até digitador de um computador, é o sinal Superior dado a todos nós de que se amor e esperança houver, a redenção se dá. Evilásio não é apenas o ato de amor, mas também o estímulo vivo para os incapacitados físicos, a lição permanente para os que têm o privilégio de conhecê-lo.
Através do site www.projetoevi.org e do e-mail evicandido@gmail.com, pode o leitor ter acesso aos seus cartões de festas natalinas, aos calendários por ele idealizados e a sua pintura singular. Cenas do Youtube revelam parcela desse universo desconhecido por nós, razão de viver de Evilásio Cândido:
http://www.youtube.com/watch?v=dBBjr2SAeFU

Ponte. Pintura de Evilásio Cândido. Clique para ampliar.

Evilásio Cândido is a 33-year-old painter. What sets him apart from other artists is that he was born with brain paralysis and can only move his head and eyes. His severe disabilities make communication difficult, but he managed to express to the painter and graphic designer Luca Vitali his wish of learning to paint. It was so that Luca began to instruct him in the techniques of artistic painting, which he has learned with gigantic determination, working with the paintbrush attached to his forehead. This post tells a little of the story of this extraordinary human being, his thoughts, his art, his efforts to make something of his life, his refusal to give up, his permanent lesson of encouragement for those who have the privilege of knowing him.

Ayrton Senna Racing Day

Viviane Senna e seis integrantes da TA LENTOS. Clique para ampliar.

Amor à vida no tempo
corra bem ou corra mal…

Agostinho da Silva

No post anterior escrevia que chegara bem tarde da noite de minha semana musical em Goiânia. Às seis e meia da manhã do dia seguinte já estava no autódromo de Interlagos. Participar pela segunda vez da Maratona de Revezamento Ayrton Senna Racing Day em sua 6ª edição foi uma grande alegria. Nossa equipe TA LENTOS foi pouco a pouco chegando, pois cada integrante já era conhecedor de sua posição no revezamento. Competia a cada corredor da TA LENTOS dar uma volta no lendário circuito. Fui o segundo a sair após receber a braçadeira de Franco, bem mais jovem e mais rápido do que eu, o Matusalém do grupo. Para esta prova Regina e Cristina não puderam correr e foram substituídas à altura por Paulo e Fernando. Curvas, descidas e subidas, entre as quais aquela temível que leva à reta dos boxes e que é mostrada em uma das ilustrações, constituem o belo traçado do autódromo. Assim mesmo baixei meu tempo em quase dois minutos em relação ao ano passado nesse percurso de 5.275 metros, distância para cada integrante das equipes de oito corredores. Em post anterior descrevia a sensação realmente intensa de percorrer o circuito de Interlagos (vide TA LENTOS – Sinônimo de equipe solidária 29/11/08).
O congraçamento nessas provas de revezamento é grande. Todos imbuídos de uma intenção única, a de participar e conviver durante aquelas prazerosas horas.
Novamente nossa equipe recebeu a simpática recepção de Viviane Senna, irmã do grande tricampeão mundial de Fórmula 1 e dedicada organizadora do evento.

Edson Dantas, Ezequiel Costa e J.E.M. Interlagos 08/11/09. Clique para ampliar.

Um fato chamou-me a atenção. Durante o aquecimento passava por mim um corredor amputado da perna esquerda pouco abaixo do joelho. Exercitava-se desenvolto e notava-se tratar-se de alguém experiente. Continuava meu aquecimento quando, ao cruzarmos o caminho uma outra vez, indaguei-lhe a respeito. Disse-me que perdera parte do membro em acidente e que corria com prótese há alguns anos. Quis saber mais, mas o nosso atleta prometeu continuar o diálogo, pois estava a exercitar-se em várias velocidades. Chegou o meu momento, fiz o percurso e passei a braçadeira para Américo, colega de equipe. Como em prova transpira-se muito, há a necessidade de alongamento após a corrida e ingestão de líquidos. Preferencialmente trocamos de camisa uma ou mais vezes após o término. Lá pelas tantas chegou o atleta amputado, que ainda deveria participar. Fazia-se acompanhar daquele que o precederia, Ezequiel Costa, também amputado, de um braço. Continuamos o diálogo interrompido. Soube tratar-se de Edson Dantas, excepcional corredor. Atencioso e modesto, disse-me que era bi-campeão na categoria amputados da concorrida Maratona de Nova York. Estava feliz, pois regressara a poucos dias dos Estados Unidos com o tempo para os 42.200 metros percorridos em 3hs16’. Tem 43 anos e invulgar disposição. Na categoria, é tricampeão da São Silvestre e ostenta prêmios em lugares os mais diversos. Utiliza-se de uma prótese alemã especialmente elaborada para ele. Apreendi que a tal prótese é constituída de fibra de carbono, a conter várias especificações ultramodernas, proporcionando ao atleta uma impulsão superior nas passadas. Como os dois teriam ainda de participar, pedi ao Américo para tirar uma foto. Sérgio Yuji disse-nos mais tarde que Edson Dantas passou por ele como uma flecha. Pudera, estava o amigo diante de um dos melhores atletas paraolímpicos da atualidade e especialista também nos 5 e 10kms. É surpreendente e emocionante verificar essa disciplina que leva à grande superação.

Subida em direção aos boxes. No pulso esquerdo a braçadeira do revezamento. Foto Webrun. Clique para ampliar.

Pouco a pouco os oito de nossa equipe foram cruzando a linha. Findava-se o revezamento. Fomos um pouco mais rápidos do que no ano anterior. Isso para nós não tem a menor importância. Estou a me lembrar da frase de Sérgio Yuji Yokoyama quando da nossa Maratona em 2008: “O melhor resultado não é da equipe que consegue o melhor tempo; o melhor resultado é daquela que consegue desfrutar da alegria, do prazer, da satisfação de estar entre amigos e fazer perdurar isso pelo maior tempo possível…”. Não apenas Sérgio, mas Sato, Ademir, Américo, Franco, Paulo e Fernando partilham da mesma opinião. Alguns de nossa equipe correrão a São Silvestre em seus 15km. Américo e Sérgio, certamente. Já fixamos o encontro em frente ao metrô Brigadeiro no próximo 31 de Dezembro. Sairemos lá atrás, mas o importante será a permanência irmanada durante o longo trajeto, apesar de nossos ritmos diferenciados.

TA LENTOS completa e o capacete do ídolo Ayrton Senna. Clique para ampliar.

Findava este post, horas após ter dado o recital de lançamento do álbum duplo de CDs contendo a integral de Jean-Philippe Rameau interpretada ao piano. (vide Jean-Philippe Rameau – Origem de Fascinante Envolvimento, 14/11/09). Qual não foi minha alegria ao ver a TA LENTOS completa a assistir ao recital. Na fala que precedeu à apresentação, mencionei o fato de tê-los presentes. Se as mensagens musicais serviram para uma outra categoria de congraçamento, comprovaram aos queridos amigos da equipe que os meus dedos correm bem mais velozes do que as septuagenárias pernas. Sob outro aspecto, Luca Vitali, atento, conversou com integrantes da TA LENTOS após o recital. O artista, jocosamente acaba de me enviar sua interpretação do grupo nipo-brasileiro. Uma só alegria.

TA LENTOS no desenho pleno de humor de Luca Vitali. 25/11/09. Clique para ampliar.

Once again I participated in the relay marathon held yearly in São Paulo at the Interlagos circuit, the venue of the F1 Brazilian Grand Prix. I was one of the eight members of the “TA LENTOS” team. This time I had the chance to meet a man of exception, the amputee runner Edson Dantas, who has twice won the New York City Marathon and three times the local Saint Silvester Road Race for athletes with physical disabilities, proving that determination can push us to new limits. “TA LENTOS” didn’t win the race, but we had a great time together. Some of us have already arranged to meet at the Brigadeiro subway station on 31 December to run the 15 km course of the Saint Silvester competition through the hilly streets of São Paulo.