Divulgação Imperiosa

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A Música é poesia incorpórea.
Guerra Junqueiro

Durante almoço com o Presidente da Casa de Portugal de São Paulo, Dr. Júlio Machado Rodrigues, o esclarecido dirigente perguntou-me à certa altura a respeito da possibilidade de um curso sobre a música erudita portuguesa, a ser realizado naquela casa. Lembrei-me incontinente de José Maria Pedrosa Cardoso, Professor da Universidade de Coimbra, que estava naquela oportunidade a oferecer em várias universidades e instituições portuguesas um curso denominado O Som de Portugal, em cinco profícuas palestras. O Dr. Júlio Rodrigues não vacilou e, ao telefone, solicitou datas à sua secretária. Logo após, ligava para o ilustre professor em Oeiras, Portugal, e agendávamos a última semana de Outubro (25-29). Habituado à lentidão dos processos acadêmicos de cursos semelhantes junto aos institutos de fomento, espantei-me com tal agilidade. Antes das despedidas, o Presidente fez-me um desafio, pois gostaria que desse um recital durante a semana do curso, unicamente a tocar o repertório erudito de Portugal, do barroco à contemporaneidade. Aquiesci.
Estivera por várias vezes com Pedrosa Cardoso durante o mês de Maio, durante a longa tournée pianística que realizei pelas terras lusíadas, ele sempre em trânsito, pois a realizar seu curso, eu a dar meus recitais em outras cidades. Apreendi, da parte de frequentadores do curso de Pedrosa Cardoso, que suas palestras atraíam a atenção dos ouvintes não apenas pela notável erudição do professor, como também pela clareza na exposição e empatia com o público. A carreira acadêmica musical de Pedrosa Cardoso é de expressão. Recentemente aposentou-se junto à Universidade de Coimbra, onde foi docente e coordenador da área de música dos cursos de Estudos Artísticos, desenvolvendo atividade inédita. Quando da resenha que escrevi sobre sua obra de síntese (vide “História Breve da Música Ocidental” – José Maria Pedrosa Cardoso, 31/07/10), apontava para a expressiva trajetória do professor e musicólogo, autor de livros referenciais, abordando preferencialmente a música nos séculos XVI e XVII em Portugal. Notável contributo.

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O Som de Portugal será, possivelmente, a primeira apresentação mais pormenorizada em São Paulo da história da música em terras lusíadas. No primeiro encontro, Som antigo, som eterno, Pedrosa Cardoso deverá tratar de conceitos específicos, a discutir Música Portuguesa ou Música em Portugal, música sacra, a ter o canto gregoriano espalhado em mosteiros e catedrais, e a música profana representada pelas Cantigas de Amor e as de Santa Maria. O período medieval estará pois em evidência. No segundo, a ter sugestiva temática, O som do Império Sonhado, o professor aprofundar-se-á na música perpetrada nas igrejas, nos palácios e na rua. Período efervescente, em que centros de intensa produção musical se espalharam pelas terras lusíadas. Haverá um tópico referente à transmissão dessa música para o Brasil. Em O Som da Vaidade Barroca, ter-se-á o detalhamento da posição de Portugal frente à modernidade do período. A figura de D.João V emergirá com todo o grande incentivo que o Rei deu às artes, mormente à música. Abordará a teatralidade musical e as grandes realizações no período. Não faltará a lembrança à exceção, a modinha luso-brasileira. Seria contudo durante o período romântico, O Som Triste do Romantismo Português, que Pedrosa Cardoso apreende razões sociais, mercê em parte dos horizontes liberais que minimizariam a criação portuguesa. Inclui o fado. Estaria Portugal a buscar a música nacional? A finalizar a breve visitação à História da Música de Portugal, o ilustre palestrante focalizará O Som Controverso da Atualidade. Os subtítulos são instigantes “A hesitação musical entre o moderno e o antigo nos princípios do século XX. Estado Novo, música nova? Instituições, folclorismo, fugas para a frente. Novas perspectivas na vida musical portuguesa. Casos de vanguarda e pós-modernismo em Portugal”.

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Do recital, agendado para o dia 27 às 20 horas, constarão apenas autores portugueses. A panorâmica privilegiará cinco compositores da maior relevância em Portugal, a captar a abrangência temática proposta pelo Prof. José Maria Pedrosa Cardoso. Carlos Seixas (1704-1742) é o notável mestre que compôs obras para cravo, coro e orquestra. De suas mais de cem criações para teclado, muitas delas nada ficam a dever ao seu coetâneo ilustre, Domenico Scarlatti (1685-1757). Serão apresentadas seis Sonatas significativas, que constam, aliás, do CD a ser oferecido pelas entidades patrocinadoras no dia do recital. Do álbum duplo lançado na Bélgica pelo selo De Rode Pomp, extraímos 17 Sonatas do compositor conimbricense, representante maior do barroco português. Também pelo selo De Rode Pomp gravei as Trente-Six Histoires Pour Amuser les Enfants d’un Artiste, de Franscisco de Lacerda (1869-1934), compositor nascido nos Açores e que foi amigo de Claude Debussy. Detecta-se mútua influência entre os dois autores. De Lacerda apresentarei 12 histórias selecionadas da coletânea mencionada. Tem-se em António Fragoso (1897-1918), o compositor que, pelo enorme talento e inteligência, poderia tornar-se uma figura preciosíssima para a cultura musical portuguesa. Morreu jovem, aos 21 anos. Fora visitar a família na aldeia da Pocarica, no Concelho de Cantanhede, e teve o infortúnio de chegar quando eclodia em cheio sobre as localidades vizinhas e o seu rincão, a terrível gripe espanhola. Em cinco dias sucumbiriam António e seus três irmãos, Maria do Céu, Carlos e Maria Isabel (leia-se, de Leonardo Jorge, António Fragoso – um génio feito saudade. Município de Cantanhede, 2008). De António Fragoso interpretarei a expressiva Petite Suite. Fernando Lopes-Graça (1906-1994) pode ser considerado o nome maior da música portuguesa em toda a sua história. São inúmeros os posts anteriores em que o grande músico foi tema. Compositor extremamente criativo, tem obras destinadas a gêneros os mais diversos. Pensador, ideólogo, deixou obra literária imensa que perdurará, mercê da insofismável qualidade. Do mestre nascido em Tomar apresentarei seis peças extraídas das Viagens na Minha Terra, título homônimo do famoso romance de Almeida Garret. A finalizar o recital, chegaremos à contemporaneidade através de obra ímpar de Jorge Peixinho (1940-1995), Estudo V Die Reihe Courante, composição maiúscula escrita em 1992 e da qual tive o privilégio de ser o dedicatário (vide Um Estudo para Piano de Jorge Peixinho – Estudo V Die Reihe Courante. 13/06/09).
Entendo da maior importância para leigos, estudantes e músicos a frequência a essa primeira iniciativa abrangente musical erudita oferecida pela Casa de Portugal de São Paulo com o apoio do Banco Banif, ambas as entidades cada vez mais a compreender a função da Arte Luso-Brasileira como fator agregador e de difusão cultural.

Sponsored by the Banif Bank and coordinated by Casa de Portugal in São Paulo, a course entitled “The Sound of Portugal” will be given from 25 to 29 October by the musicologist and Professor of the University of Coimbra José Maria Pedrosa Cardoso. It will cover the different periods of the Portuguese music history, from the Medieval days to the present. On 27 October after the lecture I will give a piano recital solely with works by Portuguese composers. Trying to mirror the thematic route proposed by Pedrosa Cardoso, I have chosen authors from the Baroque to the present: Carlos Seixas, Francisco de Lacerda, Antonio Fragoso, Fernando Lopes-Graça and Jorge Peixinho.